Olhares sobre uma possível (re)invenção política no Brasil. Algumas análises

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Por: Ricardo Machado | Edição: Patricia Fachin | 06 Setembro 2018

Uma das dificuldades que impede a renovação e a (re)invenção da política brasileira é a própria organização do sistema político, que é “oligárquico” e dificulta a “participação cidadã e o engajamento político”, diz Roberto Andrés à IHU On-Line na entrevista a seguir, concedida pessoalmente durante sua participação no 4º Ciclo de Estudos – A reinvenção da política no Brasil contemporâneo. Limites e perspectivas realizado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU na última terça-feira, 04-09-2018. Juntamente com Andrés, participaram do evento Rosana Pinheiro-Machado, Moysés Pinto Neto e Henrique Parra.

Convidados por IHU On-Line, os palestrantes concederam a entrevista a seguir, na qual comentam a sensação de esgotamento político no país, o cenário eleitoral e as perspectivas de futuro para 2019. Para Rosana Pinheiro-Machado, o futuro político do Brasil depende de “barrar o conservadorismo em todo o território nacional”.

Henrique Parra aposta na “reorganização” e no fortalecimento de iniciativas do presente que já estão praticando outros modelos de vida. “Como um futuro positivo vejo a possibilidade de fortalecer essas iniciativas, que podem funcionar como linhas de fuga”, diz.

Moysés Pinto Neto adverte que “não existe alternativa fácil para solucionar os problemas” do país, mas é preciso “trabalhar na direção de afirmar a complexidade das questões e buscar, errando, a solução delas”.

Rosana Pinheiro-Machado | Foto: Ricardo Machado - IHU

Rosana Pinheiro-Machado é graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e doutora em Antropologia Social pela mesma universidade. Foi professora de Desenvolvimento Internacional na Universidade de Oxford de 2013 a 2016; atualmente é professora titular visitante da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM no PPG de Ciências Sociais e coordenadora e cofundadora da Escola de Governo Comum.

Roberto Andrés | Foto: Ricardo Machado - IHU

Roberto Rolim Andrés é professor na Escola de Arquitetura e Urbanismo da UFMG e doutorando em História das Cidades na FAU-USP. É editor da revista Piseagrama, pesquisador do grupo Cosmópolis e escreve quinzenalmente sobre cidades no jornal O Tempo. É revisor do Journal of Public Spaces e membro da Rede de Inovação Política da América Latina. Foi pesquisador da Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais e sócio fundador do Instituto Maria Helena Andrés. Foi cofundador da plataforma bim.bon e da startup Hometeka, ambas voltadas para especificação e simplificação de processos em arquitetura e design.

Moysés Pinto Neto | Foto: Ricardo Machado - IHU

Moysés Pinto Neto é graduado em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, mestre em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS e doutor em Filosofia nessa mesma instituição. Leciona no Programa de Pós-Graduação em Educação – ULBRA e no curso de Direito da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA Canoas.

É autor, entre outros, do artigo Identidade de Esquerda ou Pragmatismo Radical?, publicado na edição nº 259 de Cadernos IHU ideias, e do artigo Esquecer o neoliberalismo: aceleracionismo como terceiro espírito do capitalismo, publicado na edição nº 245 de Cadernos IHU ideias.

Henrique Parra | Foto: Ricardo Machado - IHU

Henrique Z. Parra é graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo – USP, mestre em Sociologia pela mesma universidade e doutor em Educação pela Universidade de Campinas – Unicamp. É professor no Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp. Fez três pós-doutorados. Um na Espanha, no Centro de Ciencias Humanas y Sociales del Consejo. E outros dois no Brasil, um no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia e outro no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UFRJ.

Confira a entrevista.

IHU On-Line — Quais são as principais travas que interrompem a reinvenção política do Brasil?

Rosana Pinheiro-Machado — Essa é uma pergunta extremamente complexa porque o sistema político, evidentemente, possui raízes muito profundas e antigas. A primeira delas é o próprio processo democrático no sentido de Estado democrático de direito que, no Brasil, sempre ocorreu para muito poucos. Então, quando pensamos na larga maioria da população brasileira, que está sujeita a um sistema educacional precário e ao oferecimento de bens públicos precários, vemos que essa é a principal trava. Uma grande parte da população vive dentro de um sistema que é muito pouco cosmopolita, que oferece pouco pensamento crítico e um pensamento libertador.

Nós somos o país de Paulo Freire, que é modelo de educação para as melhores universidades do mundo, mas que é muito pouco aplicado dentro do sistema de educação brasileiro. Por que falo isso como primeiro componente? Porque não tem como renovar um sistema político, a partir da criação de uma nova política, sem começar com um novo sistema de educação, desde a juventude, que seja voltado para a liberdade e para o pensamento crítico.

Uma democracia que nunca existiu nas periferias brasileiras faz com que boa parte da população brasileira tenda a ficar arraigada em discursos autoritários, populistas e que prometem soluções imediatas para problemas muito complexos. Portanto, temos o problema do eleitorado e da maneira de como pensar o processo político que, ao não ser pensado dentro de uma perspectiva crítica de pensamento de propostas, é pensado a partir de uma lógica clientelista e autoritária.

A segunda questão é a das elites que governam o Brasil, que têm o monopólio da estrutura partidária, como a bancada ruralista, a bancada da bala, o poderio econômico das grandes oligarquias brasileiras, das grandes famílias, que não se renovam — as pesquisas já estão mostrando que a renovação do Congresso será mínima. Por exemplo, hoje vemos filhos de políticos que estão se candidatando como representantes da nova política, ou seja, toda a velha política está se apresentando como “a nova política”. O próprio Jair Bolsonaro é a encarnação do novo, mas ao mesmo tempo tem 27 anos de mandato.

A terceira questão diz respeito a um aspecto amplo do funcionamento partidário tanto à direita quanto à esquerda: como o fundo partidário é distribuído? O fundo partidário está sendo distribuído para as mulheres negras candidatas? A maior mensagem que temos hoje é a da morte de Marielle Franco. Os partidos de esquerda estão passando o fundo partidário para os candidatos negros e candidatas negras? A própria estrutura partidária pensa a partir de um formato específico de fazer política, de eleger seus candidatos e manter seus gabinetes, o que contribui muito pouco para pensar soluções cosmopolitas para os problemas de uma maneira mais ampla, para além de uma estrutura partidária engessada.

Roberto Rolim Andrés — Existem algumas travas: o Brasil é um país que tem dimensões continentais, muitas desigualdades, e a participação cidadã e o engajamento político é algo muito complicado. Mas temos também um sistema que é oligárquico na estruturação do seu próprio sistema, e os partidos políticos funcionam como uma barreira de entrada que exclui a população do jogo institucional. Temos uma barreira de entrada muito grande: para criar um partido é preciso ter 500 mil assinaturas e para participar do jogo democrático é preciso estar filiado a um partido político. Isso é diferente em outros países que permitem candidaturas cívicas para se candidatar numa eleição, e a criação de partidos é muito mais simples também. Então temos uma sociedade desigual por causa da história escravocrata e desigual.

Moysés Pinto Neto — A principal trava é a fragilidade da democracia em dois sentidos. Num sentido mais geral, hoje vemos que a nossa democracia é tão frágil, que tememos pelo futuro dela. E aí é preciso recuar em determinadas pautas políticas para coisas que acreditávamos que não precisaríamos mais defender e isso faz com que percamos um imenso tempo no qual poderíamos estar debatendo coisas mais importantes. A segunda trava é no sentido de que é necessário que as instituições sejam mais permeáveis pelo debate democrático; falta horizontalidade, falta uma série de coisas que possibilitariam fazer mais rápido esse movimento.

Henrique Parra — Estamos com uma sensação de um certo esgotamento, e um dos grandes impactos desse cenário político atual é ter atuado num campo da esperança. Este talvez seja um elemento novo: como podemos nos recompor diante de um quadro de ataque que parece estar tentando atuar num campo de desmobilização política muito grande? Outra dificuldade é esse processo de polarização novo, que demonstra que há um esgarçamento do tecido social, que tem dificuldade de criar formas de vida comuns.

A questão é como não iremos nos contaminar com uma certa melancolia que está se espraiando e ao mesmo tempo recompor as energias de criação e resistência. No fundo a urgência é não se deixar abater. Estamos num momento de suspensão em que não conseguimos nos desapegar de uma situação anterior que desmoronou e, ao mesmo tempo, tem uma coisa nova se constituindo, mas não conseguimos reconhecer esses elementos novos que estão se constituindo. Essa é uma grande dificuldade. Talvez, se nos colocarmos numa posição em que reconheçamos isso, seja possível saltar e romper esse bloqueio da imaginação e da prática política.

