10 Outubro 2025
"Os cristãos de Gaza, como vimos, também têm estado sob ataque... Comove-me pensar nessas pessoas que estão determinadas a ficar e que rezam diariamente pela paz e pelas vítimas. É uma situação cada vez mais precária. Tentamos estar próximos delas em todos os sentidos, graças às atividades do Patriarcado Latino de Jerusalém e da Cáritas".
A entrevista é de Andrea Tornielli e Roberto Paglialonga, publicada por L'Osservatore Romano, 06-10-2025. A tradução é Luisa Rabolini.
Dois anos se passaram desde aquele dia terrível, desde o ataque terrorista perpetrado pelo Hamas contra Israel e desde o início do que se tornou uma guerra total que arrasou a Faixa de Gaza. Recordemos esses eventos e o que aconteceu depois com o cardeal secretário de Estado Pietro Parolin.
Eis a entrevista.
Eminência, estamos entrando no terceiro ano desde o trágico ataque de 7 de outubro. Como o senhor se lembra daquele momento e o que ele significou, em sua opinião, para o Estado de Israel e as comunidades judaicas no mundo?
Repito o que tive oportunidade de dizer naqueles dias: o ataque terrorista perpetrado pelo Hamas e por outras milícias contra milhares de israelenses e de migrantes residentes, muitos deles civis, que estavam prestes a celebrar o dia da "Simchat Torá", que encerrava a semana da festividade de "Sucot", foi desumano e injustificável. A violência brutal perpetrada contra crianças, mulheres, jovens e idosos não pode ter nenhuma justificação. Foi um massacre indigno e — repito — desumano. A Santa Sé expressou imediatamente sua total e firme condenação, pedindo a libertação imediata dos reféns e expressando sua proximidade às famílias atingidas durante o ataque terrorista. Rezamos e continuamos a fazê-lo, assim como continuamos a pedir o fim dessa espiral perversa de ódio e de violência que ameaça nos arrastar para um abismo sem retorno.
O que o senhor gostaria de dizer às famílias dos reféns israelenses ainda mantidos pelo Hamas?
Infelizmente, já se passaram dois anos; alguns deles estão mortos, outros foram libertados após longas negociações. Me comovem profundamente e me entristecem as imagens dessas pessoas mantidas em cativeiro nos túneis e morrendo de fome. Não podemos e não devemos esquecê-las. Lembro-me de que, no último ano e meio de sua vida, o Papa Francisco fez nada menos que 21 apelos públicos pedindo a libertação dos reféns e se encontrou com algumas de suas famílias. Seu sucessor, o Papa Leão XIV, continuou a fazer esses apelos. Expresso minha mais profunda proximidade a eles, na oração cotidiana por seus sofrimentos e continuando a assegurar-lhes a nossa total disposição de fazer todo o possível para que possam voltar a abraçar seus entes queridos sãos e salvos, ou pelo menos receber os corpos daqueles que foram mortos, para que sejam enterrados com dignidade.
Ao comemorar o primeiro aniversário do ataque de 7 de outubro, o Papa Francisco falava de "vergonhosa incapacidade da comunidade internacional e dos países mais poderosos de silenciar as armas e pôr fim à tragédia da guerra". O que é necessário para a paz?
Hoje, a situação em Gaza é ainda mais grave e trágica do que há um ano, após uma guerra devastadora que ceifou dezenas de milhares de vidas. É necessário recuperar o sentido da razão, abandonar a lógica cega do ódio e da vingança e rejeitar a violência como solução.
Os agredidos têm o direito de se defender, mas mesmo a legítima defesa deve respeitar o parâmetro da proporcionalidade. Infelizmente, a guerra resultante teve consequências desastrosas e desumanas... Fico chocado e aflito com a contagem diária dos mortes na Palestina, dezenas, aliás, às vezes centenas por dia, inúmeras crianças cuja única culpa parece ser ter nascido lá: corremos o risco de nos habituar a essa carnificina! Pessoas mortas enquanto tentavam alcançar um pedaço de pão, pessoas soterradas sob os escombros das suas casas, pessoas bombardeadas nos hospitais, nos acampamentos, pessoas deslocadas forçadas a se mover de uma parte à outra daquele território estreito e superpovoado... É inaceitável e injustificável reduzir as pessoas humanas a meras "vítimas colaterais".
Como podemos julgar os episódios de antissemitismo que aumentaram significativamente em várias partes do mundo nos últimos meses?
São uma consequência triste e igualmente injustificada: vivemos de fake news, da simplificação da realidade. E isso leva aqueles que se alimentam dessas coisas a atribuir a responsabilidade pelo que está acontecendo hoje em Gaza aos judeus só por serem judeus. Sabemos que não é assim: também há muitas vozes de forte dissenso se elevando do mundo judaico contra a modalidade com que o atual governo israelense operou e está operando em Gaza e no resto da Palestina, onde – não nos esqueçamos – o expansionismo frequentemente violento dos colonos busca tornar impossível a criação de um Estado palestino. Vejamos o testemunho público das famílias dos reféns. O antissemitismo é um câncer que deve ser combatido e erradicado: precisamos de homens e mulheres de boa vontade, educadores que ajudem a compreender e, acima de tudo, a distinguir... Não podemos esquecer o que aconteceu no coração da Europa com o Holocausto; devemos nos empenhar com todas as forças para impedir que esse mal reapareça. Ao mesmo tempo, devemos garantir que atos de desumanidade e violações do direito humanitário nunca sejam justificados: nenhum judeu deve ser atacado ou discriminado por ser judeu, nenhum palestino deve ser atacado ou discriminado por ser palestino, porque é – como infelizmente se ouve dizer – um "potencial terrorista". A cadeia perversa de ódio está destinada a gerar uma espiral que não pode levar a nada de bom. É lamentável que não se consegue aprender com a história, mesmo a história recente, que continua sendo uma mestra de vida.
O senhor falou de uma situação insustentável e mencionou os muitos interesses em jogo que impedem o fim da guerra. Quais são esses interesses?
Parece evidente que a guerra travada pelo exército israelense para derrotar os milicianos do Hamas não leva em conta o fato de que enfrenta uma população em grande parte indefesa e exausta, em uma área disseminada de casas e prédios arrasados: basta ver as imagens aéreas para dar-se conta de como Gaza é hoje. Parece-me igualmente evidente que a comunidade internacional resulta infelizmente impotente e que os países realmente em condições de influir sobre a situação até o momento não o fizeram para deter a carnificina em curso. Só posso repetir as palavras muito claras proferidas a respeito pelo Papa Leão XIV em 20 de julho passado: "Apelo à comunidade internacional para que observe o direito humanitário e respeite a obrigação de proteger os civis, bem como a proibição de punição coletiva, o uso indiscriminado da força e o deslocamento forçado da população." Essas palavras ainda aguardam ser acolhidas e compreendidas.
Então, o que a comunidade internacional pode fazer?
Certamente, ela pode fazer muito mais do que está fazendo atualmente. Não basta dizer que o que está acontecendo é inaceitável e continuar permitindo que aconteça. É preciso questionar seriamente a licitude, por exemplo, de continuar a fornecer armas que são usadas em detrimento de civis. Infelizmente, como vimos, as Nações Unidas até agora não conseguiram impedir o que está acontecendo. Mas existem atores internacionais que teriam condições de influir mais sobre o fim dessa tragédia, e é preciso encontrar uma maneira de dar às Nações Unidas um papel mais eficaz para pôr fim às muitas guerras fratricidas em curso no mundo.
O que o senhor acha do plano apresentado pelo presidente Trump para alcançar uma trégua e pôr fim à guerra?
Qualquer plano que envolva o povo palestino nas decisões sobre seu futuro e permita o fim desse massacre, libertando os reféns e interrompendo a matança diária de centenas de pessoas, deve ser acolhido e apoiado. O Santo Padre também expressou sua esperança de que as partes o aceitem e que um caminho para a paz possa finalmente começar.
Como devemos julgar as posições assumidas pela sociedade civil, também em Israel, que se manifestam contra as políticas de guerra do governo israelense e a favor da paz?
Embora essas iniciativas às vezes corram o risco de veicular uma mensagem errada em nível midiático devido à violência de alguns agitadores, estou positivamente impressionado com a participação nas manifestações e o engajamento de tantos jovens. É o sinal de que não estamos condenados à indiferença. Devemos levar a sério esse desejo de paz, esse desejo de comprometimento... Nosso futuro depende disso, o futuro do nosso mundo depende disso.
Há quem defenda, mesmo dentro da Igreja, que, diante de tudo isso, é preciso primeiro rezar, não sair às ruas para evitar cair no jogo dos violentos...
Sou um batizado, sou um crente, sou um padre: para mim, a oração incessante diante de Deus, pedindo-lhe que nos assista, nos ajude e intervenha para pôr fim a tudo isso, apoiando os esforços de mulheres e homens de boa vontade, é essencial, diária e fundamental. O Papa Leão XIII nos convidou mais uma vez a rezar um Rosário pela paz no dia 11 de outubro. Mas gostaria também de lembrar que a fé cristã ou é encarnada ou não é... Somos seguidores de um Deus que se fez homem, assumiu a nossa humanidade e nos testemunhou que não podemos ficar indiferentes diante do que acontece à nossa volta e mesmo longe de nós. Por isso, a oração nunca será suficiente, mas também nunca será suficiente o empenho concreto, a mobilização das consciências, as iniciativas de paz, a sensibilização; mesmo correndo o risco de parecer "fora do mundo", mesmo correndo o risco nos arriscar: existe uma maioria silenciosa — composta também de muitos jovens — que não se rende a essa desumanidade. Eles também são chamados a rezar. Pensar que nosso papel, como cristãos, seja de nos fecharmos nas sacristias, me parece profundamente equivocado. A oração também convoca a um empenho, a um testemunho, a escolhas concretas.
O Papa Leão XIII não se cansa de pedir paz. O que a Santa Sé pode fazer nessa situação? Qual pode ser sua contribuição e de toda a Igreja?
A Santa Sé, às vezes incompreendida, continua a pedir paz, a convidar ao diálogo, a usar as palavras "negociação" e "tratativa", e o faz com base em um profundo realismo: a alternativa à diplomacia é a guerra perpétua, o abismo do ódio e da autodestruição do mundo. Devemos gritar com força: paremos antes que seja tarde demais. E devemos agir, fazer todo o possível para que não seja tarde demais. Tudo o que for possível.
Por que o reconhecimento do Estado da Palestina é importante nesta fase?
A Santa Sé reconheceu oficialmente o Estado da Palestina há dez anos, com o Acordo Global entre a Santa Sé e o Estado da Palestina. O preâmbulo daquele acordo internacional apoia plenamente uma resolução justa, abrangente e pacífica da questão da Palestina, em todos os seus aspectos, em conformidade com o direito internacional e todas as resoluções pertinentes da ONU. Ao mesmo tempo, apoia um Estado da Palestina que seja independente, soberano, democrático e viável, que inclua a Cisjordânia, Jerusalém Oriental e Gaza. O mesmo acordo identifica esse Estado não em oposição a outros, mas como capaz de viver lado a lado com seus vizinhos, em paz e segurança. Saudamos o fato de vários países ao redor do mundo terem reconhecido o Estado da Palestina. Mas não podemos deixar de notar com preocupação que as declarações e as decisões israelenses vão numa direção oposta, ou seja, pretendem impedir permanentemente o possível surgimento de um verdadeiro Estado Palestino. Essa solução – a criação de um Estado Palestino – parece-me ainda mais válida depois do que aconteceu nos últimos dois anos. É o caminho, o de dois povos em dois Estados, que a Santa Sé tem seguido desde o início. As sortes dos dois povos e dos dois Estados estão interligadas.
Como está a comunidade cristã no terreno, após o duro ataque à Sagrada Família, e por que seu papel no cenário do Oriente Médio é importante?
Os cristãos de Gaza, como vimos, também têm estado sob ataque... Comove-me pensar nessas pessoas que estão determinadas a ficar e que rezam diariamente pela paz e pelas vítimas. É uma situação cada vez mais precária. Tentamos estar próximos delas em todos os sentidos, graças às atividades do Patriarcado Latino de Jerusalém e da Cáritas. Agradecemos aos governos e a todas as instituições que se empenham em fazer chegar ajudas e possibilitar que os feridos graves sejam socorridos. O papel dos cristãos no Oriente Médio foi e continua sendo fundamental, mesmo que seu número esteja diminuindo. Gostaria de salientar que eles participam plenamente dos acontecimentos do seu martirizado povo palestino, do qual compartilham os sofrimentos.
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