06 Mai 2022
"Olhe, estou perfeitamente ciente da enorme distância entre as duas situações. Mas para quem busca a paz, o esquema se repete. E quando, com Santo Egídio, começamos as negociações para pôr um fim à guerra civil em Moçambique, toda vez parecia ao outro lado uma traição. Se você fala com a Renamo, a resistência, é cúmplice. Se você fala com o governo, é cúmplice”. O cardeal Matteo Zuppi, arcebispo de Bolonha, sabe que quem busca a paz encontra-se a enfrentar, evangelicamente, uma "porta estreita". Mas "não há outro caminho", afirma ele.
A entrevista com Matteo Zuppi é de Gian Guido Vecchi, publicada por Corriere della Sera, 05-05-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis a entrevista.
Por quê?
Porque, caso contrário, a única solução é a guerra, o rearmamento. Mas é uma solução terrível, imprevisível e infeliz. Deve ser evitada de todas as maneiras. A guerra torna-se um plano inclinado e se reproduz. Corre o risco de envolver potências nucleares. Tudo para chegar a uma eventual vitória. Qual é o preço?
Muitas vezes se fala sobre o papel das religiões. Mas os cristãos estão divididos, especialmente no mundo ortodoxo. Francisco, falando ao Corriere, foi claro. Ele explicou que disse a Kirill: "Irmão, não somos clérigos do Estado". E a resposta do Patriarcado de Moscou é bastante ressentida...
Se as Igrejas se mostraram fracas, tanto mais é preciso dialogar, fortalecer o sentido de ser cristão. O Papa disse: eu sou um padre.
E os tons de capelão militar de Kirill?
Alguns falam do fracasso do ecumenismo, e certamente nestes dias vemos sua fraqueza. Mas não foi um equívoco, o ecumenismo. No máximo, isso mostra que deveríamos ter feito mais. Encontrar o comum ‘não matar’ entre as igrejas, os princípios do Evangelho, a força para vencer a lógica do mal que desencadeia a guerra. O caminho do diálogo, a convicção comum para parar esse massacre. Depois haverá muitas maneiras de reconstruir o que a guerra criou. O Papa falou com clareza, como deve ser entre irmãos.
Mas como se consegue parar uma guerra de invasão?
O conflito envolve muitos. É preciso muito esforço, uma visão ampla. Crie uma mesa de negociação que envolva todos os atores, diretos e indiretos.
Até a Europa, a OTAN?
Todo mundo, começando pelas Nações Unidas. Uma nova conferência internacional para a paz e a segurança que a Europa ainda pode promover é um dos caminhos. Precisamos ajudar a consertar o que já estava quebrado e agora foi despedaçado. A tentação de vencer é perversa.
Em que sentido já estava quebrado?
A guerra no Donbass já existia há oito anos e nunca foi acertada. É claro que isso não justifica nenhuma intervenção armada. As palavras de Francisco são muito claras a este respeito. A distinção é clara, não há confusão entre agressor e agredido. Mas se queremos parar a guerra, devemos resolver todos os mal-entendidos, ou pior, os preconceitos que levaram ao conflito.
Agora parece uma estrada bloqueada, em vez de estreita...
Mais uma razão para tentarmos buscar a paz. O rearmamento é a pior coisa que pode ser feita. Tentamos encontrar tudo o que possa aproximar as posições, para começar a discutir possíveis soluções. Se você olhar bem, nessas semanas de guerra sempre houve o fio de consciência de que é preciso conversar. Houve até nos piores momentos. É preciso trabalhar nisso, potencializá-lo, envolver muitos.
Como acabou em Moçambique?
Acabou que na mesa de negociação nos olhamos nos olhos. Os inimigos tornaram-se adversários políticos, humanos.
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“Francisco corajoso. A porta para a paz é estreita, mas não há outra solução”. Entrevista com Matteo Zuppi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU