Contra o fim do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)

  • Sexta, 20 de Outubro de 2017

O Observatório da realidade e das políticas públicas do Vale do Rio dos Sinos - Observasinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos - IHU, comprometido com o debate das realidades e das políticas públicas considera indispensável reunirmos conhecimentos para a análise dos limites impostos à garantia dos direitos e da proteção social no Brasil. Nesta perspectiva apresentamos aqui o artigo publicado pelo Secretário Adjunto de Desenvolvimento Social de São Leopoldo, Rio Grande do SulMilitante dos Direitos Humanos, Rodrigo de Mello Castilhos.

Eis o texto

Os cortes anunciados pelo governo Temer, de 98% dos recursos da assistência social destinados a serviços programas e projetos para o orçamento da União em 2018, significam na prática a extinção do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Sem garantir estes recursos o Governo Federal lava as mãos quanto à responsabilidade de garantir os Direitos Sociais da população que é mais vulnerável. O impacto desta medida é de que 30.000 crianças e adolescente, 36.000 mil idosos, 20.000 adultos e famílias ficarão sem proteção social. Estes que dependem do Estado para serem protegidos, por terem sido abandonados, serem vulneráveis ou que estão em situação de rua ou risco social, não serão mais devidamente atendidos e acolhidos nas instituições de proteção social. Ora as trinta milhões de pessoas que são atendidas nos 8.000 Centros de Referência em Assistência Social (CRAS), Centros Referência Especializada (CREAS), Centros de Referência para População em Situação de Rua (CENTRO POP) estarão sem assistência, proteção e apoio mínimos em todo o Brasil. O corte de 11% nos recursos do Bolsa Família, já previsto, significa no curto prazo a perda deste benefício para dois milhões de famílias hoje atendidas.

A Constituição de 1988 trouxe um grande avanço jurídico e conceitual que firmou direitos num pacto social na sociedade brasileira, onde se estabeleceu o princípio da proteção social não contributiva para todos os brasileiros e criava as condições para a efetivação dos Direitos Sociais. A partir desta base uma série de legislações como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA 1990) e a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS 1993) foi seguindo numa linha ascendente aprimorando e garantindo a efetivação destes princípios Constitucionais até 2016. O resultado desta longa trajetória foi a diminuição da desigualdade e a melhoria real das condições de vida de milhões de famílias e de indivíduos em grande vulnerabilidade social. Isto ocorreu de forma marcante nos últimos 15 anos. Um exemplo disso foi a retirada do Brasil do mapa da fome no mundo, após décadas de notícias de óbitos pela fome e miséria no país. 

corte de recursos pelo governo Temer, não é apenas uma medida de contenção de gastos, mas uma opção política calcada em uma concepção de que o sistema de proteção social constituído deve deixar de existir e deixa de ser prioridade, pois seus efeitos positivos não são necessários e custa muito financeiramente (a clássica posição fiscalista dos neoliberais). O corte de 98% dos recursos inviabilizará a existência real das ações de proteção. Estas políticas inclusivas e suas medidas protetivas então se manterão em pé apenas em tese. E estas políticas e programas passam assim a ser anuladas em seus efeitos e importância, porque sem orçamento que as sustente se configura como meras intenções e discursos vazios e cuja efetividade é quase nula, devido à redução de recursos.   

A diminuição dos recursos investidos no Bolsa Família gera uma queda no efeito multiplicador do investimento (Keynes) que deixa de ser aplicado em milhares de pequenos comércios nas comunidades e agrava mais ainda a crise econômica e o desemprego. Em uma conjuntura onde temos a retomada do crescimento das desigualdades e um avanço a olhos vistos da pobreza e do desemprego, políticas e programas compensatórios de transferência de renda (Bolsa Família) e proteção social são esvaziados e perdem sua capacidade de minimizar estes impactos nefastos na população mais vulnerável.

A quebra deste pacto social e federativo pelo governo Temer e a ausência dos estados coloca quase toda a pressão e responsabilidade sobre estas demandas sociais exclusivamente nos municípios porque estão mais perto da população de forma visível e terão a tarefa impossível de manter sozinhos as estruturas de proteção social existentes gerando um desgaste crônico com segmentos sociais cujos direitos estão sendo violados e que precisam acessar a assistência social.  

O resultado destas ações é um retrocesso gigantesco nas políticas públicas onde o Estado se retira e se ausenta do seu papel de efetivar os direitos sociais da população e voltamos ao modelo caritativo onde indivíduos com bom coração, empresas privadas, organizações sociais e alguns municípios têm de prover esta demanda social de forma fragmentada e inconstante.  

A grande tarefa neste momento é de dar visibilidade a este debate com a população de forma a denunciar e tentar evitar o desmonte do SUAS pelo governo Temer porque as suas duras consequências serão sentidas em todo o Brasil nos próximos dias meses e anos de forma grave!