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O legado do Papa Francisco por seus escritos políticos fraternos e poéticos

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30 Abril 2025

Em seus doze anos de pontificado, Francisco publicou numerosos textos que deixaram uma marca no mundo por sua ambição universal e na vida da Igreja pelas profundas mudanças que nela imprimiram.

A reportagem é de Luc Chatel, publicado por Le Monde, 25-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Muitas vezes apresentado como o papa das frases de efeito e das grandes viagens, ao contrário de seu antecessor, Bento XVI, que era um intelectual de biblioteca, apaixonado por teologia e filosofia, Francisco, que morreu na segunda-feira, 21 de abril, no Vaticano, também foi um grande papa dos textos escritos.

De formação filósofo e teólogo, publicou muitos textos, alguns dos quais surpreenderam por seu conteúdo inédito e outros por sua excepcional ressonância mundial.

Existe cerca de quinze tipos de textos de documentos oficiais que os papas podem publicar: bulas ou encíclicas, homilias, exortações apostólicas ou meditações. “Essas categorias podem parecer surpreendentes e muito sutis, mas permitem distinguir os posicionamentos essenciais dos menos essenciais”, explica Michel Fédou, professor de teologia da Faculdade Loyola de Paris.

Quando o Papa Francisco fazia uma declaração no avião voltando de uma viagem, ele se comprometia, certamente, mas o que ele dizia não tinha o mesmo peso do que ele escrevia em uma encíclica [uma carta do papa dirigida à comunidade católica como um todo e que tem valor de ensinamento e se reporta à doutrina da Igreja].

Uma sutileza que Francisco dominava perfeitamente. Em doze anos de pontificado, publicou proporcionalmente (4 encíclicas, 7 exortações apostólicas, 91 cartas apostólicas) tanto quanto Bento XVI publicou em oito anos (de abril de 2005 a fevereiro de 2013: 3 encíclicas, 4 exortações apostólicas, 65 cartas apostólicas). Excepcionalmente, a primeira encíclica do Papa Francisco, Lumen fidei (junho de 2013), foi escrita com seu antecessor, que a iniciou antes de se aposentar e confiou a Francisco a sua conclusão. Francisco produziu textos que tiveram um alcance excepcional, tanto em termos de impacto entre os católicos quanto por sua recepção fora da esfera religiosa. Todos os observadores citam, a esse respeito, um documento cuja ressonância continua: a encíclica Laudato si' (subtítulo: “Sobre o cuidado da Casa Comum”). Esse texto de maio de 2015 sobre a necessária tomada de consciência ecológica teve um eco poderoso, comparável ao da encíclica Rerum novarum (1891) do Papa Leão XIII, que fundou a doutrina social da Igreja e levou muitos católicos a se engajarem na vida política e sindical.

“Poucos textos dessa natureza tiveram igual impacto nas últimas décadas”, confirma Michel Fédou. O documento logo se tornou um best-seller do verão: em um mês após sua publicação, 100 mil cópias haviam sido vendidas na França, e também podia ser obtido gratuitamente em vários sites, católicos ou não. A mídia imediatamente e maciçamente se apoderou dessa encíclica. Na imprensa escrita, levantamentos, comentários e intervenções se sucederam para descrever seu conteúdo.

Ecologia integral

A onda de entusiasmo gerada pela Laudato si' pode ser medida pelo número de reuniões, encontros e debates que provocou, até nos mais altos órgãos internacionais. Em setembro de 2015, o papa recebeu no Vaticano os ministros da ecologia dos principais países europeus, a quem pediu que honrassem a dívida ecológica, “particularmente entre o Norte e o Sul”. Alguns dias depois, ele abordou novamente o tema nos Estados Unidos, onde, pela primeira vez na história, um papa foi convidado a se dirigir ao Congresso durante uma sessão conjunta do Senado e da Câmara dos Deputados. No dia seguinte, ele lembrou que “todo ataque ao meio ambiente (...) [era] um ataque à humanidade” perante a Assembleia Geral da ONU.

Entre os católicos, as paróquias e os grupos de reflexão se mobilizaram em torno do tema. O evento católico do verão de 2015 na França foi a realização, em Saint-Etienne, dos Encontros Cristãos de Ecologia, organizados em conjunto com o semanário La Vie (Grupo Le Monde), que reuniu cerca de dois mil participantes durante três dias. “Muitas associações e movimentos católicos se mobilizaram nas questões ecológicas após a publicação da Laudato si', enfatizou Michel Fédou. Houve, em particular, a criação do selo 'Igreja Verde' [em 2017], que levou as comunidades cristãs a assumir compromissos concretos de proteção à natureza. Muitos católicos tentaram se orientar para de um ideal de sobriedade feliz e limitar os consumos desnecessários”.

Esse impacto também foi observado por Pierre Cannet, responsável pelo programa do Fundo Mundial para a Natureza (WWF): “Cada vez mais estruturas e organizações religiosas estão nos convidando ou participando conosco de encontros, cúpulas e conferências. Como, por exemplo, a Cúpula das Consciências, em Paris, em 21 de julho de 2015”.

Essa foi uma encíclica de importância histórica, pois foi a primeira inteiramente dedicada à questão ecológica. O tema também havia sido abordado pelos antecessores de Francisco, desde Paulo VI na carta apostólica Octogesima adveniens (no 80º aniversário da encíclica Rerum novarum) em 1971, até Bento XVI e sua encíclica Caritas in veritate (2009). Mas o tema da ecologia era tratado entre outros tópicos, de forma mais marginal. Além disso, Bento XVI tinha uma percepção antropocêntrica. Por meio de seu conceito de “ecologia humana”, ele vinculava sistematicamente a defesa do meio ambiente às lutas contra o aborto e a eutanásia. Francisco, por outro lado, escolheu o conceito de “ecologia integral”, segundo o qual a conversão ecológica não se limita apenas às questões ambientais, mas inclui a vida espiritual, o respeito pela dignidade de toda vida e de toda pessoa, bem como a exigência de fraternidade e justiça social.

“A Laudato si' faz um diagnóstico poderoso da crise ecológica e de todos os grandes desafios com que nos confronta”, observa Michel Fédou. Um dos aspectos originais dessa encíclica é que ela associa o tema da ecologia ao da justiça social”. De fato, o papa considera que as políticas econômicas cujo único objetivo é a busca do lucro são as principais responsáveis pelos danos ao meio ambiente. Por exemplo, denuncia “os danos causados pela exportação de resíduos sólidos e líquidos tóxicos para os países em vias de desenvolvimento e pela atividade poluente de empresas que fazem nos países menos desenvolvidos aquilo que não podem fazer nos países que lhe propiciam o capital”.

A encíclica também foi apreciada pela qualidade dos argumentos oferecidos pelos cientistas que participaram de sua elaboração. “Sobre a questão climática, ela se baseia amplamente nos relatórios do GIEC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), observa um de seus ex-vice-presidentes, Jean Jouzel, no ensaio coletivo Francisco: o Papa Verde (Temps Présent, 2015).

Também trata dos fenômenos em si, da responsabilidade humana - que é reafirmada -, dos impactos em todos os ambientes e das soluções a serem introduzidas. Esse texto é um resumo das reflexões que o precederam (...). Nessa encíclica, há uma preocupação com a pedagogia e a precisão”.

Essa copresença da precisão e da pedagogia já estava presente no primeiro texto do papa, considerado fundamental por muitos observadores, ainda que pouco citado: Evangelii gaudium, uma exortação apostólica - documento dirigido aos fiéis após um sínodo, ou seja, uma reunião de bispos sobre uma temática específica - publicada em novembro de 2013.

Esse texto inaugura as fortes críticas de Francisco à cúria romana. “Uma parte diz respeito à reforma da Igreja, observa Marie-Jo Thiel, professora emérita da Faculdade de Teologia Católica da Universidade de Estrasburgo. O papa insiste em uma conversão da pastoral para que ela seja direcionada para a missão, ou seja, para a anunciação da alegria do Evangelho, o que significa abandonar uma pastoral de conservação na qual o existente é mantido de forma bloqueada. Isso pressupõe repensar prioridades, estruturas, bem como a necessidade de estar disposto a mudar hábitos, estilos, horários, linguagem, tudo o que possa impedir o encontro com Cristo. Francisco anuncia nesse texto que as estruturas eclesiais devem ser transformadas”.

Mas, acima de tudo, observa a pesquisadora, “Francisco já define nela a política eclesial que deseja implementar. Ele apresenta os grandes temas de seu pontificado e apela para inúmeras imagens que usará com frequência. Por exemplo, quando fala da 'Igreja em saída' e das 'periferias', para convidar a instituição a sair de si mesma”.

Uma constatação compartilhada por Michel Fédou: “Evangelii gaudium dá o ‘tom’ de seu pontificado. Leva ao máximo o que o diferencia de Bento, que tinha como uma de suas principais preocupações a atenção à verdade. Francisco, por outro lado, dá uma inflexão diferente ao insistir na anunciação do Evangelho. Uma anunciação que deve ser feito prioritariamente fora dos âmbitos paroquiais, indo ao encontro dos mais pobres, dos migrantes, etc.”.

Essa predileção pelos excluídos e migrantes foi confirmada ao longo de seu pontificado. Se considerarmos sobretudo os gestos muito simbólicos, como suas viagens a lugares marcados pelos dramas do exílio e da migração, a Lampedusa (Itália), Lesbos (Grécia) ou Ciudad Juarez (México), sua encíclica Fratelli tutti, publicada em outubro de 2020, também marcou um momento forte e foi muito comentada.

Em um contexto político mundial que tende ao fechamento nacional e das fronteiras, o discurso do papa vai na contramão da tendência, com o acolhimento quase incondicional que ele pede dos migrantes, defendendo uma mudança radical de visão e de políticas. Mesmo entendendo o reflexo de medo que “faz parte do instinto natural de legítima defesa”, convida a superar “essas reações primordiais”. E convida “a estabelecer em nossas sociedades o conceito de plena cidadania e renúncia ao uso discriminatório do termo ‘minorias’”.

“Criar um eletrochoque”

Esse texto ofereceu apoio moral a várias pessoas e associações envolvidas em ações de solidariedade para com os estrangeiros. “Fratelli tutti defende a ideia de que, diante de desafios globais como a guerra, as desigualdades econômicas e sociais, as migrações forçadas e a urgência ecológica, é necessária uma resposta coletiva”, escreve a organização não governamental CCDF-Terre Solidaire, em um comunicado publicado na terça-feira, 22 de abril, um dia após a morte de Francisco.

Fratelli tutti também aborda a questão do diálogo inter-religioso, outro tema central do pontificado de Francisco e que mais uma vez o distingue de seu antecessor, muito mais cauteloso nesse campo. Assim como havia se nutrido fortemente de seus diálogos com o Patriarca Bartolomeu, chefe da Igreja Ortodoxa de Constantinopla, para redigir a Laudato si', Francisco iniciou um diálogo desafiador com Ahmed Al-Tayeb, grande imã de Al-Azhar - o principal centro intelectual do Islã, localizado no Cairo - com quem se encontrou em Abu Dhabi, em fevereiro de 2019.

Esse diálogo alimentou a Fratelli tutti, como ele escreve na introdução da encíclica, depois de recordar a visita de São Francisco de Assis ao sultão Al-Malik Al-Kamil, no Egito, em 1219.

“Aquela viagem, no momento histórico caracterizado pelas cruzadas, revelava ainda mais a grandeza do amor que ele desejava testemunhar, desejoso de abraçar todos os homens”, afirma.

Entre os textos mais importantes do Papa, Marie-Jo Thiel inclui a Carta ao Povo de Deus, publicada em agosto de 2018 e inteiramente dedicada ao problema das violências sexuais contra menores na Igreja Católica. Um tema sobre o qual a pesquisadora, especialista em teologia moral e ética, escreveu vários livros e sobre o qual ela teve oportunidade falar com o Papa Francisco durante uma audiência.

“Era a primeira vez que um papa falava de abusos sexuais, de abusos de poder e abusos de autoridade”, comenta. Naquele texto, Francisco denuncia a cultura do abuso e da dissimulação.

Nunca antes na história da Igreja havia sido possível falar de cultura da dissimulação.

O papa disse também que não queria mais falar de “tolerância zero”, mas de “nunca mais”, uma expressão que lembra muito o “nunca mais” proclamado após as duas guerras mundiais. É claro que esse texto foi criticado por não fornecer orientações práticas, continua a especialista. Mas a intenção era, acima de tudo, criar um eletrochoque mundial, reconhecendo tanto os abusos quanto sua ocultação, indicando-os como contrários ao Evangelho”.

O eletrochoque foi ainda mais eficaz porque os escritos pontifícios se distinguem por sua forma muito acessível, o que se explica em grande parte pela corrente teológica que os inspira, ligada às suas origens argentinas: a da Teologia do Povo. “É um ramo da teologia da libertação menos focado em questões políticas, menos marcado pela influência marxista”, explica François Euvé, teólogo e redator-chefe da revista Etudes. Em seu país, ele viveu com os mais pobres, dos quais era muito próximo. Seu hábito de conversar com os mais humildes e seu desejo de direcionar sua política pastoral para eles fez com que sempre usasse uma linguagem a menos técnica possível”.

Esse estilo que permite o encontro com um grande número de pessoas é simples, incisivo e rico em imagens. O recurso à metáfora faz parte dos registros que o pontífice usa com frequência. Na Evangelii gaudium, Francisco evoca “os cristãos que parecem ter escolhido viver uma Quaresma sem Páscoa” e afirma que “a Igreja não é uma alfândega”. Quando denuncia a situação de extrema exclusão de certas pessoas, que ultrapassa os estágios de opressão e exploração, ele fala de uma “cultura do descarte”: “Os excluídos não são apenas explorados, mas resíduos, são sobras”.

Sua última encíclica, Dilexit nos (Amou-nos, outubro de 2024), sobre “o amor humano e divino de Jesus Cristo”, faz referência a imagens mais pessoais, em particular à culinária de sua avó: “Recordo que no carnaval, quando éramos crianças, a avó nos preparava doces, e a que ela fazia era uma massa muito fina. Depois colocava-a no azeite e aquela massa crescia e quando nós a comíamos, estava vazia. Aqueles doces em dialeto chamavam-se ‘bugie” (mentirinhas). E era precisamente a avó quem explicava a razão: aqueles doces ‘são como as mentiras, parecem grandes, mas dentro não têm nada, não há nada verdadeiro, não há substância alguma’”.

Esse texto também é notável pelo uso do “tu”, que facilita a aproximação com o leitor. “Se te fechares no teu conforto, isso não te dará segurança”, escreve Francisco, ou novamente: Esse mesmo Jesus espera hoje que lhe dês a possibilidade de iluminar a tua existência, de erguer-te, de encher-te com a sua força”. Um estilo já usado, por exemplo, na exortação apostólica Amoris laetitia (março de 2016): “Vive, com sereno entusiasmo, no meio dos teus incómodos e pede ao Senhor que guarde a tua alegria para poderes transmiti-la ao teu filho”. Essa exortação também marcou um importante passo adiante, que muitos católicos estavam esperando há décadas: os divorciados novamente casados não são mais considerados excomungados. “Quanto às pessoas divorciadas que vivem numa nova união, é importante fazer-lhes sentir que fazem parte da Igreja, que ‘não estão excomungadas’ nem são tratadas como tais, porque sempre integram a comunhão eclesial”, escreveu o Santo Padre.

Fiel ao seu temperamento forte, que alguns até definem como autoritário, o Papa foi mais longe nessa direção ao validar um texto que não escreveu, mas que inspirou diretamente: a declaração do Dicastério para a Doutrina da Fé intitulada Fiducia supplicans e com o subtítulo “Sobre o significado pastoral das bênçãos”. Publicado em dezembro de 2023, esse texto causou considerável controvérsia porque autoriza oficialmente a bênção de pessoas que antes eram excluídas dela, em particular casais do mesmo sexo e divorciados novamente casados. Ele poderia ser interpretado como uma validação da união religiosa desses casais. As igrejas católicas africanas declararam imediatamente que não dariam a bênção aos homossexuais. A polêmica decorre em parte do fato de que esse gesto é amplamente praticado na América do Sul, de onde Francisco é originário, e que não tem o mesmo significado que tem em outras partes do mundo. Trata-se de uma bênção de poucos segundos concedida àqueles que a solicitam, e é mais uma forma de piedade popular do que um sacramento oficial. O preâmbulo do texto também afirma: “Pode-se compreender a possibilidade de abençoar os casais em situação irregular e os casais do mesmo sexo, sem validar oficialmente seu status e sem alterar de forma alguma o ensinamento perene da Igreja sobre o casamento”. Assim como Francisco, o prefeito do dicastério, Cardeal Víctor Manuel Fernández, também é argentino.

Ode à literatura

Se o estilo de escrita de Francisco é mais acessível do que o de seus predecessores, ele também se distingue pela amplitude de suas referências, que não se limitam à teologia e à filosofia, mas também dão amplo espaço à literatura e à poesia. Em um de seus textos mais surpreendentes, a exortação apostólica Querida Amazônia (fevereiro de 2020), na qual ele se dirige às populações indígenas da Amazônia, ele se refere a dezesseis escritores e poetas sul-americanos.

“Essa exortação nos leva ao longo do rio Amazonas, na tradição poética dos grandes escritores latino-americanos, convidando-nos a contemplá-lo ouvindo as melodias que vêm de suas margens”, escreve Marcel Rémon, diretor do Centro de Pesquisa e Ação Social e da Revue Projet, em seu artigo de maio de 2020 Os quatro sonhos do Papa Francisco. “E o primeiro eco é um grito de dor: ‘São muitas as árvores/onde morou a tortura/e vastas as florestas/compradas entre mil mortes’ (...) O sonho ecológico do papa é irrigado pela poesia e pela beleza: ‘Os poetas populares, enamorados da sua imensa beleza, procuraram expressar o que este rio lhes fazia sentir e a vida que ele oferece à sua passagem, com uma dança de delfins, anacondas, árvores e canoas’. Para Francisco, existe uma verdadeira e própria profecia amazônica de contemplação”.

Seu amor pela poesia e pela literatura, que permeia muitos de seus escritos, também se expressou no que é, sem dúvida, seu texto mais inesperado e original: a Carta do Papa Francisco sobre o papel da literatura na educação. Ele começa dizendo que “Muitas vezes, no tédio das férias, no calor e na solidão dos bairros desertos, encontrar um bom livro para ler torna-se um oásis, afastando-nos de outras escolhas que são nocivas”. Em seguida, ele expõe sua intenção: “Com esta carta, desejo propor uma mudança radical de atitude em relação à grande atenção que deve ser dada à literatura no contexto da formação dos candidatos ao sacerdócio”.

Isso é seguido por uma reflexão na qual ele relembra memórias pessoais de seu período como professor de literatura e que é, acima de tudo, uma inspirada e bem documentada ode à palavra escrita. É um elogio ao livro e à leitura que ecoa de algumas de suas principais imagens: “Ao lermos um texto literário, colocamo-nos na condição de ‘ver com os olhos dos outros’, adquirindo uma amplitude de perspectiva que alarga a nossa humanidade”, escreve ele, lembrando Marcel Proust, Jean Cocteau e Jorge Luis Borges.

Em um artigo publicado no Le Monde em 23 de agosto de 2024, William Marx, titular da cadeira de literatura comparada no Collège de France, comentou: “Vindas da pena de um papa, essas palavras são fortes, até mesmo revolucionárias. (...) Alguém pode acreditar mais do que esse papa no poder da literatura, na qual ele reconhece 'a principal tarefa confiada ao homem por Deus: a de dar nome aos seres e às coisas'?”

Crítica direta ao governo Trump

O amor de Francisco pela poesia não o impediu, entretanto, de ser particularmente direto quando o considerava necessário. Foi assim que seu último texto, a Carta aos Bispos dos Estados Unidos da América, publicada em 10 de fevereiro, foi vista como uma intervenção muito direta no debate público estadunidense. Desprovido de imagens ou metáforas, é um dos escritos mais críticos em relação à política do governo Trump sobre migrantes.

“Estou acompanhando de perto a grande crise que se desenrola nos Estados Unidos com o início de um programa de deportações em massa. A consciência corretamente formada não pode deixar de expressar um juízo crítico e seu dissenso em relação a qualquer medida que identifique, tácita ou explicitamente, o status ilegal de alguns migrantes com a criminalidade”, é sua condenação.

Em seguida, o papa convidou o governo dos EUA, em nome do “bem comum”, a acolher e integrar “os mais vulneráveis”. E, ao lembrar a necessidade de “uma política que regule uma migração ordenada e legal”, explica que isso não pode “ser realizado através do privilégio de alguns e do sacrifício de outros”, referindo-se aos “muros de ignomínia” que Trump ergueu entre os Estados Unidos e o México. A visita de Páscoa do vice-presidente dos Estados Unidos, J.D. Vance, católico nacionalista, na véspera da morte do pontífice, forneceu o pano de fundo para esse confronto entre duas visões do catolicismo. Um confronto que, sem dúvida, continuará em vista da eleição do novo chefe da Igreja.

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