09 Mai 2025
"Quem esteve ao lado dos pobres em um mundo cada vez mais desigual? Quem defendeu os fracos enquanto o mundo ia se debandando para o lado da lei do mais forte? O novo Papa deveria, portanto, ter sucesso onde Trump, von der Leyen, Milei, Meloni e Macron falham todos os dias?", escreve Nicola Lagioia, escritor italiano, em artigo publicado por La Stampa, 08-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
O conclave no qual o Papa Francisco foi eleito tinha como tarefa a salvação da Igreja. Ao conclave que começou ontem pedimos para salvar o mundo.
Bento XVI anunciou sua intenção de renunciar em fevereiro de 2013. Na época, Barack Obama era o presidente dos Estados Unidos. Menos de sete meses antes, Mario Draghi havia proferido seu “Whatever it takes” na Global Investment Conference de Londres. A propósito, a Grã-Bretanha fazia parte da UE. O mundo globalizado parecia estar se mantendo unido, embora em meio a contradições, opacidades e atrocidades não remotas (a invasão do Iraque, para dar um exemplo). Aparentemente, as duas grandes áreas de influência ocidental (o império estadunidense e a potência “herbívora” europeia) estavam se saindo melhor do que a Igreja Católica, que estava sacudida por escândalos, venenos e rivalidades de todos os tipos. Quem quer que saísse do conclave como papa teria a tarefa de salvar o que alguns consideravam impossível de consertar. Bergoglio era aquele homem.
Em doze anos, o plano se inverteu. A Igreja hoje é decididamente mais sólida (e global) do que na época. O mundo secular, por outro lado, está em chamas, fora de controle, estreitado nos nacionalismos, inchado de ódio e violência, com a parte ocidental afundando no abismo de uma espantosa crise política e identitária.
Os Estados Unidos estão cada vez mais parecidos com o pesadelo de Philip Roth em Complô Contra a América.
A Europa parece uma paródia da Kakânia (que por sua vez é paródia do Império Austro-Húngaro) do Musil de O Homem Sem Qualidades, um continente ao mesmo tempo culto e frívolo, bizantino e hamletiano, uma pequena orquestra envaidecida tocando enquanto o barco se dirige diretamente para o iceberg.
Que, naquele caso, foi a Primeira Guerra Mundial.
Enquanto o mundo se tornou um lugar cada vez mais angustiante nestes últimos 12 anos, a Igreja de Francisco deu a impressão de mudar apesar das cada vez mais frágeis chancelarias (ou o cada vez mais monstruoso Salão Oval) dos estados-nação ou das pseudouniões em reiterar o que deveria ser óbvio tanto para o Evangelho quanto para a ONU.
Quem continuou a falar sobre sustentabilidade (Laudato si' é uma encíclica que entrará para a história) enquanto a crise climática estava saindo das agendas políticas dos países que mais alimentavam esse desastre? Quem falou de Gaza enquanto os Estados Unidos se banqueteavam com o massacre e a Europa gaguejava envergonhada (cada época política tem sua própria mitologia fantástica, passamos dos “trinariciuti” de Guareschi a uma primeira-ministra deusa Kalì que, com uma mão, deposita uma flor no túmulo de Francisco, com a outra segura a pantufa de Trump, com uma terceira envia saudações afetuosas a Netanyahu, com uma quarta anda de braços dados com Milei, que a respeito do Papa havia falado mais do que é suficiente para que, na Itália, acabasse detido) ou por incapacidade de se livrar de seus próprios sentimentos de culpa históricos (a Alemanha)?
Quem esteve ao lado dos pobres em um mundo cada vez mais desigual? Quem defendeu os fracos enquanto o mundo ia se debandando para o lado da lei do mais forte?
O novo Papa deveria, portanto, ter sucesso onde Trump, von der Leyen, Milei, Meloni e Macron falham todos os dias?
O problema é que a tarefa da Igreja não é salvar o planeta das guerras e das crises econômicas, do colapso climático e das ditaduras. A Igreja desempenha um papel eminentemente religioso. Se é importante no plano político, deve ser uma consequência fortuita. Sobre isso, convido a ler o belíssimo livro de Javier Cercas, publicado recentemente pela Guanda, Il folle di Dio alla fine del mondo, em que o escritor espanhol conta sobre uma viagem à Mongólia acompanhando o Papa em 2023.
Desastroso um mundo que precisa de um Papa para sair do abismo! Mas essa é a situação paradoxal e até grotesca em que nos encontramos.
Quem preencherá o vazio dentro de nós?