11 Abril 2014
A Conferência Episcopal Francesa cancelou uma conferência que Fabienne Brugère iria proferir aos responsáveis diocesanos da pastoral da família, depois das pressões de grupos ultracatólicos. Sobre isso, conversamos com Dom Claude Dagens, bispo de Angoulême, membro da Academia Francesa e membro do grupo de trabalho sobre "a indiferença religiosa e a visibilidade da Igreja", da Conferência Episcopal Francesa.
A reportagem é de Philippe Clanché, publicada no sítio da revista Témoignage Chrétien, 08-04-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
O que o senhor pensa das críticas levantadas contra essa filósofa?
Eu não li os seus textos. Ouvi dizer que o seu livro La Politique de l'individu (Seuil) é um válido livro de filosofia política sobre os excessos da individualização e do esquecimento dos valores da solidariedade na nossa sociedade comercial. O tom é o de muitos filósofos amplamente acolhidos nos ambientes católicos, como Marcel Gauchet. Tudo o que eu li sobre o "gênero" me dá a impressão de ideias bastante vagas e maleáveis. Mesmo os seus autores evoluem. Não se trata de uma teoria imutável.
O que significa esse ataque dos ultracatólicos?
Estamos em plena guerrilha ideológica, e recuso-me a entrar nela. Assim como eu digo não aos discursos "sociologizantes" que reduzem o cristianismo a nada, eu recuso a instrumentalização ideológica de um catolicismo que não é verdadeiramente cristão. Duas interpretações do cristianismo se contrapõem. Ou Deus é o antimal, e o campo do bem faz guerra no campo do diabo; e Deus é mais o ditador supremo do que o pai do filho pródigo. Ou acreditamos que "Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para condenar o mundo, e sim para que o mundo seja salvo por meio dele" (Jo 3, 17). Em relação a algumas pessoas que reivindicam um catolicismo duro, implacável, intransigente, não temos o mesmo Deus. É preciso admitir isso.
O que o senhor pensa da decisão de cancelar essa intervenção?
Foi uma resposta a abaixo-assinados, a denúncias anônimas. Esse procedimento, inadmissível, era praticado pelos antimodernistas do início do século XX. Na Evangelii gaudium, o Papa Francisco lamenta que essas queixas cheguem a Roma e pede que sejam tratadas pelos bispos. Neste caso, eles não foram consultados. Dom Pontier e os membros do serviço "Família e Sociedade" finalmente cederam à pressão. Nunca podemos nos curvar diante de lógica do terror. Algumas pessoas vão se orgulhar do seu suposto "triunfo" diante dos bispos franceses.
O que o senhor faria?
Eu manteria a conferência programada e proporia aos contestatários um debate com calma, não no campo das denúncias, mas sim da razão. Depois de ouvi-los, lhes pediria que escutassem as pessoas que não compartilham a integralidade da fé católica. Nós vivemos isso nas nossas famílias, com os nossos amigos. Nós nos encontramos, nos explicamos e tomamos o tempo para nos compreender, nos aceitar e, na medida do possível, nos perdoar. Mas, com denunciadores anônimos, a cultura do encontro, cara ao Papa Francisco, parece difícil.
E então?
O mal está feito. O assunto será necessariamente abordado em Lourdes durante a nossa reunião de abril. Cada um de nós tem a sua liberdade. Mas, se a indicação é simplesmente de ser gentil, não sairemos disso. Por toda a França, a população é afetada principalmente pelo desemprego e pela multiplicação de situações de precariedade. Devemos formar uma Igreja que cure as feridas e reaqueça os corações, diz o Papa Francisco, convencido de que Deus está trabalhando na vida de todos os seres humanos. O padre Congar dizia: o Espírito Santo é dado à Igreja para enfrentar situações novas, de maneira cristã e inteligente, não para repetir o discurso do passado. Que a experiência nos sirva de lição.
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''A Igreja não deve ceder a uma lógica do terror", reage bispo frente à pressão de grupos ultracatólicos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU