27 Março 2015
Causas importantes geralmente nascem de opções morais assustadoramente claras. Um sim ou não para a igualdade aos afro-americanos foi o cerne do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos, por exemplo, assim como um sim ou não para a autodeterminação foi a base da descolonização em todo os países em desenvolvimento.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada por Crux, 25-03-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Na medida em que tais causas se desenvolvem, no entanto, as escolhas acabam se tornando complicadas. Acreditar na igualdade não quer dizer que as cotas sejam a melhor forma de se realizá-la, e uma paixão pela independência não implica em saber qual o tipo de relação econômica ou política os países em desenvolvimento deveriam travar com os seus antigos senhores colonizadores.
Hoje, um movimento importante em construção é a luta contra o extremismo religioso e, em particular, o ódio anticristão. O Egito ilustra perfeitamente o fato de que abraçar uma certa causa nem sempre traz consigo uma base clara para se tomar decisões de política externa.
O Egito é um país importante no mundo islâmico, sendo o lar da Universidade de Al-Azhar e de uma importante mesquita que, às vezes, é chamada de o Vaticano Muçulmano. O país também tem uma minoria considerável de cristãos coptas, uma das maiores e mais tenazes comunidades cristãs na região, e hoje uma das mais aguerridas.
Dois recentes casos ilustram a dinâmica singular que os coptas enfrentam. Há alguns anos, o Egito adotou uma legislação contra “o desprezo da religião”, até então executada exclusivamente contra os cristãos.
Todavia, no dia 22 de março uma sentença foi dada pela primeira vez contra um ramo radical islâmico.
Um Tribunal de Cassação confirmou uma pena de 5 anos de prisão para o Xeique Ahmed Mohamed Mahmoud, conhecido também como “Abu Islã”, por queimar, em 2013, um exemplar do Bíblia em protesto contra a deposição do presidente Mohamed Morsi, que havia sido apoiado pela Irmandade Muçulmana.
Durante o julgamento, Abu Islã não escondeu o seu desprezo, referindo-se ao Papa Tawadros, de Alexandria, líder dos coptas, como “politeísta, pagão, alguém que incentiva a luta sectária”.
Do ponto de vista da liberdade de expressão, pode-se questionar a criminalização do “desprezo religioso”, mas a sentença foi, pelo menos, um importante sinal de igualdade sob a liderança do presidente Abdel-Fattah El-Sisi, que assumiu o poder prometendo proteger as minorias do Egito.
Um tal passo, combinado com a percepção do Egito como um parceiro na luta contra o terrorismo islâmico, pode sugerir que os países ocidentais devam aumentar o apoio a El-Sisi. No começo deste mês, vários Estados do Golfo anunciaram um pacote de ajuda de U$ 12 bilhões para o Egito, com o governo Obama se recusando a oferecer assistência econômica ou militar extra.
Há sérias interrogações relativas ao histórico dos direitos humanos do Egito sob o governo de El-Sisi e, em particular, sobre se o compromisso dele de manter seguros os cristãos tem base sólida para se apoiar.
Nas últimas semanas, vários cristãos coptas que perderam suas casas após ataques de radicais muçulmanos foram informados – por aquilo se chama de “Reuniões de Reconciliação Costumeiras” – de que não terão permissão para retornar. Na legislação egípcia, baseada na tradição beduína, estas sessões com os líderes tribais substituem processos civis e criminais como um meio de resolver disputas.
Nas partes do país controladas pela Irmandade Muçulmana, estes encontros normalmente são um conluio entre militantes, a polícia e as forças de segurança que serve para negar justiça aos cristãos.
Em meados de março, uma destas assembleias tratou do caso de uma família de cristãos que havia sido atacada por vizinhos muçulmanos. Segundo a Mideast Christian News, o resultado foi a cobrança de uma considerável multa contra a família cristã e, quando não puderam pagar, 100 dos camelos e 5 outros animais da família foram abatidos e a sua propriedade, de 1 mil metros, foi apreendida.Em tese, tudo isso aconteceu com a aprovação do vice-diretor de segurança do Cairo, o Maj. Gen. Yehia Al-Iraqy.
Para ser sincero, o fato de que os tribunais, os militares e a polícia toleram tais desigualdades gritantes pode dizer mais sobre o medo deles de uma insurgência muçulmana do que de algum preconceito anticristão real. No entanto, o fracasso em agir aqui acaba escoando as preocupações dos que argumentam dizendo que os países ocidentais não deveriam dar um cheque em branco ao Egito.
El-Sisi goza de um forte apoio da maioria dos coptas, que veem um governo central apoiado pelos militares como a única chance se sair contra a teocracia islâmica. Por outro lado, é difícil sustentar que este seu regime seja um modelo genuíno de tolerância religiosa.
Nada disso fornece uma resposta clara para qual deveria ser a política ocidental, mas ilustra que os defensores dos novos mártires cristãos, incluindo o Papa Francisco e outros do Vaticano, precisam fazer mais do que publicar apelos emocionais.
Também há um trabalho difícil a ser fazer em termos de descobrir o que significa manter seguro os cristãos, quando se vê diante de um conjunto falho de opções de política externa e, nesse respeito, o Egito é um grande teste.
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Egito e as complexidades de se manter seguros os cristãos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU