19 Setembro 2023
O ex-jesuíta é acusado de abusos contra pelo menos vinte mulheres, mas a visita canônica ao centro que fundou vai na direção oposta: "No Centro Aletti existe uma vida comunitária saudável, sem quaisquer questões críticas particulares". Uma reviravolta que poderia ser dirigida pelo Papa.
A reportagem é publicada por Domani, 18-09-2023.
"Resulta claramente que dentro do Centro Aletti existe uma vida comunitária saudável, sem quaisquer questões críticas particulares": isto, em resumo, é o resultado da visita canônica ordenada pelo cardeal vigário de Roma, Dom Angelo De Donatis, ao Centro fundado e há muito dirigido por Marko Rupnik, o ex-jesuíta acusado de ter abusado de pelo menos vinte mulheres.
Não apenas isso: o cardeal vigário questiona uma sentença do Dicastério para a Doutrina da Fé (anteriormente Congregação) quando declara que "o Visitador pôde identificar e, portanto, relatou procedimentos gravemente anômalos, cuja análise gerou sérias dúvidas até mesmo sobre o próprio pedido de excomunhão".
Trata-se da excomunhão em que Rupnik incorreu por ter absolvido em confissão uma mulher com quem teve relações sexuais e que lhe foi remetida poucos dias depois, provavelmente pelo próprio Papa. Ora, o fato de o vigário geral declarar hoje que “apresentou o relatório às autoridades competentes” devido à gravidade das conclusões sobre o “pedido de excomunhão” parece evidenciar um confronto clandestino no Vaticano em nome de Rupnik.
A investigação
A visita canônica, iniciada em 16 de janeiro, procurou investigar a dinâmica interna da equipe do Centro Aletti, associação pública de fiéis desde junho de 2019, e em particular, as relações entre o atual grupo de gestão e Rupnik. O relatório final do visitador responsável, padre Giacomo Incitti, professor de direito canônico na Pontifícia Universidade de Urbana, é claro: não há nada que se oponha ao que está acontecendo na Via Paolina.
Com efeito, o grupo saiu fortalecido: "a história", na opinião de Incitti, "ajudou as pessoas que vivem a experiência do Centro Aletti a fortalecer a confiança no Senhor, na consciência de que o dom da vida de Deus também abre espaço através da provação".
Os membros do Centro Aletti, apurou o visitador, "embora entristecidos pelas acusações recebidas e pela forma como foram tratadas, optaram por manter o silêncio – apesar da veemência da mídia – para guardar o coração e não reivindicar alguma irrepreensibilidade com o objetivo de se colocar como juiz dos outros".
Sem problemas
Não há problema, então. Nada a dizer sobre o fato de a diretora Maria Campatelli estar na primeira fila no passado dia 5 de março, juntamente com o resto da equipe e o grupo de jesuítas (que agora abandonam a Companhia após a expulsão de Rupnik, ratificada no passado dia 14 de julho), quando Rupnik concelebrou na Basílica de Santa Prassede, em Roma, violando a proibição dos seus superiores de exercer atividades ministeriais e sacramentais em público.
Nada a dizer, nem sequer sobre os exercícios espirituais que Rupnik deveria ter realizado para o Centro Aletti, violando as restrições impostas pela Companhia de Jesus e, sobretudo, nada a assinalar sobre os abusos que o sacerdote e artista também cometeu nas instalações do Centro Aletti, em Roma, aproveitando-se do seu papel, pois mais de uma vítima testemunhou à Companhia de Jesus durante a investigação lançada em fevereiro passado.
Resumindo, está tudo normal. Algumas alterações no Estatuto foram necessárias, dada a saída da equipe jesuíta do Centro, mas, fora esses ajustes técnicos, os propósitos fundadores permanecem intactos.
A direção do Papa
Resta saber o que acontecerá agora que o cardeal De Donatis lançou a bomba sobre a excomunhão, imposta a Rupnik em 2020 com uma sentença assinada pelo cardeal Luis Ladaria Ferrer, na época prefeito da Congregação (atualmente, Dicastério) para a Doutrina da Fé.
Sem a subsequente revogação, questionar as condições da excomunhão parece ser um claro ato de desafio ao citado dicastério, com um único objetivo: a reabilitar Rupnik, em desprezo pela Companhia de Jesus que decidiu a sua expulsão e aos bispos eslovenos que condenaram os abusos, sem mencionar as vítimas.
Não só isso: é difícil acreditar que por trás do ataque pesado de De Donatis não esteja a aprovação, se não mesmo a direção, do Papa. Além disso, o próprio Francisco, há apenas três meses, ilustrou um mosaico de Rupnik presente em Santa Marta durante uma mensagem a um congresso mariológico brasileiro, um sinal inequívoco de apoio ao polêmico irmão.
Há três dias, a diretora do Centro Aletti, Maria Campatelli, que nunca escondeu estar totalmente ao lado de Rupnik, mesmo através de cartas públicas em que o ex-padre era retratado como vítima da imprensa e dos jesuítas, foi recebida pelo Papa em conversa privada. Hoje, à luz do resultado da visita canônica, não é difícil imaginar que no centro do encontro no Vaticano houve um apoio cordial às atividades do Centro, que poderá, portanto, continuar os proveitosos trabalhos de Rupnik com a bênção de Francisco.
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Abusos na Igreja. Diocese de Roma reabilita Rupnik e levanta dúvidas sobre sua excomunhão - Instituto Humanitas Unisinos - IHU