07 Fevereiro 2024
"A iniciativa extraordinária lançada pelo Papa João [XXIII] é hoje, portanto, uma fonte de profundo conflito entre aqueles que a invocam para seguir um caminho e aqueles que o querem barrar", escreve Luigi Sandri, jornalista italiano, em artigo publicado por L'Adige, 29-01-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
A interpretação autêntica do Vaticano II, cuja convocação João XXIII anunciou pela primeira vez há exatamente sessenta e cinco anos, representa ainda hoje o ponto decisivo e não resolvido do "se" e do "como" implementar reformas ousadas na Igreja Católica Romana.
As suas hierarquias, de fato, têm opiniões diversificadas, e por vezes opostas, sobre o Concílio como guia de um bilhão e trezentos milhões de fiéis.
Quando, no dia 25 de janeiro de 1959, o Papa Roncalli convocou em Roma, numa pequena sala do mosteiro beneditino de São Paulo, o pequeno grupo de cardeais presentes na cidade, nenhum deles esperava um anúncio tão clamoroso: a sua intenção de convocar um novo Concílio. O último da série dos "ecumênicos", realizado em 1870, havia proclamado o dogma da infalibilidade papal: uma definição tão exigente que durante décadas havia levado muitos bispos e teólogos a teorizar que já não haveria mais Concílios, bastando o Sumo Pontífice para governar os católicos espalhados pelo mundo.
Por fim, passadas as surpresas e concluídos os exigentes trabalhos preparatórios, em 11 de outubro de 1962 o Papa João inaugurou a primeira sessão do Concílio; no seguinte mês de junho morreu e o conclave elegeu Paulo VI como seu sucessor. Este moderou as três sessões seguintes e, em dezembro de 1965, concluiu a Assembleia que viu a participação de aproximadamente dois mil e quinhentos “padres”.
Querendo resumir o que a assembleia elaborou em dezesseis distintos documentos, poder-se-ia dizer o seguinte: a Igreja, como povo de Deus que caminha na história, coloca-se a serviço das esperanças e dos sofrimentos do mundo, e por isso, pobre e feliz, anuncia-lhe o Evangelho, tentando testemunhá-lo com sua vida.
Em que ponto estamos hoje? Reduzindo ao essencial, poderíamos dizer que, de uma série de possíveis reformas, não previsto sessenta anos atrás, os favoráveis e os contrários referem-se precisamente ao Vaticano II para apoiar teses opostas. Por exemplo, aqueles que abominam a “bênção” de casais do mesmo sexo argumentam que os admitir seria trair aquele Concílio que nunca falou deles; e o mesmo pode ser dito das diaconisas ou, pior, das mulheres no sacerdócio, tema totalmente ausente no encontro. Pelo contrário, aqueles que são favoráveis às duas hipóteses afirmam que, embora não previstas por aquela Assembleia, são, no entanto, uma lógica e fiel consequência das suas linhas pastorais e teológicas.
A iniciativa extraordinária lançada pelo Papa João é hoje, portanto, uma fonte de profundo conflito entre aqueles que a invocam para seguir um caminho e aqueles que o querem barrar. Portanto, há muitos pedidos de um novo Concílio para encontrar uma síntese partilhada. Mas esse só poderia ser composto por “padres”, sem “madres”? Já nasceria morto, porque agora a voz se tornou trovejante, irreprimível, que propõe a presença igualitária também feminina no organograma da Igreja Romana.
Dadas essas premissas, é certo que o debate sobre o Vaticano II, e a hipótese de um novo Concílio, pesarão no conclave que um dia escolherá o sucessor de Francisco.
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O Segundo Concílio, uma herança que divide. Artigo de Luigi Sandri - Instituto Humanitas Unisinos - IHU