04 Outubro 2021
“Operação de fachada? Bem, depende de como você olha para isso...” O arcebispo Ilario Antoniazzi, à frente da arquidiocese católica de Túnis, não parece compartilhar os comentários e as análises de sinal contrário que, na mídia ocidental, tendem a enfatizar demasiadamente ou a rebaixar como mera operação de imagem a escolha do presidente tunisiano, Kaïs Saïed, de nomear a professora Najla Bouden Romdhane como chefe do novo governo, a primeira mulher chamada para liderar a equipe de governo em um país árabe.
A reportagem é de Agência Fides, 01-10-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Em primeiro lugar, assinala o arcebispo em conversa com a Agência Fides, “devemos levar em conta o fato de que aqui na Tunísia as mulheres têm uma relevância na vida social que não se encontra em outros países árabes. Basta pensar que a base da famosa Revolução dos Jasmins foram as mulheres. Em que país árabe o prefeito da capital é uma mulher? Porém, aqui em Túnis e também em cerca de 40 outras cidades tunisinas, há uma mulher prefeita. Além disso, pode ser algo menor, mas, na moeda de 10 dinares, há a efígie de uma mulher, a primeira médica tunisina”.
A Tunísia, mesmo sendo um país pequeno – afirma o arcebispo –, “é um país-piloto para muitas coisas. E, por falar em pilotos, já viajei muitas vezes com companhias aéreas ocidentais e nunca vi mulheres pilotos nos aviões. Mas nos aviões tunisinos é normal encontrar mulheres pilotos ou copilotos”.
À luz de tudo isso – continua Antoniazzi – talvez seja excessiva a repercussão provocada pela mídia internacional ao alto cargo político recebido pela professora tunisiana. Mas também são inapropriadas as tentativas de reduzir a escolha política feita pelo presidente tunisino a pura operação de imagem.
É verdade, reconhece o arcebispo de Túnis, “que talvez Saïed precisasse de alguma ‘vitamina’ para reavivar o consenso em relação a ele, após este período de vácuo político e institucional, no qual começavam a crescer as críticas que o acusavam de autoritarismo. Mas me parece equivocado reduzir a sua escolha a uma simples operação de fachada”, visto que a nomeação de Najla como chefe do governo nacional “poderá ser um desafio para o próprio presidente”.
No fim de julho, Kaïs Saïed tinha “suspendido” o Parlamento, derrubado o governo e assumido plenos poderes, acusando os dirigentes das forças políticas dominantes de terem levado o país à ruína. “Continuo pensando”, acrescenta Dom Antoniazzi, “que o presidente mostrou coragem ao mandar embora tantos corruptos que roubavam recursos sem fazer nada pela Tunísia. Nem todos concordam com ele, mas, na minha opinião, a maioria da população ainda o apoia. Manifestações de apoio e contra o presidente se alternam a cada semana. Entre os contrários, estão os partidos islamistas. Mas me parece evidente que a maioria continua dos cidadãos continua o apoiando. Agora, só o tempo poderá nos dizer se essa experiência da nomeação de uma mulher como chefe de governo em um país árabe poderá ser uma experiência positiva e inovadora para reconhecer e afirmar o papel das mulheres não só na sociedade tunisiana, mas também nos países árabes e em toda a comunidade internacional.”
Najla Bouden Romdhane, nascida em 1958 em Kairouan, é engenheira geóloga e professora de Engenharia Sísmica na Escola Nacional de Engenharia de Túnis. Romdhane é doutora em Geologia pela Paris School of Mines, pesquisando engenharia sísmica. Em 2011, foi nomeada diretora geral responsável pela Qualidade do Ministério da Educação Superior e Pesquisa Científica.
Antes de ser nomeada chefe do governo tunisiano, Najla Bouden Romdhane era coordenadora do programa junto ao Banco Mundial como funcionária interna de projetos e no Ministério da Educação Superior e Pesquisa Científica.
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Tunísia. Nomeação de mulher como primeira-ministra não é apenas “operação de fachada”, afirma arcebispo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU