A surpresa de um Ano Santo que une piedade popular e Concílio

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16 Março 2015

Uma decisão surpresa – a do Jubileu da Misericórdia – que tem significados velhos e novos entrelaçados entre si e aparentemente conflitantes. Uma trama que faz do Ano Santo, anunciado na sexta-feira, 13 de março, por Francisco, um unicum, um caso único, na longa história dos Anos Santos, que tem mais de sete séculos. Será o 29º da série, que foi iniciada por Bonifácio VIII no ano 300, que também é o ano em que Dante coloca idealmente a viagem ultraterrena da Divina Comédia.

A reportagem é de Luigi Accattoli, publicada no jornal Corriere della Sera, 14-03-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

O primeiro entrelaçamento é entre velho e novo: os jubileus estão ligados com as indulgências e com as práticas penitenciais da Idade Média. Portanto, parecem ser distantes do sentimento moderno da fé cristã que pareceria professada pelo Papa Francisco; mas este Jubileu é dedicado à Misericórdia, e nunca se teve um Jubileu de Misericórdia.

Aqui, talvez, o velho prevaleça sobre o novo, sendo que cada Jubileu era um chamado ao perdão e, portanto, indiretamente, fazia referência à misericórdia de Deus que perdoa.

Mas há outro entrelaçamento, em que o que prevalece é a novidade: entre o caráter devocional das ritualidades jubilares e a referência desse Jubileu ao 50º aniversário do Vaticano II, cujas quatro sessões ocorreram de 1962 a 1965.

Aqui a sensação do contraste se torna impressionante, ao menos para quem tem a idade suficiente para lembrar do debate que acompanhou, em 1974-1975, a convocação e a realização do primeiro Jubileu que veio depois do Concílio, quando muitos consideravam que não era mais concebível que fosse convocado um Ano Santo por parte do próprio papa – Paulo VI – que tinha promulgado os documentos do Vaticano II e que tinha liderado a sua primeira implementação.

Uma escolha "tradicional"

Nessa recordação entrelaçada com o Vaticano II e com a piedade popular, pode-se ver uma astúcia do papa argentino: ele tem um grande poder de atração junto ao povo dos fiéis, mas sofre algumas resistências por parte dos ambientes intelectuais de orientação tradicional.

Convocando um Ano Santo em memória do Concílio, ele surpreende os opositores, já que apela ao povo chamando-o para atos tradicionais (peregrinação a Roma, indulgências) e, ao mesmo tempo, lhe propõe a novidade do Concílio.

Quem acusa o papa de ignorar a tradição e de pôr muitos atos de descontinuidade em relação aos seus antecessores terá que admitir agora que a iniciativa de maior compromisso organizativo e celebrativo, dentre aquelas que esse papa tomou até hoje, é totalmente tradicional.

Ao mesmo tempo, ficará claro para todos que um ano de reevocação do Vaticano II irá configurar uma valorização generalizada e capilar daquele patrimônio que, até hoje, nunca tinha sido tentada por nenhum dos antecessores.

Os precedentes de João Paulo II

Dois anos depois da conclusão daquele Jubileu, chegou o papa polonês, que tinha uma verdadeira paixão pelos Anos Santos e celebrou dois: um que chamou de "Ano Santo extraordinário da Redenção", em 1983 (no título, havia uma referência ao 50º aniversário do Ano Santo extraordinário da Redenção que Pio XI tinha convocado em 1933, com referência aos 33 anos de Cristo), e outro, no ano 2000, que ele qualificou como "Grande Jubileu", com referência à passagem do milênio.

O resultado numérico do Grande Jubileu foi incomparável em relação a todos os anteriores. Segundo a estimativa da Agência Romana para o Jubileu, o número total de chegadas em Roma durante aquele Ano Santo foi de 24,5 milhões de peregrinos, enquanto o Censis estimou em 32 milhões o total das chegadas.

Afirmou-se que apenas a peregrinação dos jovens (também chamada de Jornada Mundial da Juventude de Tor Vergata) tinha trazido para Roma dois milhões de pessoas.

As exceções

Os jubileus ordinários foram realizados inicialmente a cada 50 anos (1300: Bonifácio VIII; 1350: Clemente VI: 1400: Bonifácio IX); mas, a partir de Martinho V, que convocou um para 1423, a periodicidade caiu para os 25 anos, e houve celebrações regulares em 1450, em 1475 e assim por diante, até 1775.

Não foi realizado o Jubileu em 1800 por causa dos eventos napoleônicos (Pio VI prisioneiro na França até a sua morte, em 1799; Pio VII eleito em Veneza, em março de 1800) e, novamente, pulou-se o evento de 1850, por causa da fuga do papa para Gaeta em 1849.

Foram regulares também todas as outras celebrações dos 25 anos até o ano 2000. Além dos dois Jubileus extraordinários da Redenção, lembrados acima, foram realizados Anos Santos – que não fossem aniversários de 50 ou 25 anos – apenas em 1390 e em 1423.

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