17 Mai 2025
Na sexta-feira, 16 de maio, na Sala Clementina do Palácio Apostólico Vaticano, o Papa Leão XIV recebeu em audiência os membros do corpo diplomático acreditado junto à Santa Sé, por ocasião do início de seu ministério petrino. Após as palavras introdutórias do Decano do Corpo Diplomático, Sr. Georges Poulides, o Papa proferiu o discurso que estamos reproduzindo.
O discurso é de Papa Leão XIV, publicado por Settimana News, 16-05-2025.
Eminência, Excelências, Senhoras e Senhores , a paz esteja convosco!
Agradeço ao Senhor George Poulides, Embaixador da República de Chipre e Decano do Corpo Diplomático, as cordiais palavras que me dirigiu em nome de todos vós e o seu trabalho incansável, que desempenha com o vigor, a paixão e a simpatia que o distinguem, qualidades que lhe granjearam a estima de todos os meus Predecessores encontrados nestes anos de missão junto da Santa Sé e, em particular, do saudoso Papa Francisco.
Gostaria também de expressar a minha gratidão pelas numerosas mensagens de bons votos que se seguiram à minha eleição, bem como pelas de condolências pelo falecimento do Papa Francisco, que as precederam e que chegaram também de países com os quais a Santa Sé não mantém relações diplomáticas. Este é um sinal significativo de apreço, que incentiva o aprofundamento de relacionamentos mútuos.
No nosso diálogo, gostaria que prevalecesse sempre o sentido de família – a comunidade diplomática representa, de fato, toda a família dos povos –, partilhando as alegrias e as tristezas da vida e os valores humanos e espirituais que a animam. A diplomacia papal é, de fato, uma expressão da própria catolicidade da Igreja e, em sua ação diplomática, a Santa Sé é animada por uma urgência pastoral que a impele não a buscar privilégios, mas a intensificar sua missão evangélica a serviço da humanidade. Ela combate toda indiferença e apela continuamente às consciências, como fez incansavelmente o meu venerado Predecessor, sempre atento ao clamor dos pobres, dos necessitados e dos marginalizados, bem como aos desafios que caracterizam o nosso tempo, desde a proteção da criação até à inteligência artificial.
Além de ser um sinal concreto da atenção dos vossos países à Sé Apostólica, a vossa presença hoje é para mim um dom, que me permite renovar a aspiração da Igreja — e a minha — de ir ao encontro e abraçar todos os povos e todas as pessoas desta terra, desejosas e necessitadas de verdade, justiça e paz! Em certo sentido, minha própria experiência de vida, desenvolvida entre a América do Norte, a América do Sul e a Europa, é representativa dessa aspiração de cruzar fronteiras para conhecer diferentes pessoas e culturas.
Através do trabalho constante e paciente da Secretaria de Estado, pretendo consolidar o conhecimento e o diálogo com vocês e seus países, muitos dos quais já tive a graça de visitar ao longo da minha vida, especialmente quando era Prior Geral dos Agostinianos. Confio que a Divina Providência me concederá novas oportunidades de conhecer as realidades de onde vocês vêm, permitindo-me acolher as oportunidades que se apresentarão para confirmar na fé tantos irmãos e irmãs espalhados pelo mundo e para construir novas pontes com todas as pessoas de boa vontade.
No nosso diálogo, gostaria que tivéssemos presentes três palavras-chave, que constituem os pilares da ação missionária da Igreja e da obra diplomática da Santa Sé.
A primeira palavra é paz. Muitas vezes a consideramos uma palavra "negativa", isto é, como a mera ausência de guerra e conflito, já que a oposição faz parte da natureza humana e sempre nos acompanha, muitas vezes nos levando a viver em um constante "estado de conflito": em casa, no trabalho, na sociedade. A paz então parece uma trégua simples, um momento de descanso entre uma disputa e outra, porque, não importa o quanto tentemos, as tensões estão sempre presentes, um pouco como as brasas ardendo sob as cinzas, prontas para reacender a qualquer momento.
Na perspectiva cristã – como na de outras experiências religiosas – a paz é antes de tudo um dom: o primeiro dom de Cristo: "Dou-vos a minha paz" (Jo 14, 27). No entanto, é um dom ativo e envolvente que interessa e envolve cada um de nós, independentemente de nossas origens culturais ou afiliações religiosas, e que requer, antes de tudo, um trabalho em nós mesmos. A paz se constrói no coração e começa pelo coração, erradicando o orgulho e as pretensões, e medindo a linguagem, pois com palavras também se pode ferir e matar, não só com armas.
Nessa perspectiva, acredito que a contribuição que as religiões e o diálogo inter-religioso podem dar para promover contextos de paz é fundamental. Isto requer, naturalmente, o pleno respeito pela liberdade religiosa em todos os países, uma vez que a experiência religiosa é uma dimensão fundamental da pessoa humana, sem a qual é difícil, senão impossível, alcançar aquela purificação do coração necessária para construir relações pacíficas.
A partir deste trabalho, que todos somos chamados a fazer, poderemos erradicar as premissas de todo conflito e de todo desejo destrutivo de conquista. Isso também requer um desejo sincero de diálogo, animado pelo desejo de encontro e não de conflito. Nessa perspectiva, é necessário dar novo fôlego à diplomacia multilateral e às instituições internacionais que foram desejadas e concebidas, antes de tudo, para solucionar disputas que pudessem surgir no seio da comunidade internacional.
É claro que deve haver também a vontade de deixar de produzir instrumentos de destruição e de morte, porque, como recordou o Papa Francisco na sua última Mensagem Urbi et Orbi, "nenhuma paz é possível sem um verdadeiro desarmamento [e] a necessidade que cada povo tem de prover à sua própria defesa não pode transformar-se numa corrida geral aos armamentos" [1].
A segunda palavra é justiça. Buscar a paz requer praticar a justiça. Como já tive ocasião de mencionar, escolhi o meu nome pensando antes de tudo em Leão XIII, o Papa da primeira grande encíclica social, Rerum novarum. Na mudança de época que estamos vivendo, a Santa Sé não pode deixar de fazer ouvir sua voz diante dos numerosos desequilíbrios e injustiças que levam, entre outras coisas, a condições de trabalho indignas e a sociedades cada vez mais fragmentadas e conflituosas. Também devemos trabalhar para remediar as disparidades globais, onde a opulência e a pobreza estão criando sulcos profundos entre continentes, países e até mesmo dentro de sociedades individuais.
É dever daqueles que têm responsabilidades no governo trabalhar para construir sociedades civis harmoniosas e pacíficas. Isto pode ser feito, antes de tudo, investindo na família, fundada na união estável entre um homem e uma mulher, "uma sociedade pequena, mas verdadeira, e anterior a qualquer sociedade civil" [2]. Além disso, ninguém pode deixar de promover contextos em que seja protegida a dignidade de cada pessoa, especialmente a mais frágil e indefesa, desde o nascituro ao idoso, desde o doente ao desempregado, seja cidadão ou imigrante.
Minha própria história é a de um cidadão, descendente de imigrantes, que por sua vez emigrou. Cada um de nós, no decorrer da nossa vida, pode encontrar-se são ou doente, empregado ou desempregado, na nossa pátria ou numa terra estrangeira: a nossa dignidade, porém, permanece sempre a mesma, a de uma criatura querida e amada por Deus.
A terceira palavra é verdade. Relações verdadeiramente pacíficas não podem ser construídas, mesmo dentro da comunidade internacional, sem a verdade. Onde as palavras assumem conotações ambíguas e ambivalentes e o mundo virtual, com sua percepção alterada da realidade, assume o controle descontroladamente, é difícil construir relacionamentos autênticos, pois faltam as premissas objetivas e reais da comunicação.
Por sua vez, a Igreja nunca pode deixar de dizer a verdade sobre o homem e o mundo, recorrendo quando necessário a uma linguagem franca, que pode dar origem a algum mal-entendido inicial. Contudo, a verdade nunca está separada da caridade, que em sua raiz sempre tem a preocupação pela vida e pelo bem de cada homem e mulher.
Além disso, na perspectiva cristã, a verdade não é a afirmação de princípios abstratos e desencarnados, mas o encontro com a própria pessoa de Cristo, que vive na comunidade dos crentes. Assim, a verdade não nos distancia, mas permite-nos enfrentar com maior vigor os desafios do nosso tempo, como a migração, o uso ético da inteligência artificial e a proteção da nossa amada Terra. São desafios que exigem o comprometimento e a colaboração de todos, pois ninguém pensa em enfrentá-los sozinho.
Caros Embaixadores,
Meu ministério começa no coração de um ano jubilar, dedicado de modo particular à esperança. É um tempo de conversão e de renovação e, sobretudo, uma oportunidade para deixar para trás as disputas e começar um novo caminho, animado pela esperança de poder construir, trabalhando juntos, cada um segundo a própria sensibilidade e responsabilidade, um mundo no qual cada um possa realizar a sua humanidade na verdade, na justiça e na paz. Espero que isso possa acontecer em todos os contextos, começando pelos mais testados, como a Ucrânia e a Terra Santa.
Agradeço-vos por todo o trabalho que fazeis para construir pontes entre os vossos países e a Santa Sé, e abençoo-vos de todo o coração, a vossas famílias e os vossos povos. Obrigado!
[1] Mensagem Urbi et Orbi, 20 de abril de 2025.
[2] Leão XIII, Carta Encíclica Rerum novarum (15 de maio de 1891), 9.