Formação Presbiteral: Desafios Morais

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09 Março 2021

"As temáticas oferecidas caminham em sintonia com as condições de nosso tempo – uma vez que é preciso conhecer bem a realidade para assumi-la e transforma-la à luz do Evangelho. Fazem-se necessárias pessoas integradas, instituições educativas renovadas, ambas capazes de ler e interpretar os “sinais dos tempos”. Os conhecimentos insuficientes das mudanças culturais, a fraca qualidade do processo formativo e a estratificação das estruturas por certo dificultaram os resultados almejados pela Igreja quanto a contar com ministros qualificados e competentes. Por isso que vale sempre a pena deixar-se questionar", escreve Eliseu Wisniewski, ao fazer a resenha do livro Formação: desafios morais 2 [1].

Eliseu Wisniewski é presbítero da Congregação da Missão (padres vicentinos) Província do Sul, mestre e doutorando em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).

 

Eis o artigo.

 

Formação: desafios morais 2

Formadores e formadoras em seminários, casas religiosas e comunidades de vida têm como desafio e compromisso a edificação de uma nova cultura formativa, que privilegia a moralidade da transparência do próprio formando/a, refletindo dentro de si mesmo a perspectiva do sal da terra e da luz do mundo. Nesse espírito, Dom Ricardo Hoepers – Bispo da Diocese do Rio GrandeRS – situa a obra Formação: desafios morais 2 – organizada por três especialistas em Teologia Moral: José Antonio Trasferetti; Maria Inês de Castro Millen e Ronaldo Zacharias (Paulus, 2020, 464 p.).

Hoepers (p. 5-10) ressalta que, na linha do enfoque poliédrico proposto pelo papa Francisco, esta obra, composta de vinte (20) reflexões, “vem contribuir significativamente para essa visão poliédrica, dinâmica e atual dos temas morais e das diferentes abordagens que respeitam o diálogo e a prudência pastoral necessários para um processo de formação da consciência” (p. 10).

Na primeira reflexão, o mestre em Teologia, Tiago Santos da Silva, descreve o processo formativo da vida religiosa como um caminho de socialização, crescimento e oblatividade (p. 11-32). Tendo por base a antropologia de Karl Rahner – que entende o caminho formativo como processo de tornar-se pessoa numa dinâmica de socialização-relação (p. 14-19) – “a socialização, ou seja, as relações que estabelecemos com toda a realidade que nos cerca, vai encaminhando-nos para uma teia de relações que nos configura como pessoas” (p. 14). O processo formativo é expressão de liberdade e reponsabilidade, que leva consequentemente a um caminho de crescimento da pessoa (p. 19-24). No entendimento do autor, “trata-se de dois aspectos que são elementos fundamentais do próprio processo formativo, isto é, o processo formativo deve ser expressão de uma adesão livre e responsável” (p. 14). O caminho formativo é também expressão de oblatividade (p. 25-30), isso porque “a pessoa, como sujeito do processo, faz uma adesão livre e responsável de seguimento a Jesus, que se expressa de maneira concreta na oblatividade” (p. 14).

O discernimento vocacional é assunto da segunda reflexão, de autoria do mestre em Educação, Roque Luiz Sibioni, o qual descreve o discernimento vocacional como uma experiência relacional de escuta e respeito (p. 33-58). Sibioni ajuda-nos a entender que “todo caminho de discernimento vocacional se dá dentro de um processo de acompanhamento espiritual, que deve levar o vocacionado a refletir sobre o elemento central de um projeto de vida: a vocação ao amor. Toda a inquietação vocacional está centrada na capacidade e disposição de a pessoa amar e ser amada, e na certeza da fecundidade da graça de Deus na sua vida” (p. 33). O caminho oferecido pelo autor nesse capítulo aprofunda elementos que ajudam a compreender melhor o tema da cultura vocacional (p. 34-39), do discernimento vocacional (p. 39-49) e do processo formativo (p. 49-56). Assim o “discernimento vocacional, além, de contemplar uma visão positiva sobre os vários estados de vida existentes na Igreja, deve levar a pessoa a optar por aquele que melhor contribui para a vivência da sua vocação cristã para o amor, para a sua santificação e felicidade, e para o serviço à Igreja” (p. 34).

