“Um oligopólio controla o mercado de respiradores”. Entrevista com Jonathan Tepper

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26 Março 2020

As empresas despedem empregados por causa da pandemia... Todas? Não! As grandes plataformas da rede (Google, Amazon, Facebook) estão contratando trabalhadores: com salários baixos, isso sim. Podem porque são as únicas que se beneficiam de que nossa vida tenha se tornado virtual, global e desmaterializada. Cada vez vivemos menos em nosso bairro e mais em um mundo digital que só elas controlam e rentabilizam. E nos pagam muito poucos impostos por terem liquidado a sua concorrência local, que, ao contrário, pagava. Podemos reagir exigindo com nosso voto que essas plataformas se tornem um serviço público administrado pela União Europeia. E também deixando de comprar na Amazon o que podemos encontrar na loja da esquina.

Em relação a essas questões, o jornal espanhol La Vanguardia conversou com Jonathan Tepper, ex-vice-presidente do Bank of America, autor de The myth of capitalism (O mito do capitalismo).

A entrevista é de Lluís Amiguet, publicada por La Vanguardia, 25-03-2020. A tradução é do Cepat.

Eis a entrevista.

Com menor concorrência entre as empresas, maior desigualdade entre as pessoas?

Quanto menos forem as empresas que controlam um setor, mais altos são os preços que podem exigir no mercado e menores os salários que pagam. E mais os seus diretores recebem. Desse modo, a falta de concorrência gera desigualdade.

Tem um exemplo?

Um sangrento. Agora, vemos como a falta de concorrência no mercado da saúde coloca em risco nossas vidas. Por que é tão difícil encontrar máscaras e respiradores?

A causa é que são bem poucas as empresas que controlam o mercado e se aproveitam?

Bem poucas empresas controlam setores vitais para todos, como a saúde e, por isso, estamos assim diante da pandemia.

Por isso, agora, faltam respiradores?

Faltam porque permitimos que, durante anos, quatro conglomerados dividissem o mercado de respiradores.

São apenas quatro?

Pode parecer que são mais, mas por trás de muitas empresas estão esses quatro conglomerados que pactuam produção e preços.

E como dividem o mercado?

Como a máfia de Chicago: este produto é para você, este outro para mim e não vamos fabricar muitos do novo para que não tenhamos que baixar os preços.

Então, agora, os Estados assumem o controle dos setores vitais e da fabricação.

Porque é uma situação de emergência, mas não a solução definitiva. O Estado controlar tudo seria um pesadelo que já demonstrou que não funciona.

Mas a lógica do capitalismo favorece a concentração de empresas e poder.

O fato das empresas serem enormes não quer dizer que não compitam. Vejamos: Inditex, por exemplo, tornou-se gigantesca, porque foi inovadora em um mercado que, sim, é muito competitivo como é a venda de roupas.

Ou Mercadona e Ikea e muitas outras.

São gigantes, mas não triunfam por liquidar a concorrência com a ajuda dos governos e sem a regulamentação, mas por ser melhores em inovação e tecnologia. Essas campeãs geram emprego. Os oligopólios, ao contrário, compram políticos e leis que evitam que surjam novas empresas para não ter que competir e nos impõem preços.

Como favorecer a competição entre as empresas?

A sociedade - que é muito mais que o governo de plantão e suas conveniências e amizades - deve instituir mecanismos e instituições que velem pela concorrência.

Muito teóricos, desde Rockefeller, defenderam, ao contrário, os oligopólios.

Acreditam no big is beautiful e que restringindo a concorrência conquistam campeãs globais que investem em pesquisa, desenvolvimento e filantropia.

Também não necessitamos deles?

Só nos prejudicam. E se deseja, dou mais exemplos sangrentos na saúde.

Muito oportunos.

Valeant comprava pequenas farmacêuticas que fabricavam com exclusividade um medicamento. Adquiriu 34 laboratórios com suas patentes. Em 2015, aumentou o preço do Glumetza, seu medicamento estrela para a diabetes. De 572 dólares passou a custar 5.148.

Multiplicou por dez um preço?

O Zegerid, para o refluxo gástrico, de 421 passou a custar 3.034 dólares. Em apenas um dia, aumentou em 2.700% o preço de um tratamento para desintoxicação por chumbo.

Isso não é um crime?

Eu considero, mas a Organização Mundial da Saúde o incluiu em sua lista de medicamentos essenciais.

Mas parece um crime.

O diretor executivo da Valeant, Michael Pearson, ganhava 143,1 milhões por ano. Foi demitido por fraude, mas mantiveram seus preços. Há muitos outros exemplos. Somente três empresas dividem o mercado e extorquem os estadunidenses que necessitam de equipamentos de diálises.

Espero que, aqui, essas coisas não aconteçam.

Na Espanha, vocês pagam a terceira taxa de energia mais cara dos 27 estados da União Europeia. E o seu gás é o mais caro da Europa. O custo da energia para os lares espanhóis é 49% maior que a média europeia.

Por quê?

Por uma longa história de benefícios dos governos aos oligopólios em troca de favores aos políticos, naquilo que se chama de “captura do regulamentador” e de “portas giratórias”.

Quanto mais regulamentação, pior ou melhor?

Precisamos de regulamentação, mas muito simples para não a deixar apenas nas mãos de economistas e políticos e que o cidadão saiba que a concentração empresarial para reduzir a concorrência rebaixa o salário, aumenta os preços e reduz a qualidade dos produtos.

Não há liberdade política, sem liberdade econômica.

Para evitar que a retirem de nós temos armas formidáveis: a livre informação, o voto e a decisão de comprar. Por que você compra pela Amazon o que a loja de seu bairro pode lhe vender?

 

Nota de IHU On-Line:

O Instituto Humanitas Unisinos – IHU promove o XIX Simpósio Internacional IHU. Homo Digitalis. A escalada da algoritmização da vida, a ser realizado nos dias 19 a 21 de outubro de 2020, no Campus Unisinos Porto Alegre.

XIX Simpósio Internacional IHU. Homo Digitalis. A escalada da algoritmização da vida.

 

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