18 Junho 2025
O Papa desapareceu dos holofotes da mídia desde sua eleição. Ele quer curar feridas internas e retomar os hábitos quebrados por Francisco. Em Roma, presume-se que ele retornará a morar no Palácio do Vaticano.
O artigo é de Inigo Dominguez, correspondente em Roma, publicado por El País, 17-06-2025.
O Papa Leão XIV passará novamente parte do verão no que era a residência papal de verão, o palácio e complexo de Castel Gandolfo, a 25 quilômetros de Roma. Isso está virando manchete, porque esse era o costume até a chegada de Francisco, que o renunciou em 2013, argumentando que um papa não tira férias. Foi mais um evento dramático de seus primeiros meses e mais uma de suas rupturas conspícuas com a tradição. Três anos depois, o pontífice argentino chegou a transformar o complexo em um museu. Além de o povo de Castel Gandolfo ter vivenciado o evento como um funeral, causou confusão na Cúria Romana, entre outras razões porque implicava críticas aos seus antecessores.
O retorno de um papa após 12 anos a Castel Gandolfo, onde morreram dois pontífices (Pio XII em 1958 e Paulo VI em 1978), foi anunciado ao meio-dia de terça-feira pela Santa Sé. O pontífice se mudará para lá em 6 de julho e permanecerá no palácio até o dia 20 daquele mês. Em seguida, retornará de 15 a 17 de agosto. Como novidade, ele não ficará hospedado no palácio papal, que permanecerá aberto como museu, mas na chamada Villa Barberini, em outra parte do complexo, segundo a assessoria de imprensa da Santa Sé. O local contará com a piscina construída por João Paulo II e uma nova quadra de tênis, seu esporte favorito, segundo a imprensa italiana.
Pode parecer uma decisão sem grande significado, mas é mais um detalhe que demonstra que Leão XIV está claramente se distanciando de Francisco, pelo menos em sua abordagem. Ele o faz silenciosamente: o sintoma mais óbvio é, antes de tudo, que o Papa desapareceu dos holofotes da mídia desde sua eleição em 8 de maio, com um perfil deliberadamente discreto. Ele não aparece nas manchetes. Francis Prevost agora trabalha a todo vapor, atendendo inúmeras audiências e profere discursos, homilias e sermões quase diariamente, mas eles são estritamente espirituais em conteúdo, dificilmente coloquiais e raramente aparecem na mídia. Isso contrasta fortemente com o impacto midiático que Francisco causou imediatamente após sua chegada ao Vaticano e é uma mudança marcada por uma das prioridades do novo Papa: reconciliar uma Igreja profundamente dividida pelos caminhos de seu antecessor, entre outras coisas.
Robert Prevost está em plena sintonia com Francisco em sua visão de uma Igreja próxima dos pobres e dos problemas sociais, mas está sendo muito cuidadoso com seu estilo: sinaliza algo como um retorno à normalidade após a tempestade do papa argentino, com gestos que são interpretados como um desejo de curar feridas internas. Ele está piscando para aquele setor mais tradicional da Igreja que não via com bons olhos as mudanças de Jorge Mario Bergoglio. O pontífice americano-peruano fez isso desde o primeiro dia, nos hábitos que usava e com seu uso do latim, ou mesmo cantando nas celebrações, algo que Francisco não fazia. Ou por não usar o carro de seu antecessor, um pequeno Fiat 500 branco, e preferir uma van Volkswagen azul-escuro.
O passo mais significativo será algo que ainda não foi anunciado oficialmente, mas que é dado como certo em Roma e no Vaticano: Leão XIV retornará para morar no apartamento do Palácio Apostólico, que atualmente está passando por reformas. Francisco o deixou após sua eleição para se mudar para a residência Santa Marta, um hotel moderno onde os cardeais estão hospedados durante o conclave. Ele acabou morando em uma suíte no segundo andar, onde faleceu em 21 de abril.
Mas a maior diferença entre Leão XIV e Bergoglio reside, acima de tudo, no fato de que ele não fala sobre política nem se envolve em problemas; seu governo é mais introspectivo. Por enquanto. Fontes do Vaticano indicam que estes primeiros meses são de transição; Prevost quer acalmar os ânimos, apaziguar conflitos internos e considerar cuidadosamente as decisões a serem tomadas e o caminho a seguir. Mas então ele começará a agir e será ágil, garantem.
Um exemplo claro de como líder católico permanece à margem dos conflitos políticos, algo que Francisco não evitou de forma alguma, foi o que aconteceu no último sábado, 14 de junho. Naquele dia, pensou-se que talvez tivesse chegado o momento de ele enfrentar um dos grandes desafios de seu pontificado: o delicado diálogo com seu próprio país, os Estados Unidos, e com Donald Trump.
O Vaticano anunciou que Leão XVI enviaria uma mensagem em vídeo gravada para ser transmitida no estádio do Chicago White Sox, seu time de beisebol, onde 30 mil pessoas se reuniram para uma cerimônia organizada pelo arcebispo da cidade, o cardeal progressista Blaise Cupich, um dos principais críticos de Trump na Igreja americana. Foi a primeira vez que Prevost se dirigiu diretamente aos fiéis americanos, e o fez em um momento de grave crise no país, com deportações em massa de imigrantes e o envio da Guarda Nacional para a Califórnia. Foi também no mesmo dia que Donald Trump presidiu um desfile militar em Washington para o 250º aniversário das Forças Armadas dos EUA e centenas de manifestações de protesto em todo o país sob o lema "Dia Sem Reis". Alguns veículos de comunicação americanos chegaram a falar de uma possível contraprogramação do Papa a Trump.
Em suma, poderia ter sido uma oportunidade para Leão XIV iniciar um diálogo mais politicamente carregado, mas ele dedicou toda a sua intervenção a falar sobre a Santíssima Trindade. Para aqueles que esperavam que Leão XIV entrasse no debate político, ficou claro que já havia outro papa no Vaticano. Porque Francisco, em fevereiro de 2025, logo no início do mandato de Trump, dirigiu uma carta dura e sem precedentes aos bispos dos EUA "nestes momentos delicados". Um documento no qual ele falou assim sobre deportações em massa: "Uma consciência corretamente formada não pode deixar de fazer um julgamento crítico e expressar sua discordância com qualquer medida que equipare, tácita ou explicitamente, a situação ilegal de alguns migrantes à criminalidade". A carta continha um ataque muito explícito ao vice-presidente J.D. Vance, sem nomeá-lo, e apelava aos fiéis "e a todos os homens e mulheres de boa vontade para que não cedessem a narrativas que discriminam e causam sofrimento desnecessário entre nossos irmãos e irmãs migrantes e refugiados". Leão XIV, por enquanto, prefere fazer apenas catecismo e falar de forma menos explícita.