O grande milagre de João XXIII

Mais Lidos

  • Elon Musk e o “fardo do nerd branco”

    LER MAIS
  • O Novo Ensino Médio e as novas desigualdades. Artigo de Roberto Rafael Dias da Silva

    LER MAIS
  • “A destruição das florestas não se deve apenas ao que comemos, mas também ao que vestimos”. Entrevista com Rubens Carvalho

    LER MAIS

Revista ihu on-line

Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

Edição: 552

Leia mais

Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

Edição: 551

Leia mais

Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

Edição: 550

Leia mais

Por: André | 17 Outubro 2012

“Mas João XXIII, nadando contra a corrente vaticana, com suas incessantes alocuções matinha vivo entre os bispos renovadores e em todo o povo de Deus o entusiasmo pelo projeto renovador e pedia orações para o seu sucesso. Assim foi como se deu a inversão da maioria em minoria. Isto é para mim um milagre, o grande milagre do Papa João XXIII”, comenta Hilari Raguer, em artigo publicado em seu blog, 14-10-2012. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.

Quando, no dia 11 de outubro de 1962, há 50 anos, João XXIII abriu o Concílio Ecumênico Vaticano II, entre os quase 3.000 bispos ali congregados eram muito poucos os que compartilhavam seu projeto renovador. Mais de um pensava que, já que o Vaticano I havia definido em 1870 a infalibilidade pontifícia, não fazia sentido um concílio: que falasse o Papa, e que se obedecesse.

Depois de anunciar sua decisão, João XXIII fez com que a Secretaria de Estado formulasse uma consulta aos bispos de todo o mundo, perguntando, não se convinha convocar um concílio, pois isto já estava decidido, mas que temas deveriam ser tratados. A resposta do episcopado mundial foi decepcionante.

Muitos não se dignaram a responder e os que o fizeram apontavam temas triviais. Os bispos espanhóis pediam sobretudo uma condenação solene do comunismo e a intensificação do culto e a devoção à Virgem Maria.

Uma avis rara foi o basco Pildain, bispo das Canárias, que pediu que se condenasse “o nacionalismo idolátrico das grandes nações, que viola criminosamente os direitos naturais dos pequenos países e regiões”, e o comunismo, mas também o mamonismo, ou seja, o capitalismo que “nega o que é devido aos operários e aos pobres para buscar exclusivamente o sucesso econômico”.

Döpfner escreveu a Montini (ambos estavam plenamente na linha de João XXIII) perguntando-o com quantos italianos poderiam contar. Montini lhe respondeu que apenas com 30, dentre os 344 prelados italianos. Os espanhóis renovadores eram exatamente 15. Explicou o cardeal Jubany que em uma intervenção a favor da colegialidade disse que falava em nome de 15 bispos espanhóis. No carro de volta ao Colégio Espanhol, onde residiam quase todos eles, um dos chefetes disse irado: “Eu queria saber o nome desses 15 traidores!”.

Logo se perfilaram entre os padres conciliares duas tendências opostas. No começo, os jornalistas falavam de “maioria”, referindo-se aos conservadores, e de “minoria”, em alusão aos renovadores. Mas em muito pouco tempo, apenas umas poucas semanas, a proporção se inverteu e a maioria passou a designar os renovadores, e a minoria os imobilistas, e essa segunda terminologia se manteve até o fim do concílio. Como se deu esta inversão?

Os setores próximos à cúria boicotaram o concílio desde o começo. O L’Osservatore Romano do dia seguinte ao anúncio ocultou a notícia eclesiástica do século, que havia passado à primeira página da imprensa mundial. O jornal oficioso vaticano reservou apenas um quadro para a nota da Secretaria de Estado que anunciava as três decisões do Papa: um sínodo diocesano de Roma, o concílio ecumênico e a reforma do código de direito canônico, mas sem nenhuma manchete. Alguém de muito acima deve ter estimado que aquilo era uma loucura do Papa ancião, impossível de realizar, e que quanto menos se falasse disso, melhor.

No período preparatório, as comissões criadas eram como um desdobramento das congregações romanas, e os esquemas que prepararam para serem submetidos à assembleia conciliar reiteravam a doutrina e a disciplina tradicionais. Iniciado o concílio, os bispos conservadores contaram com o suporte da cúria e particularmente de dom Pericle Felici, secretário-geral do concílio, que favorecia os imobilistas no acesso à palavra, de modo que parecia que eram muito mais, até que uma votação deixou claro que eram uma pequena minoria.

Mas João XXIII, nadando contra a corrente vaticana, com suas incessantes alocuções matinha vivo entre os bispos renovadores e em todo o povo de Deus o entusiasmo pelo projeto renovador e pedia orações para o seu sucesso. Assim foi como se deu a inversão da maioria em minoria. Isto é para mim um milagre, o grande milagre do Papa João XXIII.

Bom Papa João: olha como mudou o episcopado depois que foste!

Comunicar erro

close

FECHAR

Comunicar erro.

Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

O grande milagre de João XXIII - Instituto Humanitas Unisinos - IHU