07 Mai 2025
O que o governo defende abertamente é uma ocupação permanente que busca erradicar não apenas o Hamas e a Jihad Islâmica, mas toda a população civil.
O artigo é de Jesús A. Núñez, professor de Relações Internacionais na Pontifícia Universidade de Comillas, de membro do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos e do Comitê Espanhol da UNRWA, em artigo publicado por El Diario, 06-05-2025.
Não há uma única decisão de Benjamin Netanyahu em relação aos palestinos que seja orientada para a paz ou que possa ser descrita como humanitária. E caso houvesse alguma dúvida sobre isso, há o recente anúncio de um novo plano para entregar alguns meios de subsistência acompanhado de informações sobre uma nova ofensiva militar em Gaza.
A ação humanitária rege-se pelos princípios da Humanidade – proporcionar um tratamento que respeite a dignidade de cada ser humano e procurar aliviar o seu sofrimento – Imparcialidade – abstenção de qualquer ato que possa ser interpretado como favorável a um dos intervenientes num conflito – Neutralidade – atendimento às vítimas de acordo com as suas necessidades, independentemente de qualquer consideração étnica, religiosos, ideológicos – e Independência – garantindo que os atores humanitários possam realizar seu trabalho sem restrições políticas de atores externos. Esses não são caprichos de atores humanitários, mas princípios consagrados no Direito Internacional Humanitário e endossados por várias resoluções da ONU.
Para qualquer observador interessado no que está acontecendo na Palestina histórica, é imediatamente concluir que Israel está dando as costas a esses princípios quando se trata da população palestina ocupada. Em primeiro lugar, porque desde 1967 não cumpre as suas obrigações como potência ocupante, tanto no domínio do bem-estar como da segurança. E no que se vive desde 7 de outubro de 2023, porque o primeiro-ministro israelense, aplaudido pelos Ben Gvir e Smotrich da época – ministros de extrema-direita – lidera indisfarçavelmente uma barbárie de pleno direito que inclui o assassinato indiscriminado de civis, punição coletiva, o uso da fome como arma de guerra, o corte do fornecimento de eletricidade, o assassinato de trabalhadores humanitários e, por mais de dois meses, a proibição da entrada de todos os bens (incluindo água e remédios) na Faixa de Gaza.
É por isso que soa sarcástico que Netanyahu agora pretenda ser sensível ao sofrimento dos habitantes de Gaza e anuncie um suposto plano de ajuda humanitária para execução imediata. Um plano que prevê a entrada de 60 caminhões por dia (quando antes do início do massacre a média diária era de 600, sem mesmo assim cobrir todas as necessidades dos 2,3 milhões de habitantes da Faixa), previamente inspecionado por Israel (o que significa que só entrará o que seus governantes decidirem, sem levar em consideração as necessidades identificadas pela população local).
Além disso, a gestão desses carregamentos é deixada nas mãos do exército e de agentes privados externos selecionados por Israel, o que indica que não haverá coordenação com as autoridades locais e que o que finalmente chegar será distribuído entre aqueles que Tel Aviv escolher unilateralmente como beneficiários. Não é de estranhar que, nestas condições, enquanto milhares de camiões de mercadorias se amontoam nas entradas de Gaza sem qualquer possibilidade de prestar ajuda, tanto as organizações não governamentais como as agências internacionais presentes no terreno tenham rejeitado o convite do Governo israelita para colaborar naquilo que não satisfaz, de modo algum, os critérios básicos da ação humanitária.
Ao mesmo tempo, o gabinete ministerial também aprovou (por unanimidade) um novo plano de operações em Gaza que esgota a possibilidade de recuperar as 59 pessoas que o Hamas mantém detidas (das quais se estima que 24 ainda possam estar vivas), retira qualquer possibilidade de acordo com as milícias palestinas e deixa a paz como uma opção cada vez mais improvável.
Na realidade, mais do que uma nova ofensiva, é uma reiteração de esforços que busca esmagar definitivamente a resistência armada palestina; tentando esconder que essa mesma decisão significa que todos os planos de combate propostos para o mesmo propósito falharam até agora. Em vez de se limitar a incursões pontuais e fragmentar o território (neste momento, cerca de 70% da Faixa já está sob controle militar direto das Forças de Defesa de Israel), o que esse plano defende abertamente é uma ocupação permanente que busca erradicar não apenas o Hamas e a Jihad Islâmica Palestina, mas para a população civil como um todo.
A convocação de dezenas de reservistas é o mais recente sinal de que o plano está prestes a ser colocado em ação, e só podemos especular que seu início será adiado até que Donald Trump retorne de sua turnê pela Arábia Saudita, Catar e Emirados Árabes Unidos em meados de maio. Em todo o caso, enquanto as violações israelitas do acordo alcançado com o Hamas a 15 de janeiro continuam ininterruptamente e se acumulam inúmeras violações do direito internacional, o que infelizmente pode ser dado como certo é que, com ou sem este plano, as FDI continuarão a massacrar os habitantes de Gaza face à passividade generalizada da comunidade internacional. Tudo isso sem esquecer as que realizam na Cisjordânia, no Líbano e na Síria.