13 Fevereiro 2020
No dia 13 de março, será o sétimo aniversário da eleição de Francisco a bispo de Roma. Sete anos intensos, durante os quais o papa tentou pilotar a barca de Pedro para novas margens, porque estamos vivendo uma “mudança de época” que levanta “sérias interrogações sobre a identidade da nossa fé”, porque “não estamos mais em um regime de cristandade”, e é preciso uma “mudança de mentalidade” não apenas pastoral.
O caminho de reforma empreendido vigorosamente por Bergoglio tem sido continuamente marcado por polêmicas e por uma oposição às vezes decomposta. Ambas preencheram as crônicas, projetando uma sombra sobre o sentido e até sobre a ortodoxia das intervenções reformadoras.
Viandanti, aproveitando a ocasião do aniversário, gostaria de propor, com uma série de contribuições ponderadas, uma leitura que atravesse o período de sete anos, para captar, para além das polêmicas, o sentido profundo da mudança da conversão, da reforma que a Igreja está vivendo.
De modo simbólico, começamos com o tema da liturgia: no Concílio, a Constituição sobre a liturgia foi o primeiro documento aprovado pela grande assembleia.
A reflexão é de Andrea Grillo, teólogo italiano e professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, em Roma, em artigo publicado por Viandanti, 10-02-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O primeiro papa filho do Concílio Vaticano II não podia deixar de ter uma relação particularmente “solta” e “imediata” com aquela nível da experiência cristã que é primário não apenas por estar enraizado no plano corpóreo e simbólico da vida eclesial, mas também porque o Concílio O Vaticano II teve primeiro como sua primeira produção documental a Constituição litúrgica e, depois, como sua primeira consequência institucional, precisamente a “reforma litúrgica”.
O papa que relançou com poder o desígnio de reavaliação conciliar da Igreja Católica não podia deixar de dar um novo passo, precisamente no plano litúrgico. O valor dessa “mudança de ritmo” também deve ser avaliado levando em consideração dois fatores adicionais.
A liturgia é um tema que não parece ser central na sensibilidade do primeiro papa jesuíta. Mas é um tema sobre o qual, de uma forma singularmente intensa, concentraram-se os “desígnios de restauração” dos últimos 20 anos.
De certo modo, nesses sete anos de pontificado já, o magistério sobre a “ação ritual” do novo pontífice também viu, ao lado do grande “retorno à fonte conciliar” – proposto por Francisco não apenas com os seus atos oficiais, mas sobretudo com o seu modo de celebrar e pregar cotidiano – uma resistência que se manifestou, clamorosa e precisamente, no prefeito da Congregação para o Culto e os Sacramentos.
Gostaria de apresentar, acima de tudo, o “estilo litúrgico de Francisco”, depois as principais intervenções que dizem respeito à liturgia e, por fim, a tensão não resolvida com a Congregação para o Culto Divino.
O primeiro dado sobre o qual é bom se debruçar é a “práxis litúrgica ordinária” do novo papa. Francisco é o primeiro papa que, tendo se formado integralmente na (e mediante a) liturgia conciliar, pode começar o dia com uma celebração comunitária, na qual profere uma homilia, diante e em conjunto com uma assembleia de povo.
As missas em Santa Marta são o espelho mais fiel de uma relação com a celebração litúrgica plenamente conciliar, sem qualquer nostalgia. O normativo é o modelo do pároco, até mesmo para o papa. Não existe mais a “capela privada” no Palácio Apostólico, onde se celebra sem povo e quase “privadamente”.
Essa passagem é simbolicamente fortíssima. E é o fruto de uma condição “geracional”, à qual, em geral, não se presta atenção. O Concílio, também o Concílio litúrgico, tornou-se “pai” e gerou filhos. Jorge Mario Bergoglio é “filho do Concílio”, acima de tudo por um motivo: como todos os filhos, ele não carrega sobre si a responsabilidade dos pais. São os pais que se sentem responsáveis pelos filhos. Os filhos, não. E são filhos justamente por isso!
A diferença de datas biográficas entre o último papa “pai do Concílio” (J. Ratzinger) e J. Bergoglio é decisiva aqui: Ratzinger nasceu em 1927 e foi ordenado presbítero em 1951, aos 24 anos; Bergoglio nasceu apenas nove anos depois, em 1936, mas foi ordenado presbítero em 1969, aos 33 anos.
