Georg Ratzinger: “Eu não tinha percebido que havia abusos sexuais”

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21 Julho 2017

Foi o que declarou o irmão de Bento XVI quando foi ouvido o seu testemunho durante a investigação realizada pela diocese de Regensburg, na Alemanha.

A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada por Vatican Insider, 20-07-2017. A tradução é de André Langer.

“Eu não tinha percebido que havia abusos de caráter sexual”. Foi o que declarou Georg Ratzinger, o irmão do Papa emérito Bento XVI, quando deu seu testemunho durante a investigação sobre os abusos perpetrados contra os pequenos cantores do Duomo de Regensburg desde logo depois da Segunda Guerra Mundial até os primeiros anos da década de 1990. Foi a própria diocese, a própria Igreja católica, que promoveu e financiou uma investigação independente que, entre outras coisas, também ofereceu a possibilidade para que as vítimas contassem o que aconteceu de maneira sigilosa. O Estado alemão não poderia ocupar-se de crimes que já prescreveram.

O resultado foi um sólido relatório de 440 páginas que foi apresentado pelo advogado Ulrich Weber e que, como se sabe, trouxe à tona números horripilantes: 547 crianças sofreram abusos e 67 delas sofreram abusos sexuais. Os nomes dos responsáveis, alguns dos quais já faleceram, eram bem conhecidos. Estes fatos não podem ser minimizados, nem mesmo se considerarmos que durante décadas os castigos corporais eram bastante normais em todas as escolas do país.

Os testemunhos de algumas das vítimas são estarrecedores, pois fazem referência tanto a “meios de correção” como a maus-tratos que beiravam o sadismo e verdadeiros abusos sexuais repetidos, que se teriam verificado na escola e na residência onde se alojavam os “passarinhos do Duomo”. Eles descreveram espancamentos por parte dos próprios sujeitos que abusavam sexualmente deles. Por esta razão, o advogado Weber levantou a hipótese de que os abusadores se excitavam batendo nos meninos.

Como e por que monsenhor Georg Ratzinger, que agora tem 93 anos, tem a ver com tudo isso? O irmão de Bento XVI dirigiu o coro durante 30 anos, de 1964 até 1994. Segundo se deduz do relatório, embora por questões de privacidade não seja tão explícito, os abusos sexuais mais graves teriam acontecido durante os anos 1950, quando ele ainda não era o diretor do coral. Durante os 30 anos de atividade no coro, monsenhor Georg admitiu ter dado algum tapa nos meninos e pediu perdão por isso há sete anos. Mas nunca foi acusado, nem de longe, de ter abusado de forma alguma dos “passarinhos” do Duomo. Ele foi envolvido porque alguém disse que tinha falado com ele sobre tudo o que acontecia na escola.

Os nomes não são completos, mas é evidente que quando no relatório se fala sobre o “diretor do coro R.”, refere-se ao irmão do Papa emérito. Nestas páginas sustenta-se que monsenhor Georg poderia ter feito uma investigação e ter contribuído para que os culpados fossem identificados e entregues à Justiça há muitos anos. Afirma-se (na página 381 do relatório) que Ratzinger estava “um pouco fechado em seu interesse pelos aspectos musicais” e que quando tomou conhecimento destes rumores os menosprezou. Georg Ratzinger teria tomado conhecimento através de algumas notícias em 1969, depois em 1978 e finalmente em 1989. No relatório observa-se que “não há” nenhum pedido a pessoas de renome com as quais Georg estava em contato, uma alusão ao seu irmão, arcebispo e cardeal, e ao bispo de Regensburg.

Em outra página do relatório (380, nota 2495) confirma-se que o irmão do Papa emérito deu seu testemunho. Georg declarou nessa ocasião que tomou conhecimento de abusos como “meios de correção”, mas não de abusos sexuais. “Eu não tinha percebido que havia abusos de caráter sexual”. E o mesmo indicou em algumas entrevistas publicadas em 2010.

Algumas vítimas destacam que Ratzinger “interessava-se apenas pela música”, mas “outras vítimas dizem claramente que R. foi comunicado sobre os episódios de violência e criticam que não agiu” (p. 378). A palavra “violência” pode se referir tanto a violência física como a violência sexual. O advogado Weber acredita que R. interpretou os fatos como “violência física” e confirma o que havia declarado o irmão do Papa emérito.

Mas também faz notar que R., ao ser entrevistado, confirmou que “lhe haviam referido como o diretor da residência L. tocava os meninos, inclusive depois de ter-lhes baixado as calças. No entanto, não percebeu bem que se tratava de violências sexuais” (p. 380). O advogado considera que “R., em geral, não era o contato preferido (dos meninos, ndr.) para falar sobre as violências sexuais devido ao seu caráter” (p. 380), e uma vítima afirma que era “impensável” falar de sexo com ele por causa do seu caráter puritano (p. 381).

“Tendo acompanhado, inclusive na qualidade de especialista, diferentes processos sobre casos de pederastia – explicou ao La Stampa o sociólogo Massimo Introvigne –, não me parece surpreendente que, ao recordar os fatos ocorridos em alguns casos há 50 anos, as vítimas de monsenhor Ratzinger tenham lembranças diferentes. Não significa que algum deles minta: não só a memória é seletiva e é influenciada pelas emoções, mas o que (e muito mais nos anos 60) um menino podia contar não tinha a precisão de uma denúncia em uma causa perante um tribunal. Os meninos poderiam ter feito alusões mais ou menos precisas, as mesmas que Georg Ratzinger interpretou como referindo-se a simples maus-tratos e não a abusos de natureza sexual”.

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