Por: Jonas | 20 Outubro 2012
Entre aplausos e com espectadores de pé, o destituído presidente do Paraguai, Fernando Lugo, foi recebido no Estúdio Maior da TV Pública. Numa entrevista destinada à reflexão sobre a América Latina, o ex-chefe de Estado reconheceu erros em seu governo e indicou que a sociedade paraguaia está dividida entre golpistas e democratas. Além disso, confessou não conhecer a verdadeira causa de sua destituição, e antecipou que as leis dirão que é permitida a sua participação nas próximas eleições presidenciais.
A reportagem é publicada no jornal Página/12, 18-10-2012. A tradução é do Cepat.
No marco da estreia do documentário Guerra Guasú, a guerra do Paraguai, e com o objetivo de refletir sobre as possibilidades de justiça e igualdade, mas também dos abismos na América Latina, fazendo eixo com a atualidade do Paraguai, o ex-presidente participou de uma entrevista com o jornalista Pedro Brieger e o historiador Javier Trímboli. Traçando um paralelismo entre a história e o presente, o ex-presidente respondeu sobre os rumores de uma nova Tríplice Aliança entre Brasil, Argentina e Uruguai contra o Paraguai. “Hoje em ida, falar da Tríplice Aliança é apaixonante porque a leitura da história não é linear. O Paraguai está cheio de contradições. Aqueles que hoje pregam que há uma nova Tríplice Aliança contra o Paraguai, depois do golpe de Estado parlamentar, são os que pedem bases militares norte-americanas no Paraguai”, refletiu.
O mandatário – que assumiu a presidência em 2008, e foi destituído em junho deste ano pelo Parlamento – destacou que, em seu caso, houve um golpe de Estado parlamentar sem tanques nas ruas, onde tudo é aparentemente normal, e afirmou que foi um ato jurídico e político. “Mais do que jurídico”, acrescentou. “Hoje a sociedade paraguaia está dividida entre golpistas e democratas. E os golpistas nos querem ensinar sobre democracia”, expressou. Lugo, que respondeu pensativo cada questão, considerou que aos paraguaios “não se engana mais desta forma” e sublinhou que costumam fazer uma leitura e releitura dos fatos, assim como também do que dizem os meios de comunicação. “As pessoas leem que houve outra Tríplice Aliança. A aliança da oligarquia, dos partidos tradicionais e das multinacionais”, acrescentou.
Sobre a rapidez de sua destituição, Lugo expressou que a aliança política atuou desta forma por medo de que as pessoas se amontoassem na praça. Ele explicou o motivo pelo qual não convocou a multidão a se opor diante da decisão. “Este presidente tem a paz em seu DNA. Nossa história está manchada de muito sangue, com golpes de Estado que se sucediam. Poder-se-ia convocar à rebelião, mas Fernando Lugo não iria morrer. Iriam morrer inocentes. Depois de quatro meses, acredito que foi o melhor”, assegurou.
O ex-mandatário também confessou não saber a verdadeira razão de sua destituição. “Dizem que tive um mau desempenho em minhas funções, e acredito que tive um mau desempenho nas funções para a oligarquia paraguaia”, esclareceu. No entanto, conjecturou sobre os motivos que o levaram a esse desenlace. “Primeiro porque foi um governo que teve muitos erros, mas com todos esses erros tínhamos 68% de aprovação. Em segundo lugar, seguir teria sido dar continuidade ao processo de mudança, democrática e participativa”, disse.
Lugo reconheceu que o ocorrido prejudicou o Paraguai e que com esse episódio, e o acontecido em Honduras, a democracia latino-americana foi ferida. Sobre os fatos em seu país foi contundente: “A democracia está ferida. Não se recupera com maquiagem eleitoral”.
Assim mesmo, considerou importante conhecer o que aconteceu no despejo de Curuguaty, fato que desencadeou sua destituição. E reconheceu seu erro por não contar com sustentação política necessária e ter aceitado esse fator com ingenuidade.
Sobre a possibilidade de participar nas eleições presidenciais de 2013, Lugo ressaltou que “poder pode”, e antecipou que “as leis irão dizer que é permitido e politicamente irão dizer que é inviável”.
Depois da entrevista, Lugo participou da inauguração de uma mostra sobre a guerra do Paraguai e, depois, reuniu-se com a presidenta Cristina Fernández. Ao finalizar a inauguração, e antes de partir para o encontro com a mandatária, referiu-se ao denominado presidente do Paraguai, Federico Franco, e à justificativa que deu sobre o aumento de seu patrimônio. “Para mim é um roubo. É muito fácil dizer “equivoquei-me”, mas então que justifique”, disparou. Segundo o jornal Ultima Hora, nos últimos quatro anos, o patrimônio de Franco aumentou de 150 mil dólares, declarados em 2008, para pouco mais de um milhão de dólares, atualmente.
A entrevista com Lugo será posta como um epílogo no documentário Guerra Guasú. A guerra do Paraguai, um documentário com quatro capítulos com uma hora de duração, que busca interromper longos anos de silêncio na produção cultural argentina a respeito da guerra mais importante vivida pela América Latina, e que arrasou o Paraguai do século XIX.
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“A sociedade paraguaia está dividida entre golpistas e democratas”, afirma Lugo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU