Paulo VI na encruzilhada entre mediação e realismo. Artigo de Andrea Riccardi

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12 Março 2015

A responsabilidade pela morte de Aldo Moro é totalmente daqueles que o mataram. No entanto, um catolicismo pós-conciliar tão vivaz, que falava tanto de profecia, se encontrou atônito, quase escondido atrás de um papa sozinho e doente, preso entre exigências conflitantes.

A opinião é do historiador italiano Andrea Riccardi, fundador da Comunidade de Santo Egídio e ex-ministro italiano, em artigo publicado no jornal Corriere della Sera, 10-03-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

A Comissão Moro interrogou o núncio Mennini: o jovem padre amigo de Moro, para alguns, confessor do estadista na prisão das Brigadas Vermelhas. O interrogatório despertou novamente o interesse pelo trabalho da comissão, da qual não se esperam grandes novidades, depois de nada menos do que cinco processos e a comissão de massacres (ativa por 13 anos). Mennini reiterou que não havia confessado Moro, como testemunhou já sete vezes.

Na realidade, esses testemunhos não são capazes de iluminar as zonas de sombra daqueles dias dramáticos. Ao contrário, é a tarefa da pesquisa histórica. A figura de Mennini recorda o problema do mundo católico diante do sequestro de um dos seus filhos mais ilustres.

O jovem padre, na época, dependia do vigário de Roma, Poletti, que mantinha as relações entre Paulo VI e a família Moro, comprometido em salvar a vida de Aldo. Da prisão, Moro olhava para Paulo VI, como um terceiro ator em relação ao "governo da firmeza", para mediar com as Brigadas Vermelhas, talvez interessadas em um reconhecimento.

Ele contava com o "humanitarismo" católico, com a diplomacia e com a subjetividade internacional vaticana. O seu modelo era a libertação de Giuliano Vassalli pelas SS, pedida por Pio XII em Roma ocupada pelos nazistas.

Paulo VI, ao contrário, estava restringido entre a ansiedade de salvar Moro e a vontade de não desestabilizar o governo. Andreotti vigiava sobre este último aspecto em contato com o secretário do papa, Macchi: "O Vaticano nunca pediu que se tratasse do caso", declarou o líder da Democracia Cristã.

Talvez não tenha sido exatamente assim. Montini tentou ampliar ao máximo o espaço do possível. Resta a interrogação sobre quanto o problema italiano, representado por Andreotti, não tenha levado o papa à autocensura na ação.

O cardeal Confalonieri confidenciou ao vaticanista Benny Lai: o Vaticano estava dividido entre firmeza e negociação ("O Santo Padre gostaria dessa segunda solução"). Moro também esperava isso: "Uma solução mediadora", para além da razão de Estado.

No Vaticano, havia uma grande aflição – segundo o escritor Giancarlo Zizola, que relatava a voz de uma tentativa de sequestro do secretário de Estado, Villot. Era a atmosfera surreal de Roma naqueles dias de impotência. Mas não faltaram iniciativas vaticanas: os contatos com os brigadistas presos mediante os capelães, um telefone para a Cáritas Internacional para receber mensagens, a coleta de 10 bilhões para o resgate... Nada serviu.

Os católicos, ao contrário, estavam inertes. Os Laureados Católicos, ramo da Ação Católica próximo de Moro, foram para o lado da firmeza. Não era questão de progressistas ou conservadores. Vê-se isso a partir de uma carta, publicada no Lotta Continua o dia 19 de abril de 1978 (um mês depois do sequestro), em que se pedia para tratar do caso. Havia sido assinada pelos líderes da Ação Católica Mario Agnes (com o consentimento vaticano), por vários bispos (incluindo alguns auxiliares de Poletti), por um grupo de dossettianos, Carlo Bo e Turoldo.

Depois, veio a carta do papa às Brigadas Vermelhas do dia 22 de abril de 1978, que definiu a posição da Igreja. Um texto comovente, escrito pelo papa ("Peço-lhes de joelhos"), em que, no entanto, havia um claro limite quando se pedia a libertação de Moro "simplesmente, sem condições". No texto assinado pelo papa, outra grafia rasurou "Sem qualquer condição embaraçosa". Talvez tenha sido Macchi. Andreotti viu o texto primeiro.

Apesar da grande inspiração, a posição era clara. O papa não mediava entre Estado e Brigadas Vermelhas. Não deixava o governo sozinho. Foi um doloroso realismo diante da decisão das forças políticas italianas, que não viam alternativas.

Moro se sentiu abandonado e escreveu para Mennini: "O papa não podia ser um pouco mais penetrante? Esperemos que tenha sido sem dizer". E ainda: "O papa fez muito pouco: talvez terá escrúpulos".

A responsabilidade pela morte de Moro é totalmente daqueles que o mataram: deve-se reiterar. Nota-se, no entanto, que um catolicismo pós-conciliar tão vivaz, que falava tanto de profecia, se encontrou atônito, quase escondido atrás de um papa sozinho e doente, preso entre exigências conflitantes.

Gaetano Afeltra viu o papa celebrar o funeral de Moro em Latrão e comentou com Zizola: "Você ouviu a voz? Uma voz do outro lado do túmulo. Com Moro, ele também morreu um pouco". Ele morreu no dia 6 de agosto, três meses depois.

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