‘O poder do capital faz duas coisas muito bem: mentir e dar boas razões para matar’. Entrevista com David Sanchéz Rubio

Pesquisador da Universidade de Sevilha analisa situação dos direitos humanos no mundo e tentativa de demonizar essa agenda

Foto: Mobilus In Mobili | Wikimedia Commons

31 Agosto 2021

 

Os últimos anos vêm sendo palco de uma ofensiva internacional contra a agenda dos direitos humanos e contra a própria existência dessa ideia. O crescimento da extrema-direita em várias regiões do mundo alimenta, ao mesmo tempo, uma cultura de criminalização e demonização dos direitos humanos, e um processo de inversão ideológica dessa agenda. “Sempre que ocorreu uma inversão ideológica dos direitos humanos, há criminalização e demonização do outro para dar boas razões para matá-lo”, diz David Sanchéz Rubio, professor do Departamento de Filosofia do Direito, da Universidade de Sevilha. No dia 25 de agosto, David Sanchéz Rubio fez a aula inaugural do Curso de Direitos Humanos em Homenagem ao centenário de Paulo Freire. O curso é uma iniciativa do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), em parceria com a Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil (AMDH) e apoio do Núcleo de Estudos para a Paz e os Direitos Humanos da Universidade de Brasília (NEP/UNB) e do Departamento de Filosofia do Direito, da Universidad de Sevilha (Espanha).

 

A reportagem é de Marco Weissheimer, publicada por Sul21, 30-08-2021.

 

Em entrevista ao Sul21, David Rubio fez uma análise sobre a situação dos direitos humanos no mundo dentro de um cenário de crescimento de forças políticas de extrema-direita em vários países, como é o caso de Brasil e Espanha, e seus discursos de ódio, carregados de xenofobia, homofobia, racismo e demonização do outro. Para Rubio, esse populismo de extrema-direita, junto com o pensamento conservador que predomina em nível global, é parceiro do sistema capitalista em seu atual estágio neoliberal. Ele cita o filósofo alemão Franz Hinkelammert, para quem o poder do capital em sua forma neoliberal faz duas coisas muito bem: mentir e dar boas razões para matar. O capitalismo, em seu propósito de sempre obter lucros, de crescer para acumular riqueza, vai justificar tudo, inclusive o apoio ao discurso de que não cabemos todos no mundo e que não podemos construir um mundo onde todo mundo caiba.

 

Eis a entrevista.

 

Vivemos hoje, em várias partes do mundo, um ataque à própria ideia de direitos humanos, vindo de várias esferas. No caso do Brasil, vem da própria esfera governamental, onde temos um presidente da República que encarna toda essa carga de preconceito, intolerância e recusa da própria ideia de direitos humanos. Como você avalia esse fenômeno do incômodo que a ideia de direitos humanos traz para alguns setores da sociedade?

Curiosamente, é um fenômeno que acentua algo que já existe de forma latente. É uma espécie de demônio que temos dentro de nós e que, em determinadas épocas, surgem de uma forma forte, sem escrúpulos e explícita. Creio que é algo muito próprio da condição humana. A América Latina tem determinadas características onde estão presentes o ódio e a fobia ao outro e, por meio dessa fobia emocional, estabelecer sistemas de domínio e controle. Qualquer limite ou obstáculo que diminua ou enfrente essa fobia acaba sendo demonizado e criminalizado, provocando uma situação de exclusão mais explícita do que aquela que o sistema que vivemos já estrutura.

 

 

Não sei se você assistiu os filmes da série The Avengers (Os Vingadores), há um personagem que se chama Thanos. Thanos é uma figura que tenta eliminar a metade da população de uma civilização para que a outra viva ou sobreviva. Essa lógica, aplicada ao planeta Terra, é uma forma explícita de dizer que não cabemos todos e que não podemos construir um mundo onde todo mundo caiba. Só podem morar aqui uns poucos e é preciso uma ideologia ou várias ideologias e justificações que legitimem essa forma cínica de ser e dizer que nem todos cabemos neste mundo. Esses populismos de extrema-direita que estão se espalhando por todo o planeta, inclusive na Europa, em países como Hungria, Polônia, Itália, França e Espanha, fundamentam essa forma cínica de dizer que há gente que está dentro e há gente que precisa ficar fora. Usa-se um elemento emocional para isso, apelando às tradições, ao sentido de pátria e nação, dizendo que ‘nós somos patriotas e todos os que não estão dentro da nossa forma de entender a pátria são inimigos, não só de nós, mas de toda a humanidade’.

 

 

Esses são dispositivos que acentuam as deficiências e falências que o próprio sistema não tem sabido enfrentar. Os elementos emocionais e sentimentais desses populismos estão se normalizando e se naturalizando, lamentavelmente, em uma grande porcentagem da população. Quando eu viajo ao Equador ou ao México, pelo que conheço do Brasil e pelo que ocorre na Espanha, vejo que cada vez mais o maniqueísmo e a confrontação entre uns e outros se incrementa. Assim, a ideia que a prática de direitos humanos deveria transmitir se perde e é criminalizada, porque não interessa a concepção de que há uma forma de construir um mundo onde caibamos todos. Aí entram não só os discursos nacionalistas, mas também a xenofobia, a homofobia e o racismo, entre outras coisas.

 

Aqui no Brasil, e essa parece ser uma realidade comum a outros países também, essa agenda encarnada pelo governo Bolsonaro é objetivamente apoiada por setores econômicos importantes como o agronegócio, o sistema financeiro e a grande indústria. Considerando esse fato, é possível afirmar, na tua opinião, que esse ataque à ideia dos direitos humanos está ligado ao atual estágio do capitalismo em nível internacional?

Acho que esse populismo de extrema-direita, junto com o pensamento conservador que predomina em nível global, são parceiros do sistema capitalista. Nunca esqueço da expressão de um filósofo alemão que mora na Costa Rica, chamado Franz Hinkelammert, que expressa um pouco o que você pergunta. O poder e, particularmente, o poder do capital em sua forma neoliberal faz duas coisas muito bem: mentir e dar boas razões para matar. O capitalismo, em seu propósito de sempre obter lucros, de crescer para acumular riqueza, vai justificar tudo. Neste estado de competitividade, eles podem até brigar entre si, mas se o propósito é ter domínio, acumular e gerar desigualdade para que o status de riqueza seja consolidado, vão apoiar todo aquele que não questione esse projeto de acumulação de riqueza.

Os populismos participam disso. Creio que em todos os exemplos que encontramos na Europa, nos Estados Unidos e na América Latina, aparentemente eles são protecionistas, mas, na verdade, como você falou, sempre estão a favor dos interesses do sistema financeiro, do agronegócio, da indústria farmacêutica…Esse é um problema endêmico no contexto atual. Zygmunt Bauman disse que, se despolitizamos o campo do político, seja por meio de tecnocracias ou de líderes populistas que monopolizam o exercício do poder, a capacidade popular de reagir é minimalista. E onde se permite reagir nunca se questiona esse mundo fantasmagórico que é o mundo financeiro. Ninguém quer atacar esse mundo. Brigamos entre nós, os políticos têm cada vez menos capacidade de ter algum controle sobre o mundo da economia e do mercado. Se não se ataca essa realidade do mundo financeiro, que é o que, de fato, institui nossos projetos de vida e nosso cotidiano, isso vai seguir assim sempre.

Por isso, insisto um pouco na metáfora dos jogos utilizada por Erik Olin Wright. O capitalismo impôs o seu jogo. Temos que jogar dentro das normas do capitalismo, onde as margens de negociação ou de criar regras diferentes de jogo são mínimas. Se, estrategicamente, não transformamos as normas dentro do capitalismo e incorporamos jogos diferentes, os donos do capital seguirão com sua lógica onde vale tudo para manter o seu jogo, inclusive eliminar a democracia. Se não tiverem medo de que haja alguma alternativa ou grupos coletivos que ameacem o sistema, tudo vale. E no momento em que aparecer algum movimento, alguma situação de possível transformação, se não tiverem medo, vão continuar a gerar cinicamente essa polithanos ou thanopolítica de incrementar a desigualdade, concentrar a riqueza e onde a população que fique fora disso seja eliminada.

 

 

Há um outro fenômeno associado à criminalização dos direitos humanos, que pode parecer paradoxal, que consiste na tentativa de apropriação, pela extrema-direita, da ideia de direitos humanos por meio da formulação de expressões como “humanos direitos”, direitos só para os “homens de bem”, etc. Como você avalia essa tentativa de apropriação?

Muitas vezes brincam comigo que eu me sinto muito mais latinoamericano do que europeu. Em meu trabalho, eu defendo a ideia de que os pensadores e pesquisadores latinoamericanos foquem mais em seus próprios autores e autoras do que em autores dos Estados Unidos ou da Europa que é o que as universidades normalmente fazem em nível institucional. O modelo tem que ser europeu, estadunidense, etc. O que eu aprendi, de uma perspectiva crítica dos direitos humanos, é o que Gallardo e Franz Hinkelammert denominam, cada um da sua forma, de processo de inversão ideológica ou reversão ideológica dos direitos humanos. Como utilizam estratégias, supostamente para garantir direitos humanos, vulnerabilizando esses direitos.

 

 

Essas inversões se expressam de diferentes maneiras. Em nível geopolítico, o que fazem Europa e Estados Unidos em relação ao mundo não-ocidental. A extrema-direita faz isso e a esquerda, às vezes, também o faz, ao fetichizar e idealizar um modelo de humano para demonizar e criminalizar o que não está dentro desse modelo. O que a extrema-direita faz agora é investir nesta lógica do amigo-inimigo, ganhador-perdedor, superior-inferior, para definir quem faz parte da esfera do humano e eliminar quem não faz parte desta dimensão ganhadora e eticamente superior. Sempre que ocorreu uma inversão ideológica dos direitos humanos, há criminalização e demonização do outro para dar boas razões para matá-lo. Neste caso, é fácil, emocional e sentimentalmente, justificar a eliminação de quem é o inimigo, de quem representa o mal, o pecado, essa dimensão demoníaca da condição humana.

Creio que Bolsonaro faz isso, não só com os direitos humanos, mas também por meio da ideia de pátria, de quem é brasileiro e quem não é, acusando os demais de serem marxistas, comunistas ou bolivarianos, obviamente sem nunca ter lido ou conhecido nenhum livro de Marx ou de alguma autora feminista. Curiosamente, os populismos de extrema-direita são crentes, supostamente baseados em ideais de espiritualidade religiosa cristã mais ou menos conservadores. A contradição é como interpretam a ideia do amor ao próximo. Quem é o próximo? E o mandamento ‘Não matarás’, como o interpretam? Como dão boas razões para não amar ou para matar quem não é o próximo? O humano é modulado em função dos meus interesses e o próximo também é modulado em função do que me interessa.

Os que promovem a inversão ideológica dos direitos humanos esquecem que reconhecer ao outro como sujeito implica um dever e um direito, o direito de que todos sejamos reconhecidos como sujeito sem exceções, e o dever de tratar o outro como sujeito também sem exceções. Tenho direito a ser sujeito e o dever de reconhecer o outro como sujeito. Essa é a forma coerente de entender a ideia do amor ao próximo e o imperativo categórico expresso em ‘Não matarás!’. Historicamente, sempre se deram boas razões para matar. Justificou-se matar supostamente para defender a condição humana.

 

Estamos vivendo aqui no Brasil uma das maiores mobilizações dos povos indígenas da história (se não for a maior) em defesa de seus direitos, contra a tese do marco temporal, que está sendo avaliada no Supremo Tribunal Federal. Entidades que representam povos indígenas são autoras de mais de uma denúncia contra o presidente Jair Bolsonaro, junto ao Tribunal Penal Internacional, acusando-o da prática de genocídio, de destruição da Amazônia e de crimes contra a humanidade. Na sua avaliação, é possível tipificar o está ocorrendo no Brasil como genocídio?

É uma luta histórica dos povos indígenas que expressa essa bipolaridade ocidental de reconhecer direitos quando interessa, dependendo de quando e quem, e não reconhecer quando lhe interessa, dependendo também quando e quem. É a colonialidade do poder, apontada por muitos autores. Historicamente, os povos indígenas mostram aquilo que observei antes, que existem outros jogos distintos ao capitalismo. Tentar estabelecer projetos de vida com uma lógica e uma dinâmica distintas das do capitalismo é visto como uma ameaça. Muitas políticas indigenistas na América Latina, incluindo o Brasil durante algum período, tentaram convertê-los em ‘nós’ para que se tornassem mais parecidos com a nossa ideia de cidadania. No modelo de vida dos ocidentais – e no caso dos ocidentais da América Latina, com uma tradição criolla muito forte – o progresso e a ideia de crescimento é que estabelecem a modernidade capitalista. Aqueles que não fazem parte desse projeto de vida são bárbaros e inferiores.

Ao longo da nossa história, produziram-se sistemáticos genocídios e epistemicídios, considerando o que implica um genocídio quanto à eliminação de culturas, saberes e outras epistemologias. Bolsonaro repete essa forma colonial que não é só de Bolsonaro, mas é próprio do sistema capitalista que o apóia e o consolida. Para eles, interessa que os povos indígenas sumam, desapareçam de seus territórios porque assim a indústria extrativista, a indústria farmacêutica e a agroindústria estarão totalmente liberadas para extrair e roubar matéria prima, sem os obstáculos que os povos indígenas estabelecem.

 

 

Costumo dizer em minhas aulas que, em termos ecológicos, se formos adotar uma lógica empresarial, levando em conta os critérios da produtividade e da eficácia, os povos indígenas têm muito mais capacidade de respeitar o meio ambiente do que qualquer Estado, empresa ou qualquer instituição que queiramos inventar para justificar que eles não sejam titulares e administradores de seus territórios, com tudo o que isso implica.

Aqui em Sevilha, há uma catedral preciosa que está construída em cima de uma mesquita árabe. Caso se descobrisse uma jazida de lítio ou petróleo em seu subsolo a catedral continuaria sendo respeitada, pois a cidadania se revoltaria se não fosse. Pois as terras indígenas têm territórios, sejam morros ou áreas de mata, que são sagrados e tem um estatuto equivalente ao da catedral. Agora, o que acontece se se encontra uma jazida de petróleo ou lítio em uma terra indígena? Sem dúvida, esse morro seria destruído e desapareceria. Essa forma justificadora de extermínio, essa cultura colonizadora, como uma nuvem de gafanhotos, vai arrasar com tudo. Bolsonaro é representante desses grupos que, dentro de uma lógica imediatista de curto prazo, justificam o apoio a ele, dizendo que beneficia o desenvolvimento do país, etc.

É uma espécie de lógica de vampiro. Se alguém me suga todo o sangue, no final ficarei sem sangue. Se necessito permanentemente de sangue também preciso de corpos que vão me fornecer sangue para seguir vivo. É preciso ter um coletivo que garanta esse fornecimento de sangue. Daí vem os genocídios e os epistemicídios. É um processo perverso que acho que é evidente.

 

Ainda em relação ao tema do genocídio, gostaria de saber o que pensa da atuação do Tribunal Penal Internacional, uma criação relativamente recente, segundo uma ideia de se ter uma instância de justiça internacional capaz de julgar crimes contra a humanidade. Na sua opinião, em que medida esse Tribunal vem cumprindo esse papel?

Aí aparece o meu ponto de diferença no modo de entender os direitos humanos. Nosso imaginário e nossa cultura jurídica ressalta sempre as figuras do tribunal constitucional, do tribunal superior de justiça, do tribunal penal, da comissão de direitos humanos e todas as demais instituições internacionais que fazem parte do direito internacional e dos direitos humanos. Eu sempre digo: atenção, essas instituições são importantes, mas são insuficientes. Têm força simbólica, com certeza, mas se nosso imaginário sobre como garantir direitos humanos se reduz ao que a Corte Penal Internacional sentencie vamos continuar mal. Precisamos refletir sobre quantas sentenças favoráveis e efetivas são proferidas todos os dias no Brasil, por exemplo, reconhecendo os direitos humanos. E comparar isso com quantas violações de direitos ocorrem diariamente em um país como o Brasil, a Colômbia ou outro país do mundo.

O imaginário sensível aos direitos humanos não pode ser minimalista. Precisamos ampliar esse imaginário e ampliar também a forma de praticar direitos humanos. As dimensões normativa e institucional são muito importantes, mas precisam ter uma base relacional de convivência social. Precisamos implementar políticas com educação, sensibilizarmos uns aos outros em nossos espaços cotidianos. Não precisamos da intervenção do Estado para, entre nós, nos reconhecermos como sujeitos de direitos. Se eu respeito e reconheço o outro em sua diferença, no âmbito familiar, no âmbito sexual, nas redes sociais, na comunidade e na política avançaremos muito na implementação de mecanismos que chamo de pré-violatórios. Normalmente, parece que lidamos muito mais com mecanismos pós-violatórios, depois que já aconteceu a violação. Podemos fazer muitas coisas previamente para reconhecer o outro em sua dignidade e estabelecer um sistema multi-garantista de direitos. O estatal precisa complementar-se com o não estatal, com o social. E não só isso. Você falava dos povos indígenas. Eu defendo, como muitos parceiros, o pluralismo jurídico. Existem coletivos, grupos humanos, que têm sistemas de garantias não estatais, que são também jurídicos, que devem ser complementares aos sistemas de garantia do Estado. Que não seja só o aparato do Estado o único responsável e único legitimado para dizer quais são os nossos direitos e quando se garantem. Precisamos, além do Estado, ter uma sociedade forte, sensível e com cultura de direitos humanos que só delegue esse tema ao Estado quando for necessário.

 

Quando ocorreu a primeira edição do Fórum Social Mundial em Porto Alegre, lá em 2001, o economista português Francisco Louçã, em uma mesa de debates, disse que não seria fácil derrotar o neoliberalismo, pois o imaginário desse sistema era constituído por ideias fortes junto ao senso comum e que para enfrentá-lo a esquerda precisaria de ideias igualmente fortes. Considerando o cenário de violação de direitos que vivemos hoje, que ideia forte você apontaria como fundamental para enfrentar essa realidade?

Às vezes temos a tendência de procurar uma solução única para problemas que são muito complexos. Eu vejo o capitalismo como um sistema multifacetado, como uma espécie de monstro com múltiplas cabeças e é preciso enfrentá-las todas. Se atacamos apenas uma delas, o capitalismo acaba te fagocitando. Eu penso em várias ideias fortes, mas se tiver que falar em uma delas gostaria de citar um termo da Revolução Francesa, que também tinha suas deficiências. Não reconhecia a independência do Haiti nem os direitos das mulheres, por exemplo. Quando se fala da Revolução Francesa sempre se reivindica a liberdade e a igualdade. A fraternidade foi invisibilizada ou diminuída.

Eu acho fundamental gerar formas de sociabilidade, de relacionamento e convivência em toda as esferas, promovendo o que é comum entre nós, onde a horizontalidade, o respeito mútuo, a reciprocidade, a solidariedade e a fraternidade sejam a base para brigar com a lógica do capitalismo e não mercantilizar determinadas parcelas da realidade. O mercado é importante mas o mercado capitalista não é o único que existe. Existem muitas formas de entender o mercado. O comum ou a fraternidade, sem mercantilizar bens essenciais para que todo mundo tenha garantida uma existência digna, é algo importantíssimo para confrontar esse monstro de muitas cabeças.

Não me parece factível, nem possível, que exista uma alternativa única ao capitalismo, como antigamente se pensava com o socialismo ou o comunismo. É preciso ter múltiplas propostas e alternativas que, a partir dessa pluralidade e diferença, possam expressar distintos projetos de vida, articulando-se, respeitando-se e complementando-se entre si, tendo como base as ideias do comum e da fraternidade. O capitalismo é sedutor e faz isso muito bem. Se não tivermos capacidade de reagir a essa sedução, seguiremos sendo consumidores e submissos. Para isso, uma das tarefas fundamentais é enfrentar o sistema financeiro, os especuladores e investidores, que agem como jogadores de pôquer, segundo uma lógica de cassino, e se apresentam como salvadores da realidade quando é exatamente o contrário.

 

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