05 Junho 2025
Gabriel Romanelli, o padre que “governa” a paróquia da Sagrada Família na Faixa: “A situação é cada vez mais dramática. Estamos ajudando dezenas de milhares de pessoas: mas se os alimentos pararem de chegar, nós também seremos forçados a interromper”. Os gritos das crianças ao fundo, que dançam ao som das batidas de uma música e riem alegremente, evocam uma atmosfera relaxada, serena. A sensação, no entanto, dura apenas um momento. Tudo volta à normalidade dos moradores Gaza, com o estrondo causado por uma explosão e os gritos dos pequenos que se transformam em berros. “Esse é o nosso surrealismo diário”, explica por telefone o padre Gabriel Romanelli, pároco católico da Faixa de Gaza. “A essa altura, as crianças já estão tão acostumadas que, quando ouvem tiros ou o som das bombas, correm e se escondem debaixo de algum telhado ou sob alguma proteção, mas depois de alguns minutos, assim que os estrondos param, voltam a brincar”.
Assim começa a entrevista que o sacerdote argentino de origem italiana nos concedeu enquanto desempenhava suas atividades com crianças na paróquia da Sagrada Família, no bairro de al Zaitoun, na parte norte da cidade de Gaza. Ele chegou a Gaza em 2019, depois de um longo período de serviço missionário em vários países árabes e na Palestina. Em 07-10-2023, no momento do terror do Hamas em Israel, ele estava fora da Palestina e não pôde voltar por motivos de segurança.
Longe de seu povo por sete meses, aproveitou a visita do Patriarca Latino de Jerusalém, Cardeal Pizzaballa, a Gaza em junho de 2024 para retornar. Desde então, assiste incrédulo à deterioração progressiva da situação, mas não para de chamar todos à razão e de pedir que se chegue a acordos para o bem de todas as partes envolvidas no conflito. “A situação agora assumiu as características de uma catástrofe, mas, por mais impossível que pareça, está piorando a cada dia. Além dos bombardeios, há a grave questão da ajuda humanitária que não está chegando, e é essa ajuda que agora aqui decide a vida ou a morte das pessoas”.
A entrevista é de Luca Attanasio, publicada por Domani, 31-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
A ajuda está bloqueada em todos os lugares?
Não completamente, ontem, em alguns centros no Sul, teve alguma distribuição. Mas estamos a cerca de 30 quilômetros de distância, as pessoas não conseguem chegar até lá, as estradas não são seguras e não há dinheiro para pagar o transporte. Antes da guerra, a situação já era crítica, mas pelo menos muitos centros da ONU ou de ONGs internacionais estavam funcionando. Nós mesmos conseguimos ajudar dezenas de milhares de pessoas. Agora é muito difícil, todo dia somos obrigados a racionar mais do que no dia anterior. Infelizmente, não conseguimos nem mesmo receber a ajuda disponibilizada pelo Patriarca Latino de Jerusalém, Cardeal Pizzaballa, há mais de três meses. Desde o início da guerra, temos ajudado dezenas de milhares de pessoas, incluindo os mais de 500 refugiados que vivem conosco nas instalações de nossa igreja. Mas se a ajuda se não conseguir chegar, seremos obrigados a interromper.
Atualmente, já se passa fome em muitas zonas.
Infelizmente, sim. Lembre-se de que aqui, mesmo antes, a produção doméstica de alimentos era baixa, agora os itens de primeira necessidade estão se tornando mercadoria de luxo: um quilo de açúcar custa 50 dólares, um quilo de farinha 40/50 dólares. Não há mais dinheiro e as pessoas voltaram ao método de troca: meio quilo de arroz em troca de berinjelas ou abobrinhas que são cultivadas em pequenos lotes de terra poupados pelos bombardeios.
Além disso, há o problema do trauma que a violência criou na vida cotidiana de todos: a música que você estava escutando no início da ligação telefônica vinha de um aparelho de som que eu tinha ligado para deixar as crianças dançarem, que agora vivem em uma condição surreal permanente. Às vezes, quando ouvem o bombardeio, elas vão se esconder e depois voltam imediatamente, mas em outras, continuam brincando como se nada estivesse acontecendo. Ontem, para dar um exemplo, nós mesmos estávamos na igreja para um culto e ouvimos um estrondo alto: nenhum de nós pensou em sair, continuamos o que estávamos fazendo.
A Igreja Católica foi uma das poucas realidades globais a se manifestar em defesa da população civil, a pedir repetidamente o fim dos combates e a condenação dos massacres...
As pessoas perceberam uma proximidade. Como se sabe, todas as manhãs, às 7h, Francisco me telefonava para ter notícias e, em correspondência, tocávamos os sinos, era a “Hora do Papa” e todos sabiam e se sentiam compreendidos, independentemente de fé ou afiliação. A Igreja sempre teve uma posição clara, condenou as violências de ambos os lados e invoca a entrada de ajuda humanitária. Apesar de tudo, não perdemos a esperança, não há guerras eternas. Para o bem de todos, de Israel e da Palestina, quanto antes esse absurdo parar, mais fácil será curar as imensas feridas.