Adolfo Nicolás, ex-superior-geral da Companhia de Jesus, morre aos 84 anos, em Tóquio

Adolfo Nicolás, o 30º superior-geral da Companhia de Jesus. Foto: Don Doll, s.j.

21 Mai 2020

Adolfo Nicolás, s.j., o 30º superior-geral da Companhia de Jesus, morreu em Tóquio, Japão, hoje, 20-05-2020. Ele tinha 84 anos de idade.

A reportagem é de Edward W. Schmidt, publicada por America, 20-05-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.

“Com tristeza, mas ao mesmo tempo cheio de gratidão, nós informamos que, hoje, o Senhor chamou para si o padre Adolfo Nicolás, nosso ex-superior-geral”, disse Arturo Sosa, o atual superior-geral, em mensagem à Companhia.

Padre Nicolás serviu à missão da Companhia de Jesus em variados ministérios. Ele foi um acadêmico que ensinou teologia no Japão e era também o diretor do Instituto Pastoral do Leste Asiático no Ateneu de Manila, nas Filipinas.

Ele foi lembrado pelo seu sucessor, o padre Sosa, como “uma pessoa com um espírito de serviço alegre aos outros, sorrindo em meio ao trabalho feito sob pressão”.

“Como superior-geral – disse o padre Sosa – ele trouxe para a Companhia sua profunda vocação missionária que nos ajudou a ver a universalidade da missão para a perspectiva e a paixão de apresentar a Boa Nova em todos os cantos do mundo”.

Adolfo Nicolás | Foto: Reprodução Twitter

De acordo com Sosa, o padre Nicolás “nunca cansou de nos lembrar da profundidade da vida espiritual e intelectual como características da vocação da Companhia... ele optou pelas preferências apostólicas universais e promoveu a reestruturação da Companhia em pedido à adaptação para as novas realidades do mundo e nosso corpo apostólico”.

“Ele nunca perdeu de vista os desafios apostólicos dos crescentes fluxos migratórios e a urgência de atender os refugiados”, relembra Sosa. “A China e o continente africano estavam sempre entre suas prioridades. O serviço para a igreja através das comunidades da Companhia e trabalhos interprovinciais foram confirmados e renovados durante seu tempo como superior-geral. Em resumo, a Companhia sempre será grata ao Senhor pelo presente que foi Adolfo Nicolás”.

“Padre Nicolás era um gentil e compassivo padre que teve extensa experiência no trabalho com outras culturas, assim como um profundo senso da espiritualidade jesuíta e inaciana”, disse James Martin, s.j., editor de America, “tudo isso fez dele um superior-geral sábio, amado e eficaz”.

“Seu conselho aos jesuítas para se esforçar pela ‘profundidade’ causou uma profunda impressão em mim e continua a influenciar minha vocação jesuíta”, disse o padre Martin. “Padre Nicolás também era acalentador e acolhedor. Que ele descanse em paz com o Deus que serviu por tanto tempo”.

Durante sua longa carreira, padre Nicolás serviu na administração jesuíta como reitor da escola de Teologia em Tóquio, como provincial da Província do Japão e como moderador das Conferências Provinciais Jesuítas do Leste Asiático e Oceania, com seu escritório nas Filipinas. Em 2008, na 35ª Congregação Geral dos Jesuítas, foi eleito como o 30º superior-geral da ordem.

A congregação foi convocada pelo seu predecessor, Peter-Hans Kolvenbach, s.j., quem expressou seu desejo de se aposentar da posição de superior-geral ao completar 80 anos. Províncias jesuítas de todo o mundo escolheram seus delegados, que se reuniram em Roma, em janeiro daquele ano.

Os delegados aceitaram o pedido de Kolvenbach e começaram a eleger seu sucessor. Seguindo a prática habitual, por alguns dias os delegados conversaram entre si, orando por orientação.

Padre Nicolás tinha vasta experiência internacional e grandes habilidades administrativas que certamente o tornavam um dos prováveis candidatos ao posto. Acrescentava-se a sua forte identidade jesuíta e senso de missão.

Os delegados o elegeram superior-geral na segunda votação. Como os seus dois imediatos predecessores, ele era um europeu que saiu em missão e despendeu muito da sua vida jesuíta na Ásia – Pedro Arrupe, s.j., serviu no Japão e Kolvenbach no Líbano.

Sua eleição como geral provocou reações muito positivas entre aqueles que o conheceram no Japão e Filipinas. Na edição de 04-02-2008 da revista America, Ben Nebres, jesuíta filipino, presidente do Ateneu da Universidade de Manila e membro da congregação geral, afirmou: “Quando eu penso nele, os sentimentos que vêm são de afeto e amizade. Padre Nico é muitas coisas, mas ele é acima de tudo um companheiro e amigo”.

Padre Nicolás ensinou muitos membros da ordem salesiana na Universidade de Sofia, além de servir como moderador de teses acaêmicas ou diretor espiritual. Um jovem salesiano que trabalhou com ele em um programa para jovens descreveu-o como jinkaku-sha, “um homem de caráter” – um grande elogio no Japão.

Adolfo Nicolás Pachón nasceu em 29 de abril de 1936, em Villamuriel de Cerrato, no norte da Espanha. Em 1953 entrou no noviciado jesuíta em Aranjuez. Em 1960, depois de estudar filosofia na Universidade de Alcalá, mudou-se para o Japão, onde estudou primeiro língua japonesa e depois teologia na Universidade de Sofia, em Tóquio. Ele foi ordenado padre em março de 1967.

No ano seguinte ele retornou à Europa para estudar teologia por três anos na Universidade Pontifícia Gregoriana de Roma. Depois de completar seu doutorado em 1971, voltou à Universidade de Sofia como professor de teologia sistemática até 1991, com uma pausa para seu mandato como diretor do Instituto Pastoral do Leste Asiático, na cidade de Quezon, perto de Manila (1978-84).

Ele também ajudou os jesuítas na Coreia quando eles passaram da liderança dos jesuítas dos EUA para os jesuítas locais. Em 1991, o padre Nicolás foi nomeado reitor da escola de teologia de Tóquio, supervisionando a educação e a formação dos jovens que se preparavam para a ordenação.

Ele ocupou esse cargo até 1993, quando foi nomeado superior provincial dos jesuítas no Japão. Ele serviu, como é padrão, por seis anos neste posto e depois passou quatro anos trabalhando com imigrantes pobres em Tóquio. Depois disso, em 2004, foi nomeado moderador da Conferência dos Provinciais Jesuítas do Leste Asiático e da Oceania; esta conferência inclui Austrália, China, Timor Leste, Japão, Coreia, Micronésia e Mianmar. Sua sede é em Manila.

Alguns meses após sua eleição como superior, o padre Nicolás conversou com jornalistas jesuítas:

“O que eu espero dos jesuítas? Se eu tentar colocar as coisas em uma ideia ou frase, eu diria que realmente espero que estejamos inseridos profundamente no que fazemos – seja trabalho pastoral, educação, pesquisa, espiritualidade – não em termos de sucesso ou em termos de fatores externos. Qualquer que seja o tema, mesmo as questões sobre as quais as pessoas se sentem tão constrangidas (como relacionamentos com a hierarquia local), se pudermos aprofundar o suficiente, podemos encontrar muitas possibilidades de cooperação, de ajudar as pessoas, porque nas mais profundas partes de nós mesmos encontramos o Senhor que inspira nosso melhor serviço aos outros. Pedir aos jesuítas para que se aprofundem nas questões e se aprofundem no discernimento sobre quais são as possibilidades e como podemos servir melhor, será a minha parte principal e central”.

Ele encorajou a criatividade entre os irmãos jesuítas para adaptarem seus ministérios aos contextos de mudança. Em abril de 2010, falando no México em um encontro internacional de educadores de escolas e universidades jesuítas, ele alertou sobre a “globalização da superficialidade”.

“Quando alguém pode acessar muita informação, de modo tão rápido e indolor; quando alguém pode expressar e publicar ao mundo reações imediatas, sem pensar, por blogs ou microblogs; quando a última coluna de opinião do The New York Times ou El Pais, ou o mais novo vídeo viral, pode ser espalhado rapidamente para meio mundo, moldando percepções e sentimentos, então o o trabalho laborioso e meticuloso do pensamento sério e crítico geralmente fica em curto-circuito”.

Ele queria que as escolas e universidades jesuítas fossem diferentes, fossem profundas, para formar pensadores críticos. Ele também queria que toda a Companhia de Jesus estivesse aberta para aprender com a Ásia e os povos “das fronteiras”, como nos primordiais modelos jesuítas de Francisco XavierMatteo Ricci e outros.

Por oito anos e meio, Nicolás governou a Companhia de Jesus desde seu escritório em Roma, nomeando superiores, enfrentando desafios administrativos postos pela reestruturação das províncias, escrevendo cartas e diretrizes para grupos. Ele também viajou o mundo, encorajando ministros locais, aprendendo diretamente com problemas locais, se encontrando com jesuítas comprometidos com seus ministérios locais.

Em 13 de março de 2013, um conclave papal elegeu o cardeal Jorge Mario Bergoglio como o primeiro Papa jesuíta. Padre Nicolás, que o conhecia há mais de duas décadas, emitiu uma declaração para a Companhia no dia seguinte dando “graças a Deus” pela sua eleição, a qual, dizia ele, “abriu a Igreja para um caminho de plena esperança”.

