15 Junho 2012
Há um ar de cisma. Passaram-se cinco séculos, mas a história se repete. Adaptando-se em parte às exigências da modernidade. E, desta vez, é a Igreja Anglicana que ameaça a divisão. Não mais com Roma, mas com a sua Londres, não mais com o papa, mas com David Cameron, conservador que, de repente, decidiu não conservar.
A reportagem é de Andrea Malaguti, publicada no jornal La Stampa, 13-06-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
No centro do confronto, o tema não mudou: o casamento. Para garantir a seu próprio (o segundo) com Ana Bolena, Henrique VIII, em 1534, assinou o Ato de Supremacia – "O Rei é o único chefe da Igreja da Inglaterra" –, fechou e saqueou os mosteiros e pisoteou o título de "Defensor Fidei" que lhe foi reconhecido por Clemente VII pelo seu confronto com Lutero (mas uma coisa, como se sabe, são as batalhas de princípio; outra coisa, são as pessoais).
Para permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo, o governo Tory se confiou a uma consulta popular que irá encerrar na próxima quinta-feira e será discutida na Câmara dos Comuns na sexta-feira. Vocês são favoráveis aos gay marriages? Um plebiscito: 550 mil súditos de Elizabeth deram o seu assentimento a essa nova revolução. Pequena, inevitável e já na prática