13 Janeiro 2022
As chamas que envolveram a catedral de Notre-Dame em Paris na noite de 15 de abril de 2019 quase destruíram uma igreja. Elas também são o prenúncio do fim próximo da Igreja Católica Romana?
A reportagem é de Luca Kocci, publicada por Il Manifesto, 12-01-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Esta é a pergunta que permeia as páginas do último livro do historiador Andrea Riccardi (La Chiesa brucia. Crisi e futuro del cristianesimo, “A Igreja queima. Crise e futuro do cristianismo”, em tradução livre, Laterza, pp. 248, euro 20) que, embora partindo de um fato pessoal de fé - é fundador da Comunidade de Santo Egídio -, analisa em profundidade a crise da Igreja e admite: "falar de estado terminal ou de forte crise não é sinal de incredulidade ou de pessimismo, mas equivale a levar em consideração uma hipótese interpretativa da realidade".
“La Chiesa brucia.
Crisi e futuro del cristianesimo”
[A Igreja queima. Crise e futuro do cristianismo,
em tradução livre]
(Ed. Laterza), escrito por Andrea Riccardi
A crise é global, mas a Europa é o foco e as respostas são diferentes. Na França "secular", há quem, como o cientista político Jerôme Forquet, estime que o último batismo será celebrado em 2048. Há algum tempo, na Itália e na Espanha estão acertando as contas com o fim do "regime do cristianismo". Na Alemanha, para enfrentar a crise, tenta-se o "caminho sinodal", que se configura como "alternativa progressista" ao Bergoglio-pensamento, que não gosta de "reformas puramente estruturais".
Nos antigos países comunistas do leste, por outro lado, após a ressaca capitalista, a saída da crise indicada por Orbán, Kaczynski & cia. - algo que os nossos Meloni e Salvini gostariam mas não conseguem - está à direita, com o "nacional-catolicismo", que se pensava morto com Mussolini, Franco e Salazar e que, ao contrário, voltou a ser de grande atualidade, também devido à deterioração ou ao desaparecimento das várias Democracias Cristãs, "partidos nacionais mas não nacionalistas".
É sobre as causas da crise que a análise de Riccardi parece mais discutível, uma vez que ele a reconduz em grande parte à mistura 1968-Concílio Vaticano II (e sua recepção no período pós-conciliar). O primeiro viu o triunfo da "revolução individualista", a afirmação do eu e a negação do pai e da autoridade, inclusive eclesiástica. O segundo foi uma espécie de reformismo iluminado sem povo: "tal visão, em perfeita boa-fé, pretendia elevar e purificar a fé do povo", que no entanto "era pouco considerado como ator no processo", enquanto "é um ator principal".
O "papado carismático" de João Paulo II deteve parcialmente o "declínio". Mesmo que Riccardi mantenha apropriadamente em aberto a questão: Wojtyla parou ou apenas "encobriu" a crise?
Apesar do retrato apologético do papa polonês, Riccardi admite que a história é "complexa" e acredita que João Paulo II foi vítima da Cúria e, em certo sentido, de si mesmo: o Jubileu de 2000 foi sua "proposta de autorreforma da Igreja", que no entanto "a máquina dos eventos", propiciada pelo próprio Wojtyla, "colocou em segundo plano". O resultado é que "não foi realizada, devido ao estado de saúde do papa, mas também porque não foi considerada pelas estruturas da Igreja".
No século XX - encerrado precisamente por João Paulo II - o debate girou em torno de duas posições: os que acreditavam que “era um erro mudar num mundo em mudança” e os que acreditavam ser necessário “reformar em profundidade”. Hoje, no "tempo global" em que não há mais o inimigo comunista - que para a Igreja constitui um ponto de referência - tudo é mais complexo, e a Igreja parece não ter mais os instrumentos de análise para entender o presente e imaginar o futuro. A escolha, e o erro, parece ser uma espécie de "presentismo": "resolver dificuldades, preencher os vazios, manter igrejas e atividades abertas". Porém sem enfrentar a crise, no máximo administrando o declínio.
E Francisco? Para ele, as reformas estruturais não são a solução: Riccardi tem a lucidez para admiti-lo, ao contrário de outros cantores acríticos, inclusive leigos, do pontífice "revolucionário". O caminho apontado pelo papa é a "profecia evangélica" - bem diferente do "progressismo católico" - que relança a "Igreja dos pobres", mas que requer tempos longos. E, acrescentamos, na ausência daquelas reformas que Bergoglio não quer, com a possibilidade de que Francisco não seja seguido por um Francisco II, mas por um Pio XIII, que leve de volta os ponteiros da história da Igreja.
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Geopolítica do Cristianismo. Entre crises e reformas possíveis - Instituto Humanitas Unisinos - IHU