IHU On-Line — Como deve se desenrolar o pleito de 2018?

Rosana Pinheiro-Machado — Eu tenho duas grandes apostas, mas primeiro é preciso esperar qual será o efeito da propaganda de TV. Tem muitas apostas do quanto a TV será determinante ou não. Estou muito convicta de que não sabemos ainda o papel do tempo de televisão nessas eleições, e que essa eleição será definidora. Se Bolsonaro for para o segundo turno — e tem grande chance de ir — com o tempo reduzido de televisão, isso significa que teremos uma eleição, pela primeira vez, muito baseada nas redes sociais. Com isso, hoje, temos duas grandes questões. Uma é quanto Lula conseguirá transferir seus votos para [Fernando] Haddad — tem perspectivas que vão desde 7% até pesquisas que mostram transferência de até 40%; nesse caso, se os números se confirmarem, Haddad estará no segundo turno.

Agora, partindo desse princípio e achando que a transferência de votos será muito grande, porque a expressão dos votos para Lula é muito grande, a questão central é quem ocupará o segundo lugar no segundo turno: será o candidato da Internet ou será [Geraldo] Alckmin, que tem uma propaganda eleitoral muito bem-feita e como muito tempo de TV? O nome dele agora começará a se consolidar e chegará ao afunilamento. Ao mesmo tempo, as pessoas começam a ter medo desse novo, que é o Jair Bolsonaro, mesmo para quem vota nele como extremista.

Então, estamos neste momento de saber, precisamente, quantos votos Lula irá transferir — e acredito que vai transferir uma grande parte, mas mesmo transferindo pouco será o suficiente, porque temos uma eleição em que qualquer percentual próximo a 15% joga a pessoa no segundo turno, isto é, há uma grande chance de Haddad estar no segundo turno.

Roberto Rolim Andrés — Vivemos aquele momento chamado de interregno: um ciclo se esgotou e outro ainda não nasceu. Junho de 2013 é um momento em que isso se demarca. Mas, de outro lado, o ciclo que se esgota não termina, ele só perdeu a sua capacidade de organizar a sociedade em torno dele. Então, vivemos nas eleições presidenciais uma luta entre o ciclo que se esgotou, representado pela polarização entre PT e PSDB, e o vácuo gerado pelo fato de ele não dominar mais a cena. Esse vácuo tem sido aproveitado por pessoas pouco democráticas, como Jair Bolsonaro.

Nas eleições legislativas esse ciclo novo está se apresentando, mas de uma maneira pequena em relação ao que precisaria. Existem movimentações como a das MUITAS em Belo Horizonte, a Talíria Petrone [1], a Sâmia Bomfim [2], o Ivan Moraes [3] e o Marquito [4], que foram figuras que em 2016 vieram da cidadania e se elegeram vereadores com expressividade no PSOL, na Rede e em outros partidos. Essas pessoas se multiplicaram e algumas centenas de candidatos estão de fora da política e disputando as eleições proporcionais com poucos recursos, num sistema partidário que privilegiou as elites partidárias e num sistema eleitoral em que o voto atinge um distrito, um território muito grande. Então é muito caro participar da disputa eleitoral e, nesse sentido, essa é uma eleição muito mais difícil de renovar. Vivemos uma situação diferente daquela da Espanha, em que o Podemos recebeu 20% dos votos. Isso não vai acontecer aqui. Mas tem a força da sociedade se colocando nos pleitos proporcionais e esse novo que precisa surgir está se apresentando, apesar de todas as dificuldades que o sistema coloca.

Moysés Pinto Neto — É muito difícil avaliar, porque esse é o pleito mais disputado desde 1989. É a primeira vez que temos vários candidatos competitivos ao mesmo tempo e uma total incerteza. Acho que existe uma grande oportunidade de Bolsonaro estar no segundo turno, embora eu deseje que isso não aconteça. Ao mesmo tempo, ele vai sofrer uma campanha forte de ataques e vamos ver se vai sobreviver a eles. Alckmin é o candidato do establishment e isso o torna mais fraco, porque as pessoas estão descontentes com o modo como as coisas estão colocadas. Agora, se ele subir nas intenções de voto, com certeza será tirando votos de Bolsonaro.

Depois temos o outro lado. Alguns colocam Marina à direita, mas a rigor isso não importa, porque de qualquer maneira ela vai estar no outro lado, seja contra Alckmin ou Bolsonaro, sendo uma alternativa moderada que pode herdar indecisos. Ela tem um piso eleitoral interessante, ou seja, nunca baixou de 11 ou 12%, o que é um percentual interessante quando o líder tem 19%. Tem o Ciro Gomes, que prometia muito no sentido de que estava fazendo movimentos políticos arrojados, fazendo negociações amplas, mas acabou fracassando na negociação com o centrão, a qual era uma negociação utilitarista para conseguir tempo de TV. Embora ele tenha ficado isolado, ao mesmo tempo é visto como uma pessoa com bastante preparo, e tem uma proposta atrativa: a questão do SPC, que pode conquistar votos. Por fim, tem o Haddad, que é uma incógnita. Lula não será candidato — desculpa dizer isso para quem não sabe. De todo modo, é muito incerto se Haddad vai conseguir incorporar os votos de Lula; se conseguir, estará no segundo turno. Agora, se essa transferência vai acontecer, é uma grande incógnita.

Henrique Parra — Estamos numa situação eleitoral que é dramática, para não dizer catastrófica. Há um esforço de composição num cenário em que temos um ex-presidente da República que teve seus direitos políticos suspensos. Só isso já cria uma situação de crise de legitimidade desse processo político. Ao mesmo tempo em que temos que fazer a defesa do governo Lula, isso tem um efeito de bloqueio da possibilidade de reinvenção que estava nascendo. Isso está desenhando nosso campo, somado a esse processo de polarização que cria um campo de incerteza e de dificuldade de previsibilidade muito grande. Tenho muita incerteza sobre o cenário eleitoral, mas é preciso fortalecer as iniciativas que já estão em curso de produção de outras formas de atuação política e de relação com o Estado. São essas iniciativas que, agora e depois das eleições, teremos que nutrir com mais força. O cenário pós-eleitoral pode ser mais catastrófico do que estamos vivendo agora e por isso é preciso criar campos de resistência para irem se retroalimentando, e criar um cenário mais favorável futuramente. Mas agora vejo o cenário eleitoral com muita preocupação.

IHU On-Line — Em termos políticos e econômicos, quais perspectivas de futuro nós temos diante da atual conjuntura?

Rosana Pinheiro-Machado — Isso depende de se vai ganhar um projeto mais popular, de centro, e se ele vai conseguir debater questões fundamentais, barrar o conservadorismo e levar adiante temas como a descriminalização do aborto, das drogas, barrar o projeto escola sem partido. Essa seria uma vitória do centro ou da esquerda ou mesmo de uma direita que não seja tão conservadora. O desafio político hoje é barrar o conservadorismo em todo o território nacional.

Economicamente existem duas disputas: uma por mais austeridade, e outra para barrar a PEC do gasto, ou seja, combater uma agenda de austeridade. O grande desafio é continuar as propostas de inclusão das minorias no ensino superior, mas não apenas garantindo o acesso como foi no período lulista, e sim pensar o acesso de maneira mais democrática e inclusiva, pensando em políticas que vão além da distribuição de renda e num modelo econômico que vá além do desenvolvimentismo baseado numa agenda neoliberal. A margem disso tem sido muito pequena em todos os governos, porque a lógica neoliberal estrangula todos os governos.

Também é preciso investir em ciência e tecnologia para que se possa avançar para outro tipo de desenvolvimento que não seja somente baseado no agronegócio. Nós sabemos o que acontece quando há uma crise internacional: a primeira crise o Brasil venceu com a marolinha, mas cinco anos depois pagou o preço da crise. É preciso sair disso, mas não há como sair desse cenário sem investir em ciência e tecnologia.

Roberto Rolim Andrés — Tenho pensado no que Bolsonaro disse nesta semana: “Vamos metralhar todos os petralhas”, e o público no Acre aplaudiu essa declaração. Não sei o que vai acontecer. Muita gente achava, inclusive editoriais de revistas e jornais na Alemanha diziam que o Hitler jamais iria fazer o que fez com os judeus, que aquilo era bravata, mas deu no que deu. Não estou querendo ser um terrorista que está julgando, mas não temos um cenário de futuro. O cenário de futuro em relação ao velho que está morrendo é a sobrevivência. É uma sobrevivência para escaparmos de uma possibilidade antidemocrática e totalitária que está batendo à porta, enquanto se faz com que o novo de fato consiga ganhar pernas e possa participar com mais contundência do jogo maior. Este ano, nas eleições presidenciais, a saída é sobreviver.

Moysés Pinto Neto — Estamos num péssimo momento, no qual parece que a prioridade é estancar a crise. Todo mundo está mais focado em ver como isso será possível no presente. Eu destacaria duas coisas como importantes. A primeira é saber que não existe alternativa fácil para solucionar os problemas. Por exemplo, amadurecemos bastante quando o [Guilherme] Boulos, que representa a esquerda mais à esquerda, deixou de colocar a auditoria da dívida pública como a sua principal pauta econômica. O fato de a Laura Carvalho ter contribuído para a campanha dele e ter dito que isso não fará uma grande diferença, já é um processo de amadurecimento. Ao mesmo tempo temos, por outro lado, a direita sendo representada por Bolsonaro no seu nível mais infantil e imbecil, já que a candidatura dele é uma negação de toda a complexidade.

Temos que trabalhar na direção de afirmar a complexidade das questões e buscar, errando, a solução delas, ou seja, buscar perceber que é um processo de errância, mas que temos que nos aprofundar nele. De outro lado, temos que tentar enxergar um futuro que, a meu ver, passa por duas coisas que o Brasil precisa recuperar: a ecologia como uma questão central do nosso tempo, já que não existe projeto de futuro que não passe pela Terra — não tem trabalho nem riqueza sem Planeta —, e o aspecto que os povos originários do Brasil podem nos ensinar no sentido de que nunca vamos nos tornar índios, porque não somos índios, mas no sentido de que podemos incorporar, na nossa maneira de viver, a ideia do bem-viver como um projeto para além desse crescimento infinito no qual estamos pautados. Infelizmente isso está um pouco longe do nosso debate atual e estamos mais tentando estancar a crise do que propriamente pensando num futuro melhor do que o presente.

Henrique Parra — Para retomar a discussão que fizemos no seminário em torno da ideia de que não há outro mundo possível, porque o mundo é aqui e agora, desloco a pergunta para pensar como habito esse mundo. É necessário desenvolvermos outras formas de composição com a natureza, com a diversidade e pensar modelos de desenvolvimento que sejam mais distributivos e sustentáveis. Do ponto de vista político, econômico e social é preciso repensar a reorganização de curtíssimo prazo do que seja possível, porque vamos muito rapidamente enfrentar situações de intensificação da crise que estamos vivendo. Vejo o cenário futuro como um cenário de intensificação da crise. O que podemos fazer é fortalecer as iniciativas do presente que já estão praticando outros modelos de vida. Então, como um futuro positivo vejo a possibilidade de fortalecer essas iniciativas, que podem funcionar como linhas de fuga.

Notas:

[1] Talíria Petrone Soares (Niterói, 9 de abril de 1985) é uma professora, socialista, feminista, militante dos direitos LGBT e política brasileira. Atualmente exerce o mandato de vereadora pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) na Câmara Municipal de Niterói, tendo sido a mais votada em 2016. É candidata à deputada federal pelo mesmo partido. (Nota da IHU On-Line)

[2] Sâmia de Souza Bomfim (Presidente Prudente, 22 de agosto de 1989) é uma servidora pública feminista e política brasileira. É formada em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) e servidora pública na mesma universidade. Atualmente exerce o mandato de vereadora pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) na Câmara Municipal de São Paulo, sendo a parlamentar mais jovem a exercer o mandato na capital do estado, aos 27 anos. (Nota da IHU On-Line)

[3] Ivan Moraes: é um jornalista brasileiro e candidato ao cargo de vereador de Recife/PE pelo PSOL. (Nota da IHU On-Line)

[4] Marcos José de Abreu, o Marquito, é natural de Florianópolis, engenheiro agrônomo e mestre em agroecossistemas. Em outubro de 2016 foi o segundo vereador mais votado da cidade de Florianópolis, pelo PSOL. (Nota da IHU On-Line)

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