07 Janeiro 2013
Os clérigos que voltam a ser centrais na vida da Igreja em uma sociedade cada vez mais secularizada. Como se fosse a cura, e não uma causa do mal, ou, melhor, da dificuldade que ao menos no Ocidente a própria Igreja registra na sua relação com o mundo moderno.
A reportagem é de Roberto Monteforte, publicada no jornal L'Unità, 29-12-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Esse é o paradoxo que, a 50 anos da abertura do Concílio Vaticano II e às vésperas do Ano da Fé para a evangelização, desejado pelo Papa Bento XVI, Gianfranco Svidercoschi denuncia no seu último livro, Il ritorno dei chierici [O retorno dos clérigos] (EDB, 141 páginas).
O autor, que foi cronista dos trabalhos conciliares e que, como vice-diretor do L'Osservatore Romano, acompanhou com grande atenção as mudanças vividas pela Igreja Católica, não esconde a sua preocupação, sobretudo com um ponto: a discussão da centralidade do "Povo de Deus" na vida da Igreja. Aquela que ele apresenta como uma das novidades mais significativas introduzidas pelo Concílio Vaticano II, porque o reconhecimento da contribuição e do testemunho de vida cristã que cada batizado – do papa aos bispos, do clero aos leigos –, embora na diversidade dos papéis, é chamado a dar, muda profundamente o modo de ser da Igreja, a sua relação com a realidade.
Svidercoschi lembra as mudanças significativas introduzidas na liturgia, como o uso da língua vernácula ou o papel ativo atribuído à assembleia durante as celebrações, até a instituição dos conselhos pastorais nas dioceses e dos conselhos paroquiais: todas mudanças que tendem a valorizar a contribuição essencial e não mais subalterna dos leigos na vida das comunidades cristãs.
Para quem tem menos de 50 anos, é difícil imaginar o que era uma missa nos anos 1960. O autor também ressalta os excessos que houve nessa "modernização", acabaram alimentando as críticas dos opositores à reforma que, aguerridos, haviam combatido durante as sessões conciliares e mesmo depois, resistindo e condicionando as aplicações da linha conciliar.
Houve, de fato, quem quisesse fechar aquelas portas e aquelas janelas abertas ao novo que João XXIII, com coragem e confiança, havia desejado escancarar. Daí, para o autor, gerou-se um contraste tão profundo a ponto de marcar como que uma linha divisória entre dois modos diferentes de ser Igreja.
De um lado, aquela parte da hierarquia que se sente depositária exclusiva da verdade e que se vê marcada por "um ressurgente e perigoso clericalismo, por uma autoridade que muitas vezes degenera em puro poder", que prefere julgar em vez de amar e apoiar o ser humano contemporâneo, com as suas solidões, fraquezas e contradições. Um modelo – fato grave – que fez prosélitos até mesmo entre o clero jovem e que não se põe em escuta à sociedade contemporânea e a serviço do ser humano.
Mas há também uma outra Igreja, aquela "nascida" há 50 anos do Concílio Vaticano II, "portadora de tantas novidades e esperanças, mas presa na fase evolutiva dos medos e das resistências de uma parte da hierarquia eclesiástica".
Essa é a denúncia que move o autor, que recorre à expressão usada por Karl Marx no Manifesto do Partido Comunista: "Há um fantasma que vagueia na Igreja Católica", para lançar o seu alerta contra o retorno do poder dos clérigos.
A denúncia é forte e é motivada por um grande amor pela Igreja. Para Svidercoschi, de fato, é justamente esse poder que põe em crise a credibilidade e a capacidade da Igreja de se relacionar com a sociedade contemporânea: é a instituição clerical que defende a si mesmo e a sua suposta supremacia. Que quer o leigo crente em uma posição subalterna. No máximo, "cooptado". Mas sempre dentro de lógicas clericais. Cada vez menos "autônomo" e responsável pelas suas escolhas. Entre os efeitos negativos desse desvio clerical, o autor coloca o escândalo dos padres pedófilos, mas também a página não menos devastadora do "Vatileaks".
Tudo negativo? Não. Il ritorno dei chierici também se dá conta dos fermentos positivos presentes na comunidade cristã. Mas, segundo Svidercoschi, o remédio para os males da Igreja é realmente voltar para o Concílio Vaticano II e aplicar o que foi parado. Dar seguimento com coragem à reforma incompleta, para ajudá-la a dialogar com o mundo contemporâneo. Para que saiba ser "companheira de viagem" de uma humanidade em busca de paz, de justiça, de serenidade, que, no fundo, tem uma grande saudade de Deus.
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A retomada clerical põe em risco o Concílio Vaticano II - Instituto Humanitas Unisinos - IHU