19 Novembro 2020
O time de Susan Trumbore, chefe do Instituto Max Planck de Bioquímica, estuda para entender como e quanto CO2 é absorvido pelas plantas e pelo solo. E encontrar soluções para o aquecimento global.
Árvores e solo são aliados preciosos na batalha contra o aquecimento global, mas entender quanto CO2 podem retirar da atmosfera não é fácil. São necessários estudos como os de Susan Trumbore, pesquisadora que dirige o Instituto Max Planck de Bioquímica em Jena, Alemanha, e professora de ciências ambientais na Universidade da Califórnia. Pelos resultados obtidos na estimativa de dióxido de carbono conservado nos continentes, Trumbore ganhou recentemente um dos quatro prêmios Balzan no valor de 700.000 euros para a pesquisa, metade dos quais com jovens cientistas.
A entrevista é de Giuliano Aluffi, publicada por La Repubblica, 12-11-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Professora Trumbore, como nasceu sua paixão pelo meio ambiente?
Quando criança eu morava perto de um bosque e sempre gostava de brincar lá. Então me lembro que certa vez, quando eu tinha 11 anos e era o primeiro Dia da Terra, junto com meu irmão nos juntamos aos voluntários para limpar um parque local e ficamos surpresos pela quantidade de lixo que coletamos. Então, na década de 1970, me apaixonei pela causa ambiental.
E quanto ao seu interesse pela ciência?
No segundo grau tivemos um curso de Ciências da Terra, algo incomum para as escolas estadunidenses daquela época. O que me fascinou foi pegar uma pedra e poder contar como ela se formou e de onde veio. Diferente de outras matérias, onde você podia simplesmente memorizar informações e usá-los nas provas, com a ciência ambiental você tinha que reconstruir uma história e fornecer as evidências de apoio: na prática, você tinha que pensar mais. E eu gostava disso.
Por que o estudo do ciclo do carbono é importante no combate ao aquecimento global?
A principal pergunta da minha pesquisa é: quanto tempo leva para um átomo de carbono deixar a atmosfera e se fixar em uma planta, por meio da fotossíntese? E quanto tempo leva para esse carbono se mover pela planta e solo para depois retornar à atmosfera? Essa é uma pergunta importante, pois nos orienta em nossas tentativas de armazenar CO2 na vegetação e nos solos, tentando fazer com que ele retorne à atmosfera o mais tarde possível. Isso nos ajuda a entender que processos conseguem reter carbono nas plantas e no solo, para que possamos estudar formas de potencializar esses processos.
Quais processos permitem armazenar carbono no solo por mais tempo?
Um exemplo são os materiais carbonosos obtidos pela degradação térmica da biomassa. Eles não ficam no solo para sempre, mas dependendo de sua composição química e de alguns outros fatores, podem reter carbono no solo por curtos períodos ou por centenas e talvez até milhares de anos. Porque esse biochar [1] obtido das biomassas permanece no solo por mais tempo antes de se decompor do que os materiais orgânicos que não foram carbonizados.
Outra ideia parte do fato que o carbono que, na natureza, permanece por muito tempo no solo, costuma estar associado a minerais. Ele se acumula muito lentamente, mas pode permanecer no solo por muito tempo. A ideia é retirar o CO2 da atmosfera e fixá-lo formando esses minerais a partir de rochas pulverizadas, como basalto, e espalhadas no solo.
Na natureza essa transformação do CO2 em bicarbonato ocorre quando a chuva, em tempos de milhões de anos, fragmenta as rochas. O uso de rochas pulverizadas acelera o processo e esse pó de rocha fornece mais nutrientes para as plantas, permitindo reduzir o uso de fertilizantes. E os minerais que se formam podem armazenar carbono por centenas de anos.
E para escolher entre essas estratégias é útil conhecer o ciclo do carbono ...
Por exemplo, se uma planta tem raízes onde o carbono pode ser armazenado por centenas de anos, então essa é uma solução interessante. Se, por outro lado, as raízes são menos longevas, o carbono que elas continham ainda poderia permanecer por muito tempo no solo na forma de matéria orgânica, em vez de ser liberado. Não existe uma única solução. Existem alguns lugares onde as árvores podem ser replantadas para armazenar CO2 enquanto viverem. Em outros lugares, no entanto, onde o solo está degradado, é preferível restaurar a matéria orgânica do solo usando carbono para retê-lo no solo e tornar esses solos mais férteis.
Hoje entendemos tudo o que era necessário entender sobre o ciclo do carbono, ou precisamos de novos progressos nessa área?
Ainda há muitas coisas para entender sobre o ciclo do carbono. Hoje sabemos que de todo o CO2 que emitimos, apenas metade é aquele que se acumula na atmosfera. 25% se dissolvem nos oceanos e outros 25% se fixam na terra, mas ainda não sabemos bem aonde. Sabemos que grande parte foi fixada no reflorestamento que ocorreu na Europa e na América do Norte no último século. Estamos supondo que as plantas estão fazendo mais fotossíntese porque há mais CO2 na atmosfera. Mas não sabemos quanto do carbono fixado por uma árvore é usado para o crescimento ou para manter as reservas energéticas para os períodos em que a árvore não pode realizar fotossíntese tanto quanto necessita. E precisamos entender quanto carbono a árvore cede aos microrganismos do subsolo em troca de outros nutrientes.
Por falar em reflorestamento, o que você acha de iniciativas como a Campanha Trilhões de Árvores, que visa plantar um trilhão de árvores até 2050?
Isso pode fazer a diferença. O importante é que as árvores sejam plantadas onde possam sobreviver e crescer. Grande parte do armazenamento de carbono hoje se deve ao crescimento de árvores em áreas que antes já eram arborizadas. É importante contrabalançar os efeitos do desmatamento. Hoje, com florestas que são queimadas em áreas tropicais, adicionamos à atmosfera uma quantidade de carbono que, embora seja apenas um décimo daquele derivado de combustíveis fósseis, ainda assim é significativa.
Também se deve considerar a competição pelo uso da terra: há quem quer plantar árvores para armazenar CO2, há quem quer usar a terra para lavouras úteis para biocombustíveis e, obviamente, quem quer usá-la para a agricultura. Se forem plantadas árvores para obter biocombustíveis, então se terminará liberando CO2 em prazos curtos. Se, por outro lado, se armazenar CO2 em árvores que depois se tornam móveis ou de madeira para casas, então isso vai manter o CO2 armazenado por dezenas e talvez centenas de anos, e é preferível.
Para que serve o "Banco de Dados Global de Solos" que você fundou?
Com o carbono 14, podemos entender quanto tempo o CO2 permanece nos solos e quanto tempo essa duração pode variar dos trópicos às zonas de alta latitude. Isso também nos permite entender o quanto o carbono seja sensível a futuras mudanças climáticas. Por exemplo, quanto os climas mais quentes podem acelerar sua decomposição. Infelizmente esses dados ainda não são amplamente utilizados por quem elabora os modelos climáticos globais. Por isso, com a colaboração de pesquisadores de todo o mundo, estamos construindo um banco de dados global que registra o comportamento carbono no solo em várias áreas do planeta. Como parte deste projeto, publicamos recentemente um estudo na Nature Geoscience, onde sinalizamos que os modelos climáticos do IPCC são um pouco otimistas demais sobre quanto carbono é armazenado no solo em nível global.
[1] Biochar (termo de origem na língua inglesa, a partir de bio- e charcoal, "carvão vegetal"; também chamado 'biocarbono') é o nome que tem o carvão vegetal quando é empregado como correção para o solo. Ou seja, é biomassa de origem vegetal processada por meio de pirólise (Fonte: Wikipedia). Nota do Instituto Humanitas Unisinos – IHU.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
“Clima, é por isso que plantar árvores pode fazer a diferença”. Entrevista com Susan Trumbore - Instituto Humanitas Unisinos - IHU