10 Outubro 2025
"Netanyahu e a versão teocrática do 'messianismo realizado' foram derrotados, enquanto o povo palestino pode mais uma vez contar com a possibilidade de viver e poder, ainda que com mais sofrimentos e lutas, realizar suas esperanças e adquirir seus direitos", escreve Raniero La Valle, jornalista e ex-senador italiano, em artigo publicado por il Fatto Quotidiano, 09-10-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Até o fim, os ‘cegossionistas’ (os chamamos assim porque o sionismo é algo mais sério e também mais humano do que o que se manifestou em Gaza) sustentaram que o presente caso não foi um genocídio. Novamente no domingo, Francesco Giubilei defendeu isso no programa "In onda", abusando do sofrimento de Liliana Segre, que em agosto passado havia se declarado "despedaçada" pela "abominação" em que via Israel "afundar", mas havia se oposto ao uso da palavra para ajudar israelenses e palestinos a evitar cair "naquele abismo". Em reação a esse abuso, Francesca Albanese levantou-se e deixou o estúdio de televisão.
Portanto, está na hora de chegar a uma conclusão sobre essa gravíssima controvérsia, que não pode ser resolvida com o argumento superficial de que não importa dar nome às coisas, e a questão mais pertinente, agora que - se tudo correr como parece prometer - há uma parada nessa corrida rumo ao abismo, é perguntar como tudo vai terminar em Gaza. "Terminar" é o termo que Netanyahu sempre usou para dizer que ele não pararia por nenhum motivo (nem mesmo aquele de não sacrificar os reféns) antes de "terminar o trabalho". E agora, em vez disso, precisa parar antes que “o trabalho” esteja terminado. Talvez ele consiga arrancar alguns pedaços de seus objetivos, mas não o que ele queria. Portanto, para ele, é uma derrota mortal, porque, como resultado da ordem de Trump, a abominação que ele causou torna-se inútil, e seu custo, para ele, para Israel e para o próprio povo judeu, revela-se exorbitante.
Neste ponto, em vez de perguntar se o genocídio ocorreu ou não, é importante perguntar como ele terminou, isto é, se foi bem-sucedido ou não. Na definição de genocídio, formalizada pelo direito positivo, ou seja, pela atual Convenção sobre Genocídio, ratificada por 153 estados, o genocídio ocorre sob duas condições: que um grupo nacional, étnico, racial ou religioso como tal seja destruído no todo ou em parte; e que seja feito tendo a "intenção" de destruí-lo.
Pois bem, o que aconteceu em Gaza é que Netanyahu e o governo israelense efetivamente destruíram a população de Gaza. "Em parte", matando-a, "no todo", reduzindo ela e a sua terra a uma "não existência". Mas foram derrotados em sua intenção de pôr um término à "questão palestina", isto é, destruir o povo palestino "como tal", isto é, em sua existência política como povo, tanto que isso queira dizer um "Estado palestino" quanto, uma vez que esse Estado foi tornado impossível e para sempre excluído por Netanyahu, uma existência estatal com plenos direitos em um Estado multinacional democrático e pluralista.
Portanto, Netanyahu e a versão teocrática do "messianismo realizado" foram derrotados, enquanto o povo palestino pode mais uma vez contar com a possibilidade de viver e poder, ainda que com mais sofrimentos e lutas, realizar suas esperanças e adquirir seus direitos.
E quem venceu? Segundo os noticiários, Trump venceu ditando a sua lei a Israel e ameaçando os palestinos. Mas, segundo a grande história, venceram a Flotilha, aqueles que idealmente se domiciliaram em Gaza, a começar pelo Papa Francisco, que o fazia todas as noites abraçando o pároco por telefone, venceram as multidões que se insurgiram ao redor do mundo para defender a causa dos palestinos e da humanidade, venceram os três milhões de jovens e menos jovens que, em cem cidades da Itália, "se levantaram de seus sofás" e "jogaram seus corpos na luta", como escreveu Simonetta Sciandivasci outro dia no La Stampa.
Mas também voltamos a ver os Estados Unidos a que estávamos acostumados, que não podiam se perder mostrando abraçar a ideia de destruir "no todo" um povo negado e oprimido, eles que pretendem ser a luz dos povos e o modelo normativo da democracia e do humanismo universal. Por tudo isso, o genocídio fracassou.
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