24 Mai 2025
"A viagem de Trump pode ser considerada a terceira rodada de uma negociação que parece obrigada. É inútil negar, a viagem do presidente dos EUA foi uma derrota para Israel, que conseguiu dilapidar numa só tacada as vitórias militares no Líbano, na Síria e no Irã", escreve Davide Assael, judeu italiano, fundador e presidente da associação lech lechà, professor de filosofia e escritor, em artigo publicado por Domani, 21-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
A imposição de permitir a entrada de ajudas em Gaza sofrida por Netanyahu aprofunda, mais uma vez, o fosso com os Estados Unidos. O primeiro-ministro tem apenas uma chance de salvar a rede de alianças do Estado judeu: sair.
A retomada das ajudas humanitárias a Gaza imposta pelos EUA, além de desmentir totalmente uma certa retórica antissionista que tenta traçar um eixo do mal EUA de Trump-Israel, reitera o que emergiu da viagem do presidente estadunidense ao Oriente Médio.
Coisas, aliás, bem conhecidas dos analistas desde o governo Obama, o presidente do “pivô para a Ásia”: depois das irresponsáveis campanhas de George W. Bush, o objetivo estadunidense é se desvincular do Oriente Médio para se concentrar no Indo-Pacífico, onde se disputa o jogo sobre Taiwan com a China, apontada, com ou sem razão, como a rival do século.
Como todo império que se preze, até mesmo os EUA, que nunca desenvolveram uma verdadeira consciência imperial, não podem se afastar de um cenário sem garantias de que não retornarão a ele tão cedo. Há duas maneiras pelas quais os EUA buscaram a estabilização da região. A primeira foi o acordo sobre energia nuclear de Obama de 2015 com o Irã. O Oriente Médio o rejeitou. Em primeiro lugar, Israel, com o eterno Netanyahu, que ia a todos os encontros internacionais com o desenhinho da bomba com a linha indicando o ponto de enriquecimento de urânio. Igualmente radical foi a oposição dos sauditas, que, como disse Mohammed Bin Salman, se a antiga Pérsia tivesse fabricado o dispositivo nuclear, eles o teriam comprado no mesmo dia. Cenário nada animador em uma área em que já três Estados (Israel, Paquistão e Índia) possuem armas nucleares e que vê ciclicamente o avanço de milícias terroristas de todos os tipos e graus.
O resultado é bem conhecido, a retirada dos EUA do acordo do primeiro Trump e o restabelecimento das sanções. Com o agravante do assassinato do general Souleimani, o arquiteto do que hoje é conhecido como o eixo da resistência iraniana. O segundo instrumento por meio do qual Washington tentou estabilizar a área foram os Acordos de Abraão. Também assinados sob a égide de Trump 1 em 2020. Último ato de um percurso de reaproximação entre o Estado judeu e o mundo sunita que havia se aberto pelo menos desde o fim da Guerra Fria, quando muitos países árabes começaram a entrever as vantagens de desenvolver parcerias com Israel, que tinha muito a oferecer aos países vizinhos. Competências nos campos da agricultura, tecnologia, medicina, transporte aéreo, colaborações militares, até as mais recentes colaborações no campo energético, em que Israel transporta o gás extraído dos campos de Tamar e Leviatã para as usinas de liquefação egípcias, criando um hub que promete se candidatar como alternativa ao gás russo na Europa.
Em 7 de outubro, quando esse caminho parecia estar na reta final, incluindo o destinatário final saudita, esse cenário também foi detonado. A viagem de Trump pode ser considerada a terceira rodada de uma negociação que parece obrigada. É inútil negar, a viagem do presidente dos EUA foi uma derrota para Israel, que conseguiu dilapidar numa só tacada as vitórias militares no Líbano, na Síria e no Irã.
Primeiro, a humilhação de uma visita que não incluiu a etapa em Tel Aviv. Em segundo lugar, o encontro com o novo presidente sírio Ahmed al-Sharaa, o primeiro de um presidente EUA desde 2000, quando Bill Clinton se encontrou em Genebra com Hafez al-Assad, o pai de Bashar, hoje exilado na Rússia. Cereja do bolo, a notícia mais insidiosa: a vitória total de Erdogan, que, para resumir, de fato tomou a Síria e agora faz fronteira com Israel. O único consolo é que ter um país da OTAN em suas fronteiras é melhor do que ter o Irã. Mas a história não acaba aqui: navegando em meio às suas habituais contradições, Trump está empenhado em reabrir o dossiê iraniano, pressionando por aquele mesmo acordo que ele próprio havia descartado e rejeitando definitivamente os sonhos de Bibi de um ataque ao Irã, mais uma etapa daquela guerra permanente com a qual Netanyahu mantém todo o país sob controle. O gelo para seus ingênuos apoiadores israelenses, que são idênticos aos antissionistas dos quais partimos: não pensam em termos estratégicos.
Afinal, a trajetória dos EUA, que converge com a coroa saudita, é racional: a área só poderá encontrar estabilidade se forem atendidos os interesses dos três sujeitos hegemônicos, Israel, Arábia Saudita e Irã. Certamente não um acordo-quadro, o que é impossível, mas pelo menos que o eixo sunita-israelense encontre algum lugar para o Irã, deixando que a oposição interna encontre uma maneira de se livrar do regime dos aiatolás.
Para que isso aconteça, Netanyahu simplesmente tem que sair com seu governo supremacista, que está colocando em risco uma estrutura de alianças que dificilmente Israel conseguirá recuperar. Uma enorme culpa histórica. Com o acréscimo de uma guerra em Gaza que contradisse todas as doutrinas militares israelenses e que é estendida sem nenhum propósito, descarregando-se sobre uma população civil submetida a gravíssimos sofrimentos.
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