Adolfo Nicolás | Foto: America Magazine

Francisco convidou-o para ir à Casa Santa Marta, em 17 de março, para uma reunião privada e, em seguida, pediu que ele concelebrasse a missa de inauguração do pontificado em 19 de março. Eles permaneceram em contato próximo enquanto o padre Nicolás era superior-geral, e se encontraram pela última vez em Tóquio, em novembro de 2019, quando Francisco visitou o Japão.


Durante sua visita ao Japão, o Papa Francisco encontrou e abençoou o padre Adolfo Nicolás, ex-superior-geral da Companhia de Jesus. Foto: Antonio Spadaro | Twitter

Em 2015, o padre Nicolás anunciou sua intenção de convocar uma congregação geral na qual apresentaria sua renúncia aos 80 anos. Em outubro de 2016, a congregação se reuniu, aceitou a renúncia e elegeu o padre Sosa como seu sucessor.

Na manhã da renúncia, Federico Lombardi s.j., leu à congregação uma expressão de gratidão pelo serviço do padre Nicolás. Ele agradeceu em primeiro lugar pela pessoa que era – por sua cordialidade, seu humor, seu sorriso. Ele era um exemplo de sabedoria derivada da imaginação e de anos de trabalho na Ásia que lhe deram uma ampla perspectiva, afirmou padre Lombardi.


Padre Nicolás cumprimenta Padre Sosa na 36ª Conferência Geral da Companhia de Jesus. Foto: Companhia de Jesus

O padre Nicolás retornou às Filipinas em sua aposentadoria. Ele viveu na comunidade dos escolásticos, onde rapidamente se tornou uma presença amada. Ele enfrentou o declínio da saúde com serenidade e graça. Um dos escolásticos da sua comunidade, Robbie Paraan, refletiu sobre o que sua presença passou a significar para os jovens.

Ele lembrou que o padre Nico, como era chamado por lá, “dirigiu-se a nós escolásticos em uma de nossas reuniões mensais da comunidade... Eu esperava que ele nos dissesse para estudar mais... ou talvez mencionasse seu constante refrão como superior-geral, para sermos pessoas de profundidade. Mas sua primeira mensagem oficial foi surpreendentemente simples, mas, sabendo quem disse isso, foi de grande sabedoria: ‘Seja você mesmo, mas deixe que Cristo toque esse seu eu’”.

O padre Nicolás permaneceu uma inspiração na aposentadoria, um jesuíta fiel nessa nova missão de envelhecer graciosamente.

O padre Sosa, em sua carta anunciando a morte de seu antecessor, disse: “A melhor maneira de lembrar o padre Adolfo Nicolás pode ser com uma breve oração, escrita em suas próprias mãos após um retiro de oito dias com o Conselho Geral em 2011, exercícios que eu tive o privilégio de acompanhar. Muitos meses após esses exercícios, algumas reuniões do Conselho começaram com essa oração, que surgiu da meditação pessoal do padre Nicolás sobre a pesca milagrosa narrada por São João no capítulo 21. É uma excelente síntese de sua pessoa e de sua espiritualidade”:

Senhor Jesus,
Que fraquezas viste em nós que te fizeram decidir por nos chamar, apesar de tudo, para colaborar em tua missão?
Agradecemos por nos ter chamado e pedimos que não esqueças tua promessa de estar conosco até o fim dos tempos.
Frequentemente somos invadidos pelo sentimento de ter trabalhado a noite toda em vão, esquecendo, talvez, que estás conosco.
Pedimos que te faças presente em nossas vidas e em nosso trabalho, hoje, amanhã e no futuro ainda por vir.
Enche nossas vidas com o seu amor, que colocamos ao teu serviço.
Tire de nossos corações o egoísmo de pensar sobre o que é “nosso”, o que é “meu”, sempre excluindo, sem compaixão e alegria.
Ilumine nossas mentes e nossos corações, e não esqueçe de nos fazer sorrir quando as coisas não correrem como desejávamos.
No final do dia, de cada um de nossos dias, faz-nos sentir mais unidos a ti e mais capazes de perceber e descobrir, ao nosso redor, maiores alegrias e maiores esperanças.
Pedimos tudo isso a partir da nossa realidade. Somos homens fracos e pecadores, mas somos teus amigos. Amém.

O padre Sosa concluiu: “A leitura desta oração revela o verdadeiro Adolfo: um homem sábio, humilde e livre; total e generosamente prestado ao serviço; movido por aqueles que sofrem no mundo, mas ao mesmo tempo transbordando de esperança extraída de sua fé no Senhor ressuscitado; um excelente amigo, que adorava rir e fazer os outros rirem; um homem do evangelho. É uma bênção tê-lo conhecido”.

“Ao orarmos por sua eterna felicidade com o Senhor, a quem ele serviu tão bem, pedimos para poder continuar a servir a missão como ele, com bondade, generosidade e alegria”.

 

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