05 Novembro 2025
"O primeiro-ministro Netanyahu, a quem a viúva de Rabin nunca quis apertar a mão por acreditar que ele estava entre os instigadores da campanha de ódio que levou ao assassinato de seu marido, é alvo de múltiplas investigações por corrupção, e apenas a urgência do conflito adiou a promulgação da sentença", escreve Nello Scavo, repórter internacional, em artigo publicado por Avvenire, 04-11-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Trinta anos após o assassinato do primeiro-ministro Rabin pelas mãos de um membro da extrema-direita que, sob novas siglas, mas com os mesmos rostos, agora governa Israel, o país precisa lidar com uma crise interna há muito reprimida para abrir espaço para a reação pós-7 de outubro de 2023. O primeiro-ministro Netanyahu, a quem a viúva de Rabin nunca quis apertar a mão por acreditar que ele estava entre os instigadores da campanha de ódio que levou ao assassinato de seu marido, é alvo de múltiplas investigações por corrupção, e apenas a urgência do conflito adiou a promulgação da sentença. Ontem, a polícia invadiu os escritórios do principal sindicato, prendendo seu presidente, Arnon Bar-David: corrupção, fraude e lavagem de dinheiro.
Dentro das instituições, a luta interna pelo poder eclodiu em um confronto público após a circulação de vídeos com as brutais torturas dos militares israelenses nos detentos palestinos. Abusos que não receberam condenação do governo, pelo contrário determinado a seguir a linha ditada por Itamar Ben-Gvir, o ministro da Segurança Nacional que, quando jovem extremista, zombava de Rabin.
Nos últimos dias, o ministro e colono pediu para ser filmado enquanto os guardas prisionais humilhavam os detentos palestinos, para os quais "deveria haver pena de morte” na opinião de Ben-Gvir. Ontem pela manhã, Netanyahu também aderiu à proposta, justamente quando havia sido presa após sua renúncia e tentativa de suicídio a procuradora-geral militar, que havia autorizado a divulgação para alguns veículos de comunicação de vídeos em que os militares israelenses torturavam brutalmente alguns supostos terroristas de Gaza.
A polícia suspeita que o ex-procurador-chefe das Forças Armadas, coronel Matan Solomosh, tentou proteger a ex-procuradora-geral militar, major-general Yifat Tomer-Yerushalmi, que renunciou ao cargo na sexta-feira e confessou ter vazado vídeos de vigilância do centro de detenção militar de Sde Teiman.
Tomer-Yerushalmi deveria ser intimada para interrogatório, mas no domingo desapareceu por horas na costa de Tel Aviv após deixar uma carta de despedida. Quando a polícia a encontrou, ela havia se desfeito do celular. As prisões da ex-procuradora-geral e do ex-procurador-chefe foram confirmadas. O tribunal reavaliará as posições dos oficiais sob investigação em até três dias.
A investigação ocorre em meio a tensões internas, com mais de 200 mil judeus ortodoxos nas ruas protestando contra o serviço militar obrigatório, e alguns membros do governo propondo aprovar normas que permitam a prisão de desertores.
“Três décadas depois, ainda vemos os mesmos sinais, talvez ainda mais fortes: linguagem dura, grosseira e vulgar; acusações de traição; o veneno se espalhando nas redes sociais e na esfera pública; violência de todas as formas, física e verbal”, denunciou o presidente Yitzhak Herzog durante a cerimônia de ontem à tarde em memória de Rabin. Mais de 80 mil pessoas marcharam pelas ruas em memória do general que se tornou primeiro-ministro, assinou o tratado de paz com Arafat em 1993 e foi assassinado dois anos depois. “Estamos mais uma vez à beira do abismo, e só existe um caminho a seguir: tolerância zero à violência”, afirmou o chefe de Estado, lembrando que Israel não deveria ser “um campo de batalha, mas uma casa”. A referência é às disputas internas, a um clima que levou quase 100 mil israelenses a emigrar.
“Estamos testemunhando uma violência crescente e perigosa em toda a esfera pública”, observou. Até ontem à noite, nenhuma palavra por Rabin de parte de Netanyahu, que foi seu inimigo declarado. As únicas declarações do primeiro-ministro não foram para condenar as torturas de detidos, mas pelo vazamento de informações, que "causou enormes danos à reputação de Israel". No domingo, haviam sido restituídos os corpos de três soldados — identificados pelas autoridades israelenses — feitos reféns ou mortos já em 7 de outubro: o coronel Asaf Hamami, o capitão Omer Neutra e o sargento-mor Oz Daniel. Os confrontos armados continuam em Gaza, e a Turquia acusa Tel Aviv de violar o cessar-fogo: mais dez mortes foram relatadas ontem.
O ministro das Relações Exteriores turco, Hakan Fidan, no fim de uma reunião sobre Gaza em Istambul com seus colegas da Jordânia, Arábia Saudita, Indonésia e Paquistão, e também com a presença de representantes dos Emirados Árabes Unidos e do Catar, explicou que o Hamas "está pronto para entregar o governo de Gaza a um comitê palestino". Não está claro se as palavras do Hamas contemplem a possibilidade de um papel "externo" para o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair, apoiado pelos EUA.
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