SUS é mais do que uma política de saúde pública. Entrevista especial com Jairnilson Paim

UTI Pública no Recife | Foto: cremepe.org.br

Por: João Vitor Santos | 11 Agosto 2018

Desde sua criação, o Sistema Único de Saúde - SUS trouxe inúmeros avanços para a saúde pública no Brasil. É o que defende Jairnilson Silva Paim, doutor em Saúde Coletiva. “O SUS dispõe de uma rede de instituições de ensino e pesquisa que interage com os serviços de saúde, possibilitando que um conjunto de pessoas adquiram conhecimentos, habilidades e valores vinculados aos seus princípios e diretrizes”, destaca.

Para o médico, esses avanços revelam o potencial do SUS e sua própria natureza. Afinal, é preciso compreendê-lo como algo muito além de uma política de saúde pública. “O SUS é um sistema público, não um ‘sistema de saúde pública’. A integralidade da atenção supõe a articulação de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde. Com o SUS, buscava-se superar o Tratado das Tordesilhas que separava a saúde pública, confinada no Ministério da Saúde, e a assistência médica prestada pela medicina previdenciária (Inamps) e pelo setor privado”, esclarece.

Segundo Jairnilson, os ataques a que o sistema vem sendo submetido parte justamente dessa lógica de o reduzir a uma política. Por isso defende que se tenha clareza nesse conceito. “Quando os conservadores, os liberais e a mídia misturam o SUS com a saúde pública não o fazem inocentemente: querem limitar o SUS ao controle de doenças e epidemias ou à profilaxia, de modo que a assistência médica fique submetida ao mercado ou, no limite, seja oferecida apenas para os pobres”. Esse erro é tão sério que é cometido até mesmo por setores mais progressistas. “Até mesmo setores de esquerda usam a expressão saúde pública em contraposição à ‘saúde privada’, caindo na armadilha de restringir o SUS conforme a ideologia dominante”, adverte.

Ainda na entrevista, concedida por e-mail à IHU On-Line, o médico observa como essa epidemia de sarampo “é um dos preços pagos pela desestruturação do SUS”. Para ele, o argumento de que as pessoas buscam menos as vacinas porque se baseiam em notícias falsas de redes sociais insuflado por movimentos como o antivacínico não serve para explicar o fenômeno em toda a população. “Será que situações desse tipo, até possíveis de serem observadas na classe média, podem ser generalizadas para o conjunto da população?”, questiona.

Jairnilson Paim | Reprodução Youtube / Outras Palavras

Jairnilson Silva Paim é graduado em Medicina, mestre em Medicina e Saúde e doutor em Saúde Coletiva pela Universidade Federal da Bahia – UFBA. É professor de Política de Saúde do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA e coordenador do Observatório de Análise Política em Saúde. Entre suas publicações estão Reforma Sanitária Brasileira: contribuição para compreensão e crítica (Salvador: Edufba/Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2008), O que é o SUS (Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009), Desafios da Saúde Coletiva no Século XXI (Salvador: Edufba, 2006), Saúde Coletiva: Teoria e Prática (Rio de Janeiro: Medbook, 2013) e a Crise da saúde pública e a utopia da Saúde Coletiva (Salvador: Casa da Qualidade, 2000).

A entrevista foi originalmente publicada nas Notícias do Dia em 11-8-2018.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Há cerca de dois anos, o senhor nos concedeu uma entrevista em que, entre outros pontos, destacava as ameaças que o Sistema Único de Saúde - SUS vinha sofrendo. De lá para cá, o que mudou nesse cenário de ameaças?

Jairnilson Silva Paim – A situação piorou radicalmente, seja pelas ações desastradas na condução do Ministério da Saúde, após o golpe de Estado de 2016, seja pelos efeitos da Emenda Constitucional - EC 95. Naquele ano, fiz inúmeras palestras e entrevistas chamando a atenção para o desmonte do SUS e as possíveis repercussões da PEC 241 da Câmara dos Deputados e da PEC 55 do Senado da República que resultaram na EC 95. Esta congelava por 20 anos o teto de gasto público, comprometendo especialmente a saúde, a educação, a ciência e tecnologia, a segurança pública, o saneamento, entre outros setores.

Analisamos as diversas faces da destruição do SUS, juntamente com o presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva - Abrasco, Gastão Wagner de Souza Campos, e a Profa. Lígia Bahia [1] por iniciativa do Le Monde Diplomatique Brasil e da Plataforma Política Social no Instituto Polis no 7º Seminário Público - Golpe do SUS, sob a mediação de Silvio Bava on line [2]. Ressaltava que, enquanto a população cresce, envelhece e muda o seu perfil epidemiológico com uma tripla carga de doenças e agravos (doenças transmissíveis, doenças crônicas e transtornos mentais, acidentes e violências), o governo federal reduz recursos para o SUS. Chamava a atenção de que, além das mortes, doenças e sofrimentos que seriam produzidos com a quebra da universalidade, isto significava rasgar a Constituição no que diz respeito aos direitos sociais e de saúde e à promoção da cidadania.

Destacava, ainda, que aqueles parlamentares que ocupavam o Congresso Nacional e votavam pela aprovação da PEC 241 e da PEC 55, ameaçando a vida e a saúde de milhões de brasileiros e brasileiras por duas décadas, certamente seriam julgados pela História como perpetradores de um crime de lesa-pátria. Portanto, não foram só os ministros e o governo Temer os responsáveis pelo que constatamos hoje, mas todos os parlamentares que apoiaram a EC 95 e a grande mídia que a defendeu. Hoje, hipocritamente, essa mesma mídia faz de conta que se surpreende com a piora da situação de saúde e, cinicamente, aproveita o colapso dos serviços de saúde para culpar o SUS. Além disso, verificamos retrocessos na Política Nacional de Atenção Básica - Pnab, na política de saúde mental, no repasse de recursos para os municípios, na baixa cobertura vacinal, na mortalidade infantil, na epidemia de sarampo, na ameaça da poliomielite, no crescimento de casos de malária etc.

IHU On-Line – O sistema privado de saúde é a principal ameaça ao SUS atualmente? Por quê?

Jairnilson Silva Paim – Sim, atualmente, a maior ameaça de todas é a privatização da atenção através da financeirização do setor saúde. Pesquisas recentes indicam movimentos do capital no âmbito da saúde que ultrapassam o território nacional, mesmo antes da aprovação da lei que permite a participação do capital estrangeiro na saúde no país. Sob a dominância financeira, o capital corrói as bases do SUS, tornando mais complexa a regulação, bem como a luta em defesa de um sistema de saúde universal como a proposta do SUS.

IHU On-Line – O SUS foi concebido, também, no bojo das discussões geradas com a Reforma Sanitária. Até que ponto o que foi projetado nesse momento sobre o SUS de fato se tornou uma realidade?

Jairnilson Silva Paim – Em 2018, quando se comemora o SUS nos seus 30 anos, vários balanços, análises críticas e debates têm sido realizados, apontando conquistas, inclusive vinculadas ao projeto e ao processo da Reforma Sanitária Brasileira - RSB [3]. Nesse particular, destacaria o número especial da Revista Ciência & Saúde Coletiva lançado no 12º. Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, contando com a participação de mais de 100 pesquisadores brasileiros de todas as regiões do país. Podem ainda ser mencionados o artigo “Trinta anos de Sistema Único de Saúde - SUS: uma transição necessária, mas insuficiente” [4], da Profa. Ligia Bahia, com as críticas de diversos debatedores; a reportagem “30 anos SUS: Os sistemas universais na encruzilhada”, na Revista Poli – Saúde, Educação, Trabalho [5]; e a discussão da mesa-redonda “Desafios e perspectivas do SUS”, no último Abrascão [6].

Em todas essas iniciativas são reconhecidos os avanços do SUS, apesar do subfinanciamento crônico, dos problemas da gestão, da privatização do setor e da sabotagem dos governos. Destacaria o reconhecimento legal do direito à saúde, a descentralização da gestão, o controle social, a ampliação da atenção primária vinculando 60% da população brasileira às equipes de saúde da família e o desenvolvimento da vigilância em saúde. Além disso, o SUS dispõe de uma rede de instituições de ensino e pesquisa que interage com os serviços de saúde, possibilitando que um conjunto de pessoas adquiram conhecimentos, habilidades e valores vinculados aos seus princípios e diretrizes. Um legado de avanços pode ser identificado na realização de transplantes, no Samu e no controle do tabagismo, do HIV/aids e da qualidade do sangue. E o país também avançou no desenvolvimento de sistemas de informação em saúde, importantes para o monitoramento e avaliação, bem como na pesquisa e na avaliação tecnológica em saúde.

IHU On-Line – O SUS também é concebido como algo que vai além da saúde pública. Mas vemos que os investimentos se restringem a ações de saúde, deixando de lado, por exemplo, programas como de ampliação de redes de saneamento. Por que isso ocorre? E quais os desafios para tornar esse um sistema muito maior do que uma política de saúde pública?

Jairnilson Silva Paim – O SUS não é a mesma coisa que saúde pública. O SUS não foi concebido como uma “política de saúde pública”. Não podemos confundir “sistema de saúde pública” com sistema público e universal de saúde. O SUS é um sistema público, não um “sistema de saúde pública”. No art. 197 da Constituição da República, verificamos que as ações e serviços públicos de saúde constituem um sistema único, em cujas diretrizes encontra-se o atendimento integral. Portanto, a integralidade da atenção supõe a articulação de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde. Com o SUS, buscava-se superar o “Tratado das Tordesilhas” que separava a saúde pública, confinada no Ministério da Saúde, e a assistência médica prestada pela medicina previdenciária (Inamps) e pelo setor privado.

Quando os conservadores, os liberais e a mídia misturam o SUS com a saúde pública, não o fazem inocentemente: querem limitar o SUS ao controle de doenças e epidemias ou à profilaxia, de modo que a assistência médica fique submetida ao mercado ou, no limite, seja oferecida apenas para os pobres. Do outro lado, segmentos progressistas e até mesmo setores de esquerda usam a expressão saúde pública em contraposição à “saúde privada”, caindo na armadilha de restringir o SUS conforme a ideologia dominante. No Brasil e na América Latina, se constituiu o campo da Saúde Coletiva justamente para superar a saúde pública e a medicina preventiva, possibilitando a sua articulação com a Rede Básica de Saúde e a formulação do SUS.

Saneamento não é SUS, como também não o são a renda, o trabalho, a alimentação, a habitação, a segurança, o ambiente etc. São determinantes ou condicionantes muito relevantes para a garantia do direito à saúde, como as políticas econômicas e sociais, que requerem ações intersetoriais. Tanto a Constituição quanto a legislação e as normas do SUS ressaltam as políticas intersetoriais, chegando a apontar alguns mecanismos para a sua coordenação. Antes do golpe, o Ministério da Cidade formulou uma política de saneamento muito bem fundamentada na perspectiva da integralidade e da equidade, mas a EC 95 também compromete a sua implementação. A Lei Complementar 141 estabelece um conjunto de critérios para indicar o que é SUS e o que é responsabilidade de outros setores, com seus orçamentos específicos, mas passíveis de definição de políticas intersetoriais.

A gestão fatiada das políticas públicas decorrente da distribuição de cargos entre partidos pode ser uma explicação, junto com a cultura organizacional dominante, para o exercício restrito de políticas intersetoriais. As recomendações da Comissão Nacional dos Determinantes da Saúde entregues à Presidência da República há uma década têm sido solenemente ignoradas.

IHU On-Line – Há alguns anos, houve investimento em atenção básica, equipes de saúde da família, contratação de agentes comunitários, entre outras medidas. Atualmente, o quadro é outro. Como compreender esses retrocessos? E por que a atenção básica, a saúde preventiva, é tão importante num sistema como o SUS?

Jairnilson Silva Paim – A atenção básica junto à vigilância e promoção da saúde são fundamentais para o SUS não só para a acessibilidade, mas sobretudo para a efetividade das intervenções. Muito do que se conseguiu na melhoria dos indicadores de saúde nesses 30 anos de SUS, assim como na redução de internações, pode ser atribuído à atenção básica, conforme demonstram várias pesquisas publicadas no Brasil e no exterior. A compreensão dos retrocessos passa pelas políticas adotadas pelos golpistas, cujo discurso dominante no Ministério da Saúde era o do corte dos gastos e a prática priorizada era da privatização.

IHU On-Line – Recentemente, temos visto o avanço de doenças tropicais, como a malária no Norte, sem falar em dengue, zika e chikungunya em todo o país, que pareciam praticamente erradicadas. Como compreender a volta dessas doenças? E que relação podemos estabelecer com a falta de investimentos em atenção básica e no próprio SUS como um todo?

Jairnilson Silva Paim – A associação desse perfil epidemiológico com os ataques ao SUS já era alertada desde 2014. Só a grande mídia pode, irresponsavelmente, aparentar surpresa com esses fatos. Aliás, como abutres, ainda usa esses resultados para ampliação do sensacionalismo e demonizar os serviços públicos de saúde. Diversos pesquisadores brasileiros em parceria com centros de pesquisa internacionais estão investigando essas relações e os custos sociais do “austericídio”.

IHU On-Line – O Brasil também tem tido aumento de casos de sarampo, especialmente em Roraima, atribuída a entrada de venezuelanos. Autoridades locais dizem que a doença só tem expandido porque as pessoas têm desconsiderado o calendário básico de vacinação. Mas o que esse argumento e esse caso, como um todo, revelam sobre a estratégia e política de vacinação no país?

Jairnilson Silva Paim – Não sou epidemiologista nem especialista em imunizações, mas a pergunta demanda por algumas considerações. Os refugiados venezuelanos não são culpados pela epidemia de sarampo no Norte. Se mantivéssemos a imunidade de massa assegurada pelas altas coberturas vacinais observadas até 2015 certamente não teríamos esse número de casos. O país sempre lidou com viagens internacionais, incluindo países com casos dessas doenças na Europa, e quando eles apareciam rapidamente se realizavam ações de bloqueio.

Essa epidemia é um dos preços pagos pela desestruturação do SUS, comprometendo até mesmo a reputação do Programa Nacional de Imunizações - PNI e do sistema de vigilância epidemiológica. O PNI era motivo de orgulho nacional, diante do reconhecimento internacional. E a vigilância epidemiológica brasileira era uma das mais avançadas das Américas, como demonstrou em 2009 diante da epidemia do H1N1 ou em 2015 com a identificação da zika no Nordeste. Era fato conhecido que os brasileiros eram o povo que mais respondia prontamente às convocações para a vacinação.

A corrida para as unidades de saúde em busca da vacina contra a  febre amarela febre amarela nos últimos anos é um bom exemplo, pois foi muito divulgada pela mídia. E as respostas do governo foram um desastre. Primeiro, demorou a reagir. Depois, estabeleceu prioridades de locais e faixas etárias. Em seguida, liberou geral, pois parece que sobraram vacinas. E, finalmente, se deu conta de que não era possível dispor de vacinas para todos e decidiu fracionar a dose, com o pretexto de atender a recomendação da Organização Mundial da Saúde - OMS.

Enfim, era um conjunto de ingredientes para desacreditar o PNI e desmoralizar o SUS, criando muitas dúvidas e perplexidades na população. Agora, aparece uma suposta explicação para as baixas coberturas vacinais culpando os pais por descuidarem da imunização dos filhos ou devido às fake news das redes sociais com suspeitas da eficácia das vacinas ou dos efeitos colaterais. Pergunto: que estudos ou evidências podem sustentar tais “explicações”? Será que situações desse tipo, até possíveis de serem observadas na classe média, podem ser generalizadas para o conjunto da população?

IHU On-Line – Quais os riscos de um sistema de saúde pública sem o SUS? E, no Brasil de hoje, há possibilidade de isso ocorrer?

Jairnilson Silva Paim – Reitero que o SUS não é parte de um “sistema de saúde pública”. Ele é um sistema universal de saúde. Mas pode vir a ser reduzido a ponto de retroceder a uma espécie de “sistema de saúde pública” americanizado, restrito ao controle de doenças e à regulação de produtos e serviços de interesse para a saúde, como o Centro de Controle e Prevenção de Doenças - CDC e o Food and Drug Administration - FDA [7], e ao atendimento dos pobres e miseráveis. Assim, poderemos nos deparar com um simulacro do SUS se não atuarmos politicamente em sua defesa, combatendo os seus coveiros.

IHU On-Line – Quais os desafios para se recuperar e pôr em prática o espírito do sistema universal de saúde concebido ainda em meio à Constituinte e Reforma Sanitária? E como podemos relacionar esses desafios com as eleições de 2018?

Jairnilson Silva Paim – Mesmo que pareça um truísmo não há como escapar: o maior desafio do SUS é político. É político o desafio de torná-lo único. É político o desafio de fazê-lo efetivamente público, democrático, integral e igualitário. Não só porque o SUS tem a ver com o dever do Estado e o direito dos cidadãos em relação à saúde, nem porque necessita alargar as bases sociais, políticas e ideológicas em sua defesa, a partir de uma consciência sanitária crítica. É político porque lida com a questão do modelo de desenvolvimento, com as desigualdades (sociais, raciais, étnicas, de gênero etc.), com a articulação público-privada, com a democratização da atenção à saúde, com o complexo econômico e industrial da saúde, com a questão ambiental na cidade e no campo, com o orçamento e a disputa dos fundos públicos face aos interesses do capital financeiro. Tenho batido nessa tecla há mais de 10 anos. Até mesmo a revista The Lancet admitiu que o maior desafio do SUS é político, como destacou na capa da Série Health in Brazil, em maio de 2011.

IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?

Jairnilson Silva Paim – Não é suficiente afirmar que o maior desafio do SUS é político. Uma reforma social como a RSB e uma totalidade complexa e concreta como o SUS não são irreversíveis, mas também não são facilmente aniquiladas. Há lutas que serão travadas até as eleições de outubro, e outras necessárias para defender a democracia diante de uma instabilidade que certamente perseguirá um novo governo. Mas, antes de mais nada, pode-se iniciar processos (começando por onde for possível e com as formas organizativas de que já se dispõe) que redundem na constituição de novos sujeitos sociais, individuais e coletivos (sujeitos da práxis e sujeitos da antítese) articulados à RSB e à Saúde Coletiva, de modo que nas próximas décadas seja possível retomar as iniciativas para a redução das desigualdades no Brasil, para o aprofundamento da cidadania e para o avanço e a radicalização da democracia.

O que fazer? Passa pela revalorização do conceito ampliado de saúde, possibilitando a articulação com as lutas pelos direitos humanos, pela redução das desigualdades e pela melhoria da qualidade de vida (urbana, familiar, pessoal, ambiental, ocupacional etc.). Já o como fazer supõe a revisão das vias de construção da RSB (sócio-comunitária, técnico-institucional e legislativo-parlamentar), mesmo com diferença de ênfase em instituições ou movimentos sociais. Cabe, também, estabelecer táticas junto aos conselhos e outras formas organizativas (Fórum, Frentes, organizações de bases em locais de trabalho – saúde e escolas/universidades etc.), apostando na mobilização/conscientização e, especialmente, na unidade, agilidade e efetividade. Para além dos movimentos sociais progressistas e das entidades da RSB (Centro Brasileiro de Estudos em Saúde - Cebes, Abrasco, Rede Unida, Associação Brasileira de Economia da Saúde - Abres etc.), a conjuntura ensejou a construção da Frente Povo sem Medo e da Frente Brasil Popular, entre outras iniciativas, que tem possibilitado mobilizações e articulação política contra o retrocesso e os ataques à democracia, em torno da bandeira Nenhum Direito a Menos. Tais movimentos tendem a se expressar no processo eleitoral e na configuração das forças políticas que conquistarem espaços nos âmbitos federal e estadual.

Nessa perspectiva, duas iniciativas relevantes foram acionadas pelas Fundações ligadas a partidos que permitem apontar convergências para um programa de governo progressista. A primeira, de fevereiro de 2018 - Unidade para Reconstruir o Brasil [8] com vistas à candidatura para a Presidência da República e a segunda, divulgada em 3 de julho deste ano - Por uma frente para o Parlamento compromissada com a reconstrução e o desenvolvimento do Brasil [9] está voltada para parlamentares comprometidos com uma agenda progressista.

Finalmente, não bastam o proselitismo em defesa do SUS e a prática ideológica do movimento sanitário. A busca de formas organizativas mais orgânicas pode sugerir novos arranjos para que a militância da RSB atue mais prontamente na conjuntura, evitando que o movimento seja atropelado ou dirigido pelos fatos.

Notas:

[1] Ligia Bahia: graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, mestra e doutora em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz. Atualmente é professora adjunta da UFRJ. (Nota da IHU On-Line)

[2] Le Monde Diplomatique Brasil, No. 101, outubro de 2016, p. 40. (Nota do entrevistado)

[3] Reforma Sanitária Brasileira: o movimento da Reforma Sanitária nasceu no meio acadêmico no início da década de 1970 como forma de oposição técnica e política ao regime militar. Nesse contexto destacaram-se nessa luta também figuras do âmbito político como Sérgio Arouca, David Capistrano e Gilson de Carvalho. (Nota da IHU On-Line)

[4] Disponível aqui. (Nota do entrevistado)

[5] no. 58, jul/ago, 2018. (Nota do entrevistado)

[6] Disponível aqui. (Nota do entrevistado)

[7] Food and Drug Administration: agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, um dos departamentos executivos federais dos Estados Unidos. A FDA é responsável pela proteção e promoção da saúde pública através do controle e supervisão da segurança alimentar, produtos de tabaco, suplementos dietéticos, prescrição e over-the-counter medicamentos farmacêuticos, vacinas, biofarmacêuticos, transfusões de sangue, dispositivos médicos, radiação eletromagnética, cosméticos e alimentos para animais e produtos veterinários. (Nota da IHU On-Line)

[8] Saiba mais aqui. (Nota do entrevistado)

[9] Saiba mais aqui. (Nota do entrevistado)

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