Por: Jonas | 26 Julho 2013
“Três semanas antes da eleição de Bergoglio, escrevi no Twitter: ‘o futuro papa será Francisco, porque assim como fez o Santo de Assis, convém alguém que reconstrua a Igreja que perdeu sua credibilidade... ’”. Leonardo Boff (foto) já não usa o hábito. Desde as diferenças com Roma, que nasceram de suas posturas teológicas, deixou a ordem franciscana e se casou. Entretanto, a barba, branquíssima, continua sendo a mesma de quando era frei. O teólogo da libertação, que Joseph Ratzinger não conseguiu “suavizar”, conversa com “La Stampa” sobre a viagem brasileira do primeiro Papa latino-americano da história.
Fonte: http://goo.gl/8L02YS |
A entrevista é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, 25-07-2013. A tradução é do Cepat.
Eis a entrevista.
Você ficou surpreso com a maneira como a multidão, no Rio de Janeiro, recebeu Francisco?
Não. É um entusiasmo que se deve à sua simplicidade, por ter vindo sem um grande aparato de segurança, por ter percorrido as ruas da cidade num carro simples e com os vidros sempre abertos, desejando ser alcançado e tocado pelas pessoas, por parar para beijar as crianças. Nota-se que é um pastor, um bispo que está no meio de seu povo. Não é um monarca.
Francisco quis começar sua viagem com uma visita ao Santuário de Aparecida. Por quê?
Porque aqui, em 2007, os bispos latino-americanos publicaram um documento que voltou a dar espaço aos pobres e que afirma que certos métodos para evangelizar são velhos e devem ser mudados. Necessita-se de pastores que tenham o cheiro das ovelhas, mais do que o perfume das flores dos altares.
Francisco demonstra que tem uma grande devoção mariana e uma enorme atenção pela piedade popular. Não parecem aspectos tão próximos à sensibilidade progressista...
Pelo contrário, são. São muito próximos à Teologia da Libertação. Na Argentina, está se desenvolveu particularmente como teologia do povo, e a levava adiante o jesuíta Juan Carlos Scannone, que foi professor de Bergoglio. O Papa não está distante desta teologia. Não é uma devoção popular “pietistica”, mas uma devoção que conserva a identidade do povo e se compromete com a justiça social.
E muitos momentos, o Papa fala dos pobres e no hospital do Rio de Janeiro voltou a dizer que ir aos pobres significava tocar “a carne de Cristo”. O que isto significa?
O pobre é o verdadeiro representante de Cristo; em certo sentido o pobre é o verdadeiro “Papa”, e Cristo continua crucificado no corpo dos condenados da terra. Cristo está crucificado nos crucificados da história.
O que muda na Igreja com a chegada do papa Francisco?
Acredito que mudará muito. Francisco não está reformando apenas a Cúria, está reformando o papado. Insistir em que é bispo de Roma, ter deixado o palácio para viver na residência de Santa Marta, significa ir ao mundo. O Papa explica que prefere uma Igreja acidentada, mas que saia à rua, do que uma Igreja asfixiada e fechada no templo. No momento, sente-se que a Igreja é uma fogueira de esperança e não uma fortaleza assediada, sempre em polêmica com a modernidade ou uma alfândega que vigia e regula a fé ao invés de facilitá-la.
Há alguns que dizem que ele está dessacralizando o papado...
Não, não o está dessacralizando, apresenta-o em sua verdadeira dimensão evangélica. É o sucessor de Pedro e Pedro era um simples pescador. É preciso combater a “papolatria” que temos visto nas últimas décadas. Os cardeais não são os príncipes da Igreja, mas servos do povo de Deus. Os bispos devem participar na vida das pessoas. E o Papa não se sente um monarca. Inclusive, diante da Presidente do Brasil, disse: “Venho aqui como bispo de Roma”, ou seja, como aquele que preside a Igreja na caridade e não no direito canônico.
O que provocará um Papa latino-americano provocará no Brasil e na América Latina?
Acredito que Francisco percebe que o poder deve escutar os pobres, deve escutar os jovens que protestam pelas ruas. Sua insistência sobre a justiça social pode ajudar as democracias latino-americanas e favorecer uma maior participação. A nossa, no Brasil, é uma democracia de baixa intensidade. O Papa convida os políticos a serem verdadeiros servos do povo.
Você se arrependeu por ter deixado o hábito franciscano?
Não, porque deixei o hábito, mas conservei o espírito e continuo me sentindo franciscano. Trabalho pela preservação da criação e para que, nesta nossa terra, todos nos sintamos irmãos e irmãs.
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“Como São Francisco, Bergoglio reconstrói a Igreja”, afirma Leonardo Boff - Instituto Humanitas Unisinos - IHU