Amar como pastores. O desafio de educar para atitudes que manifestem misericórdia (p. 59-72) é a reflexão do terceiro capítulo feita por Boris Agustín Nef Ulloa, doutor em Teologia Bíblica. Chamando a atenção para a urgência de “formar as novas gerações de seminaristas para a experiência da graça, da gratuidade, da reverência diante do dom divino” (p. 71), o autor apresenta os elementos essenciais que podem constituir um pastor autêntico segundo o coração de Deus e sublinha a humanidade integrada e adulta de um ministro ordenado (p. 65-66), a humanidade de Cristo como paradigma de uma humanidade autêntica (p. 67), a necessidade de equipes formativas altamente capacitadas no campo do discernimento espiritual a experiência filial e humana de Cristo (p. 69-71).

A fragilidade vocacional e institucional é abordada pelo doutor em Teologia Moral, Ronaldo Zacharias, no quarto capítulo (p. 73-102). Zacharias parte do pressuposto de que os “candidatos à vida sacerdotal e religiosa são pessoas frágeis, mas as instituições que os acolhem e que lhes propõem um processo formativo também são. Assim como as pessoas podem comprometer a missão e uma instituição, a própria instituição pode comprometer a perseverança das pessoas” (p. 73-74). Interrogando seriamente o sistema de formação e as estruturas por meio das quais realiza-se o ministério pastoral (p. 102), na primeira parte da reflexão, são tecidas considerações sobre a fragilidade vocacional (p. 74-86) e, na segunda, são feitas considerações sobre a fragilidade institucional (p. 86-98). Em cada uma dessas partes é apresentado um exame de consciência com o intuito de “fortalecimento da identidade pessoal e da vocação institucional” (p. 74), tendo como objetivo - “seja qual for a etapa do processo formativo que as pessoas se encontram -, evidenciar quão é importante que o grão caia na terra e morra para que possa gerar vida e, assim, dar muitos frutos” (p. 74).

O quinto capítulo (p. 103-131), de autoria do pós-doutor em Sociologia Cesar Teixeira Castilho e pelo doutor em Serviço Social, William Cesar Castilho Pereira, “propõe apresentar algumas questões para o debate em torno do sofrimento psíquico na formação da vida presbiteral e religiosa” (p. 103). O “sofrimento psíquico é um estado de profunda angústia, desamparo e abandono” (p. 104). A partir dessa compreensão, o propósito dos autores é ampliar o debate sobre o tema abordando as dimensões espiritual (p. 110-116), afetiva (116-120), socioeconômica e intelectual (p. 120-123) e referente à corporeidade/saúde (p. 123-128). As considerações finais chamam a atenção para duas concepções filosóficas de educação na fé nos seminários e nas casas de formação: a ascese sacrificante (p. 129-131) e a ascese emancipatória (p. 129-131). Para os autores, o “sofrimento psíquico do sujeito está relacionado também à escolha de concepção filosófica, educacional e teológica da fé” (p. 131).

A reflexão do sexto capítulo, escrito pelo doutor em Teologia Moral, José Antônio Trasferetti, partindo de sua experiência pessoal, aborda o papel dos formadores na formação inicial dos presbíteros (p. 133-163). Diante da diversidade de experiências de formação e muitas formas de compreender o processo formativo, as reflexões inicias chamam a atenção para o seminário: reclusão repressiva ou educativa? (p. 135-140). Em seguida, a atenção se volta para o ideal dos documentos do Magistério da Igreja, em especial a Ratio Fundamentalis Institutionis Sacerdotalis (p. 140-147). Dentre outros aspectos, Trasferetti salienta que o papel dos formadores precisa ir além das formalidades e aparências (p. 145-147) e das burocracias e/ou formalidades do cargo, a fim de “penetrar no âmago da formação, conhecendo as artimanhas do ser humano” (p. 163).

Ciberformadores (formadores que atuam paralelamente nos ambientes dos seminários diocesanos e casas de formação) e ciberfomandos (geração nascida na era digital) são temas do sétimo capítulo, escrito pelo mestre em Educação, João da Silva Mendonça Filho. Não é mais possível deixar de lado a presença e a influência das novas tecnologias na formação. Elas estão a um clique! É aí que se encontram os ciberformadores a serviço de uma formação paralela (p. 165-187). Os ciberespaços “são janelas luminosas que seduzem” (p. 173) e contribuem para que os candidatos à vida consagrada e presbiteral “entrem gratuitamente no jogo da overdose cognitiva, que apenas favorece a formação de personalidades controvertidas, irreverentes, sem causa e escandalosamente revestidas de um conservadorismo prático” (p. 165). Os ciberformadores paralelos, por sua vez, “estão a um clique do celular e do computador, propondo-se como alternativa aos currículos de Filosofia e Teologia” (p. 177). O autor elenca algumas questões a serem ajustadas pelos formadores oficiais (p. 178-182) e pelas equipes de formadores (182-185), a fim de proporcionar um equilibrado processo educativo no ambientes de formação.

Os temas “obediência e liberdade” são abordados a partir das experiências vividas pela doutora em Teologia Moral, Maria Inês de Castro Millen, no oitavo capítulo. Diante da “falta de conhecimento teórico e prático do que são a liberdade e a obediência” (p. 189), faz-se urgente superar o medo e a mentira (p. 189-205). A autora ajuda-nos a pensar o que entendemos por liberdade (p. 190) e por obediência (p. 194-198) e aponta para as nefastas consequências da falta de liberdade (p. 198-199): “pessoas amedrontadas se tornam mentirosas, se escondem por trás de máscaras necessárias à sobrevivência, são lisonjeadoras de quem não gostam e, em muitos casos se tornam, no futuro, seres humanos frustrados, neuróticos, vingativos, carrascos dos outros. O medo da liberdade faz com que as pessoas adotem a submissão de si e dos outros como lema” (p. 199). Com as contribuições de Paulo Freire e Bernhard Häring, Millen destaca o valor terapêutico do diálogo para a liberdade responsável, fiel e criativa (p. 199-205).

A nona reflexão, de autoria do doutor em Ética Teológica, Alexandre A. Martins, tendo como pano de fundo a formação nos seminários e casas religiosas, oferece elementos para pensar o poder e sua relação com a justiça e a promoção do outro (p. 207-225). O autor distingue o poder como força (p. 210-214) do poder como serviço (p. 214-218). Exemplifica como a relação abusiva com o poder gera opressão e sofrimento. Como último aspecto para pensar o poder, acrescenta os conceitos de empatia e discernimento, esclarecendo-os a partir da perspectiva de Edith Stein e do Papa Francisco (p. 218-223).

Ciúme e inveja são assuntos tratados como pragas na décima reflexão, de autoria do mestre em Psicologia, Cássio Rodrigo de Oliveira (p. 227-247). Sendo um tema pouco discutido e raramente enfrentado na formação inicial para a vida religiosa e presbiteral, o presente capítulo pretende esclarecer tais fraquezas em três momentos: a) ciúme e inveja como parte integrante da condição humana (p. 229-235), b) o desenvolvimento do ciúme e da inveja na formação (p. 235-237), c) a institucionalização do ciúme e da inveja (cp. 237-240). Por fim, são apresentados caminhos para a integração, como possibilidade para se libertar das pragas do ciúme e da inveja: base humana consistente e volta ao amor inicial (p. 240-244).

