Bolsonaro e o senador americano cunhado de traficante condenado

Foto: Tânia Rêgo | Agência Brasil

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24 Outubro 2018

Jair Bolsonaro é um fã desprezado por Donald Trump, mas não desiste de tentar pontes com a Casa Branca. Um de seus elos no Tio Sam é o senador Marco Rubio, da Flórida. Rubio tem afinidades com o brasileiro: armamentismo, sionismo e antivenezuelanismo. E tem um cunhado que é uma fera: um traficante de cocaína que cumpriu pena de mais de 20 anos de cadeia.

A reportagem é de André Barrocal, publicada por CartaCapital, 24-10-2018.

Em agosto, um dos filhos de Bolsonaro, Eduardo, foi aos EUA e reuniu-se com assessores de Rubio. Ele até botou uma foto no Twitter a respeito. Foi nessa mesma viagem que Eduardo encontrou Steve Bannon, o principal estrategista da vitoriosa campanha de Trump em 2016.

Uma semana depois, um jornal digital em espanhol, o Los Angeles Press, fundado para defender direitos humanos por uma escritora e jornalista mexicana, Guadalupe Lizárraga, publicou um artigo sobre Bolsonaro e Rubio.

Segundo o jornalista e filósofo mexicano Luis Alberto Rodriguez, o senador americano “financia e apoia as aspirações do político carioca”. Waldir Ferraz, um homem de confiança do tipo “faz-tudo” do presidenciável do PSL, viajaria com frequência a Miami, a capital da Flórida, para “receber dinheiro e instruções de Rubio”.

O próprio candidato teria tido um encontro secreto com o senador em março, “quando eles almoçaram na casa de Rubio e ficaram conversando por quatro horas, em particular”. A pedido do anfitrião, não teria havido fotos e comentários públicos do almoço.

Marco Rubio nasceu em 1961, filho de cubanos que tinham deixado a ilha caribenha em 1956, três anos antes da Revolução de Fidel Castro. Sua irmã Barbara é casada com outro imigrante cubano, Orlando Cicilia. Este foi personagem de um dos maiores narcoescândalos de Miami na década dos 1980.

Preso na Operação Cobra, Cicilia foi acusado à Justiça como alguém que “recebeu, possuiu, armazenou e distribuiu quantidades de cocaína para e em nome” da quadrilha. Sua história foi ressuscitada pelo Washington Post no fim de 2015, época em que Rubio preparava-se para disputar com Trump a vaga à sucessão do democrata Barack Obama, em 2016.

A carreira política de Rubio começou no ano da soltura de Cicilia. Elegeu-se deputado estadual na Florida em 2000. Em julho de 2002, enviou uma carta à Divisão de Imóveis do estado com um pedido: que o cunhado fosse aceito como corretor de imóveis oficial. Disse que o conhecia há 25 anos, sem mencionar parentesco.

O Post divulgou a carta na web. Para o jornal, a missiva “oferece um vislumbre de Rubio usando seu crescente poder político para ajudar seu problemático cunhado e fornece novos insights sobre como o jovem legislador entrelaçou suas vidas pessoais e políticas”.

Em uma outra reportagem, o jornal relatou que Cicilia e Barbara moram hoje na casa em que Rubio passou a infância. Que o senador se recusou a responder a perguntas.

Não faltam motivos para Rubio e Bolsonaro marcharem juntos.

Em fevereiro, uma escola na cidade de Parkland, na Flórida, foi alvo de um dos dez maiores tiroteios da história recente nos EUA. Com um rifle AR-15, um ex-aluno matou 17 pessoas e feriu 14. Houve polêmica sobre proibir a venda de armas na Flórida, e Rubio ficou contra.

A CNN lembrou que, ao disputar ao Senado em 2010, Rubio recebeu 9,9 mil dólares da Associação Nacional do Rifle. Seria bom para os negócios dos seus financiadores se o Brasil facilitasse o armamento popular, como quer Bolsonaro.

Rubio sataniza a Venezuela. Em agosto, defendeu intervenção militar para derrubar o governo de Nicolás Maduro, pois este “se tornou uma ameaça para a região e até mesmo para os Estados Unidos”.

Em setembro, ele e mais dois senadores escreveram a Mike Pompeo, secretário de Estado americano, a cobrar que a Venezuela seja considerada “Estado patrocinador de terrorismo”.

Como o país é uma paranoia bolsonarista, não dá para descartar uma guerra por lá em um governo Bolsonaro.

Rubio é um dos maiores lobistas pró-Israel no Congresso americano. E, como no caso das armas, há grana por trás.

Em agosto, o Senado de lá aprovou uma lei proposta em março por ele e por um colega, Chris Coons, do Partido Dermocrata, para os EUA reforçarem o apoio à defesa de Israel. Repasse de 3 bilhões de dólares anuais até 2028, permissão para reservas do FED, o Banco Central americano, serem usadas por Israel como garantia de empréstimos estrangeiros, facilitação da venda de armas para Israel em caso de conflito com o Irã, o Hamas e o Hezbollah e por aí vai.

Em janeiro de 2017, Rubio havia proposto uma lei para proibir os EUA de financiarem organismos internacionais que o senador considera disseminadores de “antisemitismo”, como a ONU.

Empresários judeus poderosos financiam Rubio.

Em outubro de 2015, o jornal online The Times of Israel, fundado em 2012 em Jerusalém, publicou que o bilionário do setor automobilístico Norman Braman, ex-presidente da Federação Judaica da Grande Miami, “não é apenas o maior patrocinador da campanha presidencial de Rubio”, como “também ajudou a financiar a agenda legislativa do jovem senador”, empregou Rubio como advogado e a esposa dele como assessora filantrópica, ajudou Rubio com suas finanças pessoais e viajou juntamente com ele para Israel em 2010, logo após o senador se eleger para o cargo atual.

Outro financiador de Rubio, segundo o jornal, é um magnata dos cassinos em Las Vegas, Sheldon Adelson. Dono de uma fortuna estimada em 30 bilhões de dólares, Adelson injetou entre 100 milhões e 150 milhões de dólares em candidatos do Partido Republicano na eleição de 2012.

Em junho deste ano, o jornal britânico The Guardian publicou descreveu Adelson como aquele que dá as cartas na política de Trump para o Oriente Médio. Uma autoridade do governo Temer jura que Adelson colabora com a campanha de Bolsonaro, através de empresários judeus brasileiros.

Meyer Negri, da empreiteira Tecnisa, José Issac Peres, da rede de shoppings Multiplan, e Fabio Wajngarten, de uma empresa de pesquisas na web, são alguns dos que apoiam o ex-capitão.

Wajngarten organizou um café da manhã de Bolsonaro com empresários em agosto, em São Paulo, e hoje é cotado para ministro da Comunicação Social em um governo Bolsonaro. Peres doou 30 mil à candidatura de Flavio Bolsonaro ao Senado pelo Rio.

Bolsonaro cultiva laços com Israel. Em 2016, foi para lá ser batizado no Rio Jordão. A declaração sobre o peso em “arrobas” dos “afrodescendentes”, que lhe custou uma acusação da PGR por racismo, foi dada no Clube Hebraica, no Rio, em 2017.

A convergência dos evangélicos do “bispo” Edir Macedo, apoiador de Bolsonaro, com o judaísmo ajuda o presidenciável. No início de 2018, o embaixador de Israel no Brasil, Yossi Shelley, esteve com o “bispo” no Templo de Salomão, a maior igreja do Brasil, sede da religião de Macedo.

Bolsonaro apoia a mudança da capital de Israel de Tel-Aviv para Jerusalém, uma ideia antiga do sionismo encampada por Trump em dezembro de 2017. Na época, o deputado do PSL disse: “Eu quero mandar um abraço para o Trump pela sua decisão”.

Os países árabes estão apavorados. Temem que um governo Bolsonaro mude a embaixada brasileira para Jerusalém e que isso leve outras nações sul-americanas a fazerem o mesmo.

Várias embaixadas árabes em Brasília tentaram falar com alguém do time bolsonarista nos últimos tempos, mas em vão. Elas sopram que haverá retaliação, como o fim da compra de carne brasileira. O recado, segundo a reportagem soube, chegou ao vice de Bolsonaro, o general Antonio Hamilton Mourão.

O Oriente Médio não é um mercado desprezível para o Brasil. As exportações para lá em 2017 foram de 11 bilhões de dólares em 2017 e de 10 bilhões até setembro.

A eventual mudança da embaixada brasileira em Israel não é o único motivo de irritação árabe. Bolsonaro planeja expulsar a embaixada da Palestina de Brasília, como disse em 7 de agosto: “A Palestina não sendo país, não teria embaixada aqui.”

O posto foi inaugurado em fevereiro de 2016, no governo Dilma Rousseff, em terreno doado em 2010, último da gestão Lula.

Foi um passo a mais em posições diplomáticas históricas do Brasil, de reconhecer a Palestina como país e de apoio à solução de “dois Estados” para o conflito na região.

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