Villavicencio: cidade colombiana de ''vítimas e vitimadores''

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10 Setembro 2017

Durante a sua viagem à Colômbia, o Papa Francisco visitou Villavicencio. Ela é chamada de lugar onde o “resto da Colômbia começa”, vastas áreas de terrenos acidentados e escassamente povoados, junto com a região amazônica – uma área tomada pelas guerrilhas, que usaram a sua densa vegetação como cobertura. Nessa região, o acordo de paz assinado pelo governo federal e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), ainda é visto com desconfiança por muitos, incluindo alguns membros da hierarquia da Igreja.

A reportagem é de David Agren, publicada por Crux, 07-09-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

As pessoas necessitadas nessa cidade, situada no coração da região pecuarista da Colômbia, fazem fila junto ao banco de alimentos do Papa Francisco, um armazém construído com uma doação do pontífice.

O padre Carlos Ricardo, diretor das pastorais sociais da Arquidiocese de Villavicencio, disse que a instalação responde a uma grande necessidade em uma região onde as pessoas foram expulsas das suas terras por causa da violência que aflige a Colômbia e tiveram que recomeçar em barracos construídos ao redor de Villavicencio.

“É uma cidade de assentamentos, composta por pessoas que tiveram que deixar suas terras devido à guerra”, disse Ricardo. “Villavicencio é composta por vítimas e vitimadores. Ambos estão aqui. Há pessoas deslocadas que perderam suas casas e as coisas que tinham. Há também pessoas reinseridas na sociedade pelos grupos guerrilheiros e pelos paramilitares.”

Francisco chegou à Colômbia no dia 6 de setembro para uma visita de cinco dias. Entre as quatro cidades que ele visitará está Villavicencio, onde ele celebrará a missa para cerca de 700 mil pessoas – incluindo indígenas colombianos – e depois oferecerá orações pela reconciliação, nas quais se esperam vítimas da violência vindas de todos os cantos da Colômbia.

Promover a reconciliação é um tema recorrente na viagem do papa e uma prioridade entre os católicos na Colômbia após cinco décadas de conflitos armados e a assinatura de um acordo de paz entre o governo e o principal grupo guerrilheiro.

Villavicencio, a 120 quilômetros a sudeste da capital, Bogotá, é a porta de entrada para regiões remotas, como a Amazônia, e Francisco também deverá promover a reconciliação com a criação e falar sobre questões ambientais.

Autoridades da Igreja dizem que a viagem a Villavicencio, com uma população de 500 mil habitantes e que cresceu rapidamente ao longo da última década à medida que pessoas deslocadas iam chegando, está cheia de simbolismos e pretende enviar uma mensagem sobre temas importantes para a Colômbia e para a Igreja como um todo.

Villavicencio “foi o coração do conflito durante muitos anos nesta região, com muitos grupos armados diferentes”, disse o Mons. Héctor Fabio Henao, diretor da Cáritas Colômbia. É uma cidade onde Francisco “vai encontrar as vítimas do conflito armado”.

“Ela também está na estrada para a Amazônia. O papa pode apontar para a Amazônia, em direção aos seus habitantes, à destruição da selva ao longo das décadas e fazer uma referência à reconciliação com a natureza”, disse ele.

Os moradores locais chamam Villavicencio de porta entrada para o “Llano”, as planícies da Colômbia. Com uma abundância de terra disponível, Ricardo diz que a região atraiu pessoas deslocadas de todo o país, que tiveram que recomeçar do nada depois da perda de suas propriedades.

Embora perto da capital, Villavicencio é descrita como um gargalo para aqueles que viajam para o sul da Colômbia. É também o lugar onde “o resto da Colômbia começa”, vastas áreas de terrenos acidentados e escassamente povoados, junto com a região amazônica – uma área aproveitada pelas guerrilhas, que usaram a sua densa vegetação como cobertura.

A área tem sido amplamente esquecida pelo governo. Paramilitares, muitas vezes pagos pelos produtores de palmeiras, infligiram violência contra populações vulneráveis. A Igreja Católica tem desempenhado um papel ao prestar serviços onde o Estado tem sido ausente.

Esse trabalho nem sempre foi apreciado por aqueles que detêm posições de poder. Os padres que atendem as populações com opiniões políticas impopulares ou em áreas ocupadas por grupos guerrilheiros são vistos com suspeita ou como promotores da teologia da libertação.

“Houve assassinatos de lideranças dos direitos humanos e de padres por defenderem os direitos humanos, por parte do próprio Estado”, disse Ricardo. “Nós trabalhamos com os pobres, dando-lhes a palavra de Deus, mas as elites pensam que nós somos subversivos, que se não estamos com eles, estamos contra eles, que estamos espalhando uma mentalidade revolucionária.”

Enquanto estiver em Villavicencio, o pontífice vai beatificar dois mártires: o bispo Jesús Emilio Jaramillo Monsalve de Arauca – que foi assassinado por guerrilheiros marxistas em 1989 em uma área marcada por conflitos – e o padre Pedro María Ramírez. Este último foi agredido até a morte por um grupo armado com facões em 1948, após o assassinato do candidato à presidência Jorge Eliecer Gaitán, cujo Partido Liberal foi muitas vezes desprezado pela Igreja Católica.

Nessa região, o acordo de paz assinado pelo governo federal e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), ainda é visto com desconfiança por muitos, incluindo alguns membros da hierarquia da Igreja.

Ricardo expressou a esperança de que a viagem do papa a Villavicencio possa “dar uma única direção” para a Igreja, no sentido de seguir as tentativas de promover a paz na Colômbia.

A reconciliação não será fácil, mas alguns em Villavicencio parecem estar dispostos.

“O perdão é difícil”, disse Jeydi González, diretora da pastoral social arquidiocesana de Villavicencio, cujo pai estava entre seis homens assassinados por paramilitares. O que dificulta ainda mais o perdão são disposições ligadas aos acordos de paz que farão com que um dos assassinos de seu pai – outros quatro envolvidos foram mortos – terá a sua sentença reduzida de 50 para sete anos.

“Eu estou muito feliz” porque o papa está vindo para a Colômbia, “mas também ansiosa para saber o que ele vai dizer”, disse González, que reconhece que o acompanhamento de um padre após o assassinato de seu pai ajudou a sua família em um momento em que outros do seu povoado os viam com desconfiança. “Eles nos estigmatizaram”, disse ela, porque achavam que o seu pai estava envolvido com a guerrilha.

A intervenção do padre também lhe proporcionou a oportunidade de continuar estudando e concluir um mestrado em uma universidade canadense.

González disse esperar que Francisco “possa ajudar a trazer uma mensagem que fale à nossa realidade, ao contexto que a Colômbia está experimentando”.

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