A praga do clericalismo é abordada pelo doutor em Ciências Sociais, Fernando Altemeyer Junior, no décimo primeiro capítulo (p. 249-261). Altemeyer introduz a temática mostrando como surgiu o clero na história dinâmica da Igreja católica (p. 249-253). Em seguida, descreve o clericalismo como uma doença letal com cicatrizes permanentes (p. 254-256), uma “perversão da Igreja e dos seus ministérios” (p. 254). Por isso, faz-se necessário, na esteira do papa Francisco, redescobrir que a Igreja é Povo de Deus (p. 256-261), redescoberta que deverá ser feita sem medo, uma vez que o clericalismo “anula a personalidade dos cristãos” (p. 256).

O processo formativo depara-se também com o exibicionismo e a autorreferencialidade. O doutor em Teologia Moral, André Luiz Boccato de Almeida, trata deste desafio formativo no décimo segundo capítulo (p. 263-284). Eis a ideia e a hipótese: “partimos da ideia segundo a qual há certo mal-estar proveniente das rápidas mudanças das relações interpessoais. A hipótese é a de que as subjetividades no processo formativo, centradas em um modus vivendi egocêntrico e autorreferencial, podem não propiciar um verdadeiro amadurecimento existencial, já que discernir seriamente exige uma constante saída de si para o encontro com o outro” (p. 264). As reflexões desse capítulo são estruturadas em dois momentos: a) o exibicionismo narcisista e o contexto formativo (p. 265-276), b) a autorreferencialidade e o desafio do processo formativo (p. 276-284). “Comportamentos exibicionistas, egocêntricos e autorreferenciais fazem parte de um processo muito sutil e mais abrangente, próprio do contexto de uma sociedade em que o individualismo e a idolatria do “eu”, da própria imagem construída narcisicamente, está relacionado ao processo de amadurecimento afetivo-sexual. Esse contexto é gerador de um mal-estar tanto para os formadores que representam a instituição e os valores a serem assumidos, como também para os formandos, já acostumados à própria construção pessoal previamente vinculada à cultura do exibicionismo, do egocentrismo e da autorreferencialidade” (p. 264).

“Pensar a formação em tempos em que a “imagem” toma lugar de grandíssimo destaque é um desafio gigantesco” (p. 285). Fama, sucesso, brilho: a síndrome do palco e dos holofotes é o tema do décimo terceiro capítulo, escrito pela mestra em Teologia Prática, Rosana Manzini (p. 285-299). Luz, câmera, ação estruturam as reflexões desse capítulo. Busca-se jogar luzes num mundo de imagens (p. 287-291), olhar as imagens captadas e transmitidas (p. 291-293) - constatando que quando “acendemos os holofotes, nem sempre o que visualizamos corresponde ao que desejamos” (p. 291) - e agir “longe dos holofotes” (p. 293-296). No entender da autora, a “busca da fama, do sucesso e do brilho é reflexo de um sistema perverso que invadiu o mundo religioso, que leva à escolha da servidão das ilusões em detrimento da liberdade que humaniza” (p. 298).

A décima quarta reflexão, de autoria da psicóloga e especialista em Educação Sexual e em Terapia Sexual, Ana Cristina Canosa, aborda a questão da possível realização sexual em estruturas formativas (p. 301-315). A abordagem contempla quatro aspectos: a) integração/realização sexual (p. 302-305), b) repressão sexual (p. 306-309), c) saber sexual (p. 310-312), d) ser virtual (p. 313-314). Esclarece a autora que, “embora sejam apresentadas separadamente, é preciso considerar tais questões na sua unidade e, sobretudo, assumi-las num contexto mais amplo de construção de uma nova cultura de relações. Isso obrigará, certamente, a inserir no processo formativo questões de gênero, saúde sexual, maturidade afetiva como parte do processo, superando a tentação de servir-se delas simplesmente como temas cosméticos” (p. 302).
A questão da mulher na formação do clero é a proposta apresentada no décimo quinto capítulo, de autoria da doutora em Teologia, Arlene Denise Bacarji (p. 317-334), perpassando “aspectos da sexualidade que impactam nas relações com as mulheres, assim como caminhos que poderão ser tomados” (p. 317). Destacam-se alguns problemas que devem ser levados em conta: o modelo tridentino dos seminários, a questão da maturidade, a presença de pessoas homossexuais, a cultura clerical (p. 317-319). Num segundo momento, são feitas considerações sobre a maturidade afetiva (p. 320-326), seguidas de propostas (p. 327-329) e indicações para os formadores (p. 329-331).

Negritude e formação para a vida consagrada e presbiteral ocupam as páginas do décimo sexto capítulo (p. 335-354). Faustino dos Santos, mestrando em Teologia, tendo consciência da abrangência do tema, delimita sua contribuição apresentando alguns pontos específicos: a) o embranquecimento dos modelos de formação (p. 337-343), b) a necessidade da superação do racismo estrutural nas casas de formação (p. 343-347), c) a afirmação da identidade racial verdadeiramente livre (p. 347-352). Destaca que “a luta pelo racismo nas estruturas de formação passa pelo esforço de uma formação multicultural e multirracial sem segregação, para a qual as experiências dos formandos sejam consideradas centrais e significativas no processo formativo” (p. 352).

No décimo sétimo capítulo, tendo-se em conta que “a formação litúrgica do clero é uma preocupação que aparece nos artigos preliminares da Constituição Litúrgica Sacrossanctum Concilium, tendo em vista a reforma da liturgia” (p. 360), Danilo César dos Santos Lima, mestre em Liturgia, olha especificamente para a recepção litúrgica do Concílio Vaticano II nas casas de formação (p. 355-374). O autor recorda os princípios que regem a liturgia da Igreja e trata, na sequência, dos meios para a efetivação da reforma de toda a liturgia (p. 360-364). Analisam-se as normas práticas referentes à formação dos pastores e agentes de pastoral e da promoção da liturgia (p. 364-373). Cada item analisado no texto conciliar é colocado em diálogo com o magistério do papa Francisco, com a liturgia atual e com documentos atinentes à formação dos presbíteros, religiosos e religiosas.

Diego Atalino de Melo, bacharel em Teologia, tece reflexões sobre o empenho pastoral e a necessidade de formar-se tocando as feridas da humanidade sofrida (p. 375-392), no décimo-oitavo capítulo. Chamando a atenção para o fraco engajamento pastoral daqueles que ouviram o chamado do Senhor (p. 376), o autor destaca o desafio dos seminários para a formação de discípulos missionários com cheiro de ovelhas, segundo o modelo do Bom Pastor (p. 377). Ao mesmo tempo em que “alguns parecem até esquecer ou negar a própria história ou passado de simplicidade e até mesmo de pobreza” (p. 380), há “o crescente interesse das novas gerações por questões relativas à liturgia, às vestes, às celebrações e à doutrina” (p. 382). O porquê do desejo de um culto ligado ao passado, pode ser melhor compreendido por meio do conceito de “retrotopia”, proposto por Bauman (p. 383-385). Para o autor, merecem um olhar atento as estruturas formativas e os locais onde se encontram as casas de formação (p. 388-389) e a coerência dos formadores para ajudar no processo de engajamento pastoral das novas gerações (p. 389-390).

A vida em comunidade e o espírito de fraternidade são abordados pela religiosa doutora em Língua Portuguesa, Vânia Cristina de Oliveira (p. 393-414). A proposta da autora não é repetir ideias e conceitos já conhecidos, mas propor “o cuidado amoroso e fraterno consigo e com os irmãos e irmãs de caminhada” (p. 393). Sua reflexão caracteriza-se mais “por ser uma meditação do que um estudo” (p. 413), com o intuito de “ajudar a fugir de uma utopia comunitária que nos leva a nos desinteressar pelo presente em que estamos inseridos, talvez para fugir dos conflitos e problemas, para abraçar a vontade de Deus no hoje de nossa vida e história, revigorando nosso compromisso batismal” (p. 413). Isso porque “a proposta para qualificar nosso viver em comunidade passa, necessariamente, pelo humilde reconhecimento de que não somos nós que escolhemos as pessoas que convivem ou não conosco, mas é o Senhor quem chama os que quer para estar com Ele” (p. 395).

O vigésimo capítulo lança um olhar sobre a formação acadêmica e intelectual e sobre o risco de contentar-se com o minimalismo (p. 415-435). O doutor em Teologia Moral, Mário Marcello Coelho, destaca que o novo contexto virtual, de biotecnologias, da informação, da comunicação, da internet desafiam a fé e a razão, pois pedem respostas novas. Daí a exigência de uma sólida formação filosófica e teológica (p. 416-417). O autor esclarece o que significa educar/formar (p. 417-419) situa a formação intelectual dos futuros presbíteros no processo formativo (p. 420-422), chama a atenção para as mudanças na sociedade e para o impacto na formação (p. 422-428) e conclui apresentando alguns desafios para a formação intelectual (p. 428-435).

****

Formação: desafios morais 2 é o terceiro volume da Coleção Ministérios. No primeiro volume, Formação: desafios morais (Paulus, 2018), vários autores competentes se dispuseram a abordar temas desafiadores para a formação hoje. Por sua vez, o segundo volume, Igreja e escândalos sexuais: a urgência de uma nova cultura formativa (Paulus, 2019), apresentou como proposta de reflexão a espinhosa temática dos escândalos sexuais e a urgente necessidade de edificar uma nova cultura formativa. Eis alguns temas encontrados nestas obras: estilo de vida profético, poder e serviço, vida espiritual, formação intelectual, cultura e subculturas gays, orientação afetivo-sexual, formação e redes sociais, formação permanente, formação afetivo-sexual dos formadores, integração da sexualidade, celibato, qualidade das relações dentre outras relevantes temáticas voltadas para a formação inicial dos presbíteros e consagrados. A leitura e a reflexão de cada um dos capítulos destas obras são um excelente auxílio para a formação permanente de todos, tanto no processo de formação inicial quanto permanente.

Em relação ao terceiro volume, as temáticas oferecidas caminham em sintonia com as condições de nosso tempo – uma vez que é preciso conhecer bem a realidade para assumi-la e transforma-la à luz do Evangelho. Fazem-se necessárias pessoas integradas, instituições educativas renovadas, ambas capazes de ler e interpretar os “sinais dos tempos”. Os conhecimentos insuficientes das mudanças culturais, a fraca qualidade do processo formativo e a estratificação das estruturas por certo dificultaram os resultados almejados pela Igreja quanto a contar com ministros qualificados e competentes. Por isso que vale sempre a pena deixar-se questionar.

Sabedores de que a realidade atual exige maior atenção aos projetos de formação dos seminários e casas de formação, os vocacionados necessitam da presença de bons formadores e de um projeto formativo que lhes permita construir sua solidez como pessoas humanas e cristãs, autêntica e evangelicamente discípulos-missionários. Além disso, poderão servir-se das contribuições/reflexões oferecidas pelos diferentes autores dessa substanciosa obra, estimulando o debate/aprofundamento no horizonte de um trabalho formativo mais eficaz e respeitoso de cada formando/a.

 

Nota:

[1] TRASFERETTI, José Antonio; MILLEN, Maria Inês de Castro; ZACHARIAS (Orgs.). Formação: desafios morais 2. São Paulo: Paulus, 2020, 464 p. ISBN 978655562115.

 

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