Entre as duas ordenações, há quase uma geração. Nessa diferença, o Concílio Vaticano II se insere como mediação fundamental. O imaginário eclesial, a autoconsciência ministerial, a valorização da liberdade de consciência, a correlação com as outras confissões e fés, e a imediaticidade ritual estão marcados, em Francisco, “na carne e no sangue” pelas palavras e pelos decretos conciliares.
Mesmo na primeira aparição, na sacada de São Pedro, Francisco indicou claramente uma dupla escolha: a simplicidade do aparato e a referência ao sujeito “povo” no ato ritual. Assim, desde os primeiros discursos, apareceu a exigência de “não domesticar o Espírito”, que se expressou no Concílio Vaticano II, cuja reforma da liturgia é definida como “evento irreversível".
Torna-se irreversível, assim, uma “abordagem dinâmica” da Tradição, que não é um museu, mas sim um jardim. Quanta diferença das referências ao Concílio que, até alguns meses antes, preocupavam-se, acima de tudo, em redimensioná-lo, domesticá-lo, desativá-lo. Não, o Concílio permite voltar à Igreja como a um jardim.
Nesse jardim, é possível “pedir ao povo que reze a Deus Pai para que abençoe a eleição do novo papa”; é possível que, na primeira missa celebrada no Vaticano, o novo papa se coloque no fundo da Igreja e cumprimente, um a um, todos os fiéis que saem. É possível que, na missa in coena domini, celebrada em uma prisão, lavem-se os pés de mulheres presas muçulmanas e que, a partir dessa nova evidência, seja oficialmente reformada a rubrica do missal que disciplina tal celebração.
Nesse jardim, pode florescer uma nova confiança nas “línguas vernáculas”, que não são a tradução do latim, mas sim formas originais de experiência e de expressão do mistério pascal: por isso, os critérios da tradução devem respeitar a riqueza das novas línguas (Magnum principium, 2017); no jardim da Igreja, a memória de Maria Madalena adquire o nível de festa, enquanto é suprimida aquela Comissão Ecclesia Dei, que, desde 2007, havia se tornado um perigoso centro curial, especializado na transformação do jardim eclesial em museu tradicionalista.
Por fim, foi criado um domingo “da Palavra de Deus” (correspondente ao III Domingo do Tempo Comum – Aperuit illis, 2019) para valorizar a experiência de escuta da palavra, em um contexto de relações com a tradição judaica e com as outras confissões cristãs.
Tudo isso ocorre, porém, no contexto de uma condição bastante singular: o papa lança continuamente iniciativas para dinamizar a “festa ritual”, enquanto, a partir da direção da Congregação do Culto, ou seja, do dicastério mais diretamente interessado na liturgia, vêm sinais dissonantes. A recepção retardada dos atos a serem assumidos ou a interpretação invertida dos atos já assumidos é o sinal de uma tensão não resolvida por enquanto, que quase determina uma condição de “impasse”.
Acredito que, para interpretar esse “impasse”, devem-se considerar as dinâmicas da relação entre as iniciativas papais e a sua gestão por parte da Congregação para o Culto Divino. Com efeito, a Congregação para o Culto deveria expressar confiança e verdadeira esperança no Concílio Vaticano II.
Se se confia na liturgia do Vaticano II, se se considera irreversível a reforma litúrgica, se se põe fim ao arriscado “paralelismo ritual” entre formas pré-conciliares e conciliares, como é possível que as iniciativas que Francisco tomou diretamente no campo litúrgico (modalidade do lava-pés, festa de Maria Madalena, novos critérios de tradução...) tenham encontrado uma recepção tão fatigante, quando não uma interpretação decididamente invertida?
O exemplo papal é límpido e linear. Mas o enraizamento de uma liturgia “participada”, que tem como sujeitos Cristo e Igreja, não procede apenas “por exemplos”. Atos institucionais capilares, necessariamente mediados e acompanhados pelos cuidados da Congregação, são passagens inevitáveis e decisivas. Se faltarem, a liturgia permanece imóvel. E, se a liturgia não se move, a Igreja não se move. Porque a liturgia continua sendo, também desse ponto de vista, fons et culmen de qualquer outra ação eclesial.
A reforma da Igreja nunca será possível enquanto permanecer de pé a forma de expressão e de experiência – junto com o aparato sentimental e ideológico – de um modelo da Igreja que o Concílio Vaticano II reconheceu como superado, pedindo a sua atualização explicitamente e com autoridade.
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Sétimo ano do pontificado. Francisco e a ação litúrgica. Artigo de Andrea Grillo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU