12 Janeiro 2015
Mas do que estamos falando? Muitas vezes, são os modos de dizer que revelam, na sua vagueza, mais do que escondem. Eles mostram ter confiança na capacidade da linguagem comum para nos levar na direção da verdade mais do que muitos discursos filosóficos em sentido estrito. Mais de dez anos atrás, no dia 9 de março de 2004, um grande pensador como Raimon Panikkar e um importante filósofo como Emanuele Severino, se encontram em Veneza. Discutem entre si e com o público; não é evidente que chegarão à mesma conclusão, mas discutem. Hoje, a editora (Jaca Book, com introdução de Luigi Vero Tarca, organizado por Milena Carrara Pavan) intitula o debate de então como Parliamo della stessa realtà? Per un dialogo tra Oriente e Occidente [Falamos da mesma realidade? Por um diálogo entre Oriente e Ocidente], explicitando os motivos daquela discussão: a realidade última.
A reportagem é de Riccardo De Benedetti, publicada no jornal Avvenire, 07-01-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Na verdade, para Panikkar, não é que importe muito justificar o diálogo, no sentido de que ele assume como evidente, necessário, inevitável o fato de que voltar sobre as suas razões é argumento ocioso e inútil. Ao contrário, é Severino que dá conta do Ocidente e da sua "loucura", que distingue os seus efeitos, que tenta entrever o seu fim ou o seu cumprimento; em suma que se preocupa com muitas coisas, demais, que acontecem na "história do Ocidente" e no pensamento que se deveria ter dela. Por exemplo, a angústia pelo tornar-se outra coisa, a instabilidade radical do mundo e dos seres que, enquanto isso, existem apenas porque desaparecem.
Isso leva o homem ocidental a pensar um mundo no qual verdades definitivas e entes imutáveis não podem existir por medo do limite que colocam à sua vontade de poder. Não foi talvez o Zaratustra de Nietzsche que se perguntou o que lhe restaria para criar se existissem os deuses? Portanto, fora os deuses (e aqui pensamos no cristianismo); depois, fora o próprio Deus (e aqui pensamos no Iluminismo e na razão dominante); se, contudo, a situação permanece não justamente a melhor, o golpe de misericórdia é dado pela Técnica.
Mais do que um domínio (que Panikkar contestará em poucas piadas fulgurantes: "En passant, depois, foi dito que hoje domina a técnica. Eu não sabia! [...] Ela não me domina. [...] Certamente, fui forçado a tomar o trem e depois o ferry para chegar aqui, mas não me sinto dominado por isso"), para Severino trata-se da própria forma assumida pelo pensamento grego. Ela é responsável por aquela queda que, aos homens enganados, parece ser um crescimento ilimitado pelo seu próprio poder. E, como tal, inevitável.
Não só isso, mas a esse movimento louco do Ocidente, também colabora o cristianismo e o seu alimento eucarístico: "Come-se o Deus para se apossar da sua santidade". É desse modo que a fé eucarística se torna a contribuição muito particular e eficaz do cristianismo para a fé na capacidade humana de se tornar outro e, portanto, ao movimento incessante de perda do ser em vantagem do devir. Assim, fim da história. Esperamos que o cadáver do Ocidente passe pelo rio do ser que aguarda, imóvel, a extinção da loucura (a imagem paradoxal é quase uma obrigação).
Panikkar, teólogo, mas nem por isso menos filósofo, na encruzilhada de diferentes tradições de pensamento, das quais ele não revoga a validade em vantagem de nenhuma, embora mantendo intactas as prerrogativas das diferenças recíprocas, responde com algumas linhas de extraordinária clareza: "A eucaristia [...] não é verdade que a tomamos para nos tornarmos Deus. Eu como pão para que o pão se torne 'eu', não para que eu me torne pão. Tomo a eucaristia não para me tornar Deus-outro, mas para que esse Deus-outro (que não é 'outro') possa se tornar 'eu', ser em mim. Portanto, quando eu como o pão, quando eu bebo o vinho, eu não quero me tornar nem pão nem vinho: eu quero que o pão e o vinho se tornem eu".
Como se poderia dizer melhor a distância entre o suposto destino do Ocidente e o do cristianismo? Por que querer identificá-los a todos os custos sob o signo da Técnica? Por que atribuir a um os efeitos do outro e vice-versa, em um jogo em que, no fim, é a inevitabilidade de um processo (além disso, levado continuamente a julgamento por um ostensivo Parmênides) que leva a melhor?
Não só, mas a objeção que Panikkar move a Severino é radical: "A angústia do tornar-se outro sobre a qual se falou, e que caracteriza o Ocidente de modo evidente, não é a mesma coisa que a não angústia do 'tornar-se si mesmo'". Aqui, até, Panikkar defende Nietzsche de si mesmo: de fato, não foi o alemão morto na demência que escreveu "como se torna aquilo que se é"? Bem diferente de se tornar outro-de-si!
Em suma, mas de que estamos falando? Ora, seria bastante difícil e, no fim das contas, equivocado atribuir a esse debate entre duas grandes figuras da reflexão filosófica as respostas definitivas que se esperam das suas grandes obras. Mas, como Luigi Vero Tarca justamente não deixa de nos assinalar na introdução, alguns pontos decisivos foram tocados. E, se ambos defendem "a especificidade daquilo que os diferencia", ao público dos leitores é dada, ao menos, a possibilidade de entender ambas as posições em uma clareza que nunca alcança banalização.
Seis anos depois daquele debate, Raimon Panikkar morria na Catalunha, depois de uma experiência intelectual entre as mais intensas e vivazes do século passado, partícipe de culturas e de teologias as mais diversas. A continuação desse encontro, por mais desejado que fosse, não foi possível, embora retomá-la na forma do livro de relançar os seus significados é uma variante contemplada pelo diálogo e, de algum modo, cumpre o próprio desejo.
A verdadeira homenagem que o grande teólogo ofereceu ao filósofo, mas também aos leitores que podem discordar ou aderir à sua tese, é condensada nesta frase, que deve ser lida e guardada na memória todas as vezes que se discute: "A crítica que Severino faz me parece muito justa, mesmo que errada!, mas muito justa. Eu não estou fazendo uma piada. Digo 'justa' porque dá razão da sua crítica profunda: vai realmente às raízes, e a sua voz deve ser ouvida".
Escuta-se o outro quando se vai à raiz do outro encontrando-se a si mesmo, tornando-se a si mesmo.
- Luciano Luisi. Altro fiume, altre sponde. Ed. Aragno, 128 páginas.
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Oriente e Ocidente: diálogo possível? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU