10 Mai 2025
"Ao analisar a abertura teremos pistas para prever quais serão as linhas mestras do pontificado que ora se inicia. Parto de quatro sinais dados ontem para interpretar como o novo Papa antevê seu ministério à frente da Igreja Católica Romana."
O artigo é de Pedro A. Ribeiro de Oliveira, doutor em Sociologia, Professor aposentado dos PPGCR da UFJF e PUC-Minas.
Pedro A. Ribeiro de Oliveira (Foto: Tiago Miotto | Cimi)
Como muita gente, acompanhei pela TV a apresentação do novo papa movido pelo desejo de encontrar sinais de ser ele um continuador da linha de Francisco. Terminada a cerimônia, me pus a refletir sobre os indicadores que ela trouxe sobre as linhas mestras do atual pontificado. Este texto é uma tentativa de alinhar ideias para esclarecer meu próprio pensamento.
O ritual espetacular de apresentação do novo papa pode ser comparado à música de abertura que precede grandes óperas: em alguns minutos a orquestra apresenta os principais temas que serão desenvolvidos ao longo da ópera pelo canto e pela orquestra. Indicador disso é que o discurso foi lido, e não improvisado como fizeram seus antecessores. Se vale esse paralelismo, ao analisar a abertura teremos pistas para prever quais serão as linhas mestras do pontificado que ora se inicia. Parto de quatro sinais dados ontem para interpretar como o novo Papa antevê seu ministério à frente da Igreja Católica Romana.
1. O nome já diz muito. Leão XIV evoca para um leigo católico – como eu – a figura de Leão XIII e a inauguração da Doutrina Social da Igreja. Embora defeituosa na análise do capitalismo, pela primeira vez na época moderna a Igreja institucional assumia a “questão social” como digna de sua atenção em vez de condenar como “socialista” quem assumia as causas das classes trabalhadoras. Se Leão XIV seguir essa mesma inspiração, vai incentivar a Igreja Católica a avançar nas linhas assumidas por Francisco: Grito da Terra, grito dos Pobres; Terra, Teto e Trabalho; Solidariedade e Amizade Social, e outros temas que coincidem com os objetivos dos Movimentos Sociais.
2. As vestes solenes também dizem muito, especialmente após o exemplo de Francisco que as recusou (dizendo que o carnaval já havia passado). Leão XIV parecia sucessor direto de Bento XVI. Pensei logo na distinção de M. Weber entre instituição e carisma como legitimação da autoridade. Ao optar pelas vestes solenes, Leão XIV aponta que vai governar a Igreja com o poder que a instituição lhe confere, e não com o carisma profético – pessoal e intransferível – de Francisco. Se interpreto corretamente esse sinal, temos um Papa da institucionalidade eclesial para substituir um Papa profético. Isso pode consolidar os avanços feitos até agora, mas renuncia-se a seguir em frente.
3. A primeira frase foi “A paz esteja com todos vocês”. No atual contexto de guerra, iniciar um mandato com uma mensagem de paz, e acrescentar que é uma paz “desarmada e desarmante” quando a Europa faz opção pelo armamentismo, é um sinal auspicioso. Leão XIV não desempenhará o papel de “sacristão do Ocidente”, como disse certa vez Francisco. Com efeito, pelo que se sabe, o atual Papa é um homem de coragem, capaz de enfrentar poderosos em favor da Paz.
4. Ao falar em espanhol para saudar o povo a quem serviu como missionário e bispo, mas não ter falado em inglês – sua língua materna – o Papa sinalizou que sua identidade nacional importa menos do que sua identidade eclesial. É um sinal auspicioso, se interpretado como desapego aos particularismos nacionais, mas fico pensando que talvez seja mais apego à Igreja como instituição à qual dedica sua vida do que ao Povo cujas necessidades religiosas atendeu.
Outras coisas foram ditas, mas não tiveram destaque na fala a ponto de indicarem uma linha pastoral. Referiu-se, por exemplo, à sinodalidade, mas desde Paulo VI realizam-se sínodos em Roma. Por considerar que esses outros temas eram somente acenos a tópicos que não poderiam ser esquecidos para compor o todo, não dei a eles a importância dos quatro sinais acima.