21 Junho 2025
"Existe uma ética que não é imposta de fora, mas que brota de dentro. Uma ética que não precisa de confessores nem de tribunais morais, mas sim de um coração livre e responsável. Nesse contexto, uma pessoa honrada é aquela que se respeita, se conhece e se aceita, e, a partir desse lugar de paz, trata os outros com a mesma delicadeza com que gostaria de ser tratada", escreve José Carlos Enriquez Diaz, em artigo publicado por Ataque al Poder, 13-06-2025.
Durante séculos, a Igreja buscou definir o que é uma "vida honesta". Ela traçou seus limites com regras, mandatos, proibições e dogmas. Ela nos disse, com uma autoridade que muitos consideravam inquestionável, como devemos viver, pensar, falar, amar e até sentir. Mas o que acontece quando essa "honestidade" não nasce de um coração livre, mas sim do medo da punição ou do desejo de ser aceito por uma estrutura? Isso é honestidade verdadeira?
Uma vida honrada, em seu sentido mais humano e profundo, não é necessariamente aquela que segue os ditames de uma instituição. Não é uma vida que se conforma a padrões impostos de fora. É, acima de tudo, uma vida vivida com consciência, com respeito, com autenticidade. É a vida de alguém que não precisa vigiar nem ser vigiado, porque internalizou algo mais valioso do que qualquer regra: amor-próprio e respeito ao próximo.
Existe uma ética que não é imposta de fora, mas que brota de dentro. Uma ética que não precisa de confessores nem de tribunais morais, mas sim de um coração livre e responsável. Nesse contexto, uma pessoa honrada é aquela que se respeita, se conhece e se aceita, e, a partir desse lugar de paz, trata os outros com a mesma delicadeza com que gostaria de ser tratada.
Jesus não era um cão de guarda moral. Ele não condenou a mulher adúltera, não destacou o cobrador de impostos por sua corrupção, não excluiu os doentes, nem aqueles que a lei religiosa considerava "impuros". O que ele fez foi criticar duramente aqueles que acreditavam ter o monopólio da moralidade: os fariseus, os mestres da lei, aqueles que estavam sempre atentos às falhas dos outros enquanto escondiam suas próprias contradições.
Em Mateus 23, Jesus é claro:
“Atam fardos pesados e difíceis de suportar e os colocam aos ombros dos homens, e eles mesmos não querem movê-los nem com um dedo.”
Não é isso que a Igreja tem feito tantas vezes? Ela ditou normas sobre sexualidade, gênero, família e papéis sociais, excluindo, ferindo e culpando milhões. Enquanto isso, dentro dela, o poder, o abuso e o silêncio cúmplice florescem impunemente. É isso uma vida honrosa?
Um bom amigo meu costumava dizer que sua mãe idosa costumava dizer: "Uma mulher honesta não interfere na vida dos outros". Há profunda sabedoria nessa simples frase. A verdadeira honestidade não precisa controlar a vida dos outros; não se alimenta de julgamentos ou boatos; não tem prazer em apontar dedos. É uma maneira de estar no mundo sem invadir, sem manipular, sem impor.
A Igreja, se deseja ser testemunha da honra, deve abandonar sua obsessão pelo controle moral. Não se pode falar de liberdade em Cristo enquanto se policia a cama, os pensamentos, a identidade ou os desejos dos outros. Não se pode pregar o amor enquanto se pune os diferentes. Não se pode proclamar a verdade enquanto se permanece em silêncio sobre os abusos cometidos em nome de Deus.
Jesus não veio impor mais uma lei. Ele veio libertar. Nas palavras do Evangelho de João:
"A verdade vos libertará" (Jo 8,32).
Ele não disse "a lei vos tornará santos", nem "o dogma vos tornará obedientes", mas a verdade, e essa verdade não é um sistema de regras, mas uma experiência viva de amor, justiça e compaixão. A vida honrosa proposta pelo Evangelho não é de conformidade externa, mas de transformação interna.
Portanto, uma vida honrosa é aquela em que não há necessidade de máscaras ou rituais para parecer puro. É uma vida em que se pode olhar no espelho sem culpa ou medo. Na qual se pode dizer: "Faço o que faço não porque me ordenam, mas porque entendi que amor, cuidado e justiça são a minha maneira de estar no mundo".
Quando uma pessoa ama, respeita e cuida de si mesma, não precisa que ninguém lhe diga para não prejudicar os outros. Não precisa de um mandamento para não roubar, porque compreendeu o valor dos outros. Não precisa de uma doutrina sobre o amor, porque sabe amar. É isso que significa ter "a lei escrita no coração", como profetizou Jeremias (Jr 31,33). Não em tábuas, não em catecismos, não em códigos canônicos, mas na consciência viva de cada pessoa.
A grande tragédia de muitas religiões, incluindo a Igreja, tem sido substituir essa consciência pela obediência cega. Elas formaram crentes, não pessoas livres. Produziram medo, não maturidade. Confundiram honestidade com repressão, fé com submissão, moralidade com punição. Mas quando as pessoas são ensinadas a viver com medo, tudo o que alcançam é hipocrisia.
Hoje, mais do que nunca, precisamos de uma espiritualidade de respeito. Uma ética de cuidado e silêncio interior. Uma honestidade que não seja demonstrada, ostentada ou vangloriada. Uma honestidade que seja vivida no dia a dia: na forma como ouvimos, como perdoamos, como compartilhamos, como amamos.
A Igreja deveria ser a primeira a se desfazer das vestes de juíza e vestir as vestes de irmandade. Deveria parar de monitorar e começar a acompanhar. Deveria abandonar o púlpito moral e descer à lama humana, onde reside a verdadeira compaixão. Se não o fizer, permanecerá uma estrutura que impõe, mas não transforma.
E talvez então eu possa começar a ver as pessoas não como sujeitos que devem obedecer, mas como seres capazes de construir suas vidas morais a partir da liberdade, da consciência e da responsabilidade compartilhada. Essa é a verdadeira ética: não a ditada por um código, mas a vivida em comunidade, em relacionamentos, de baixo para cima. É o que disseram vozes críticas e esperançosas dentro do próprio pensamento cristão. É assim que tantas pessoas honestas, que nunca se confessaram, mas vivem a verdade, a vivem sem perceber.
Porque também existem casais que nunca foram ao altar, que não estão unidos por nenhum sacramento, e ainda assim vivem seu amor com uma verdade, uma dedicação e um respeito que superam muitos casamentos que têm uma bênção oficial. Casais que não precisam de documento ou reconhecimento eclesiástico para serem fiéis, solidários, pacientes e ternos. Vivem o evangelho sem nomeá-lo, encarnam a aliança sem ritual. E, no entanto, são frequentemente julgados, desprezados ou ignorados por não viverem à altura da forma exterior. Mas se há um lugar onde Deus vive, é lá onde existe o amor verdadeiro.
Santo Agostinho, com sua sabedoria espiritual radical, compreendeu isso. Diz-se que, ao entrar em uma casa, ele não perguntava sobre os documentos, mas sobre o amor entre as pessoas que ali viviam. Ele não se importava se eram casados segundo o rito, mas sim se realmente se amavam. Porque ele sabia — como disse em sua famosa frase — que "quem ama não pode errar". Quando o amor é genuíno, puro e mútuo, todo o resto se encaixa. Um sacramento sem amor é um rito vazio; mas o amor, mesmo sem sacramento, é presença divina!
Porque, no fim das contas, uma vida honrada não exige vigilância ou mandamentos; exige verdade interior. E essa verdade, como disse Jesus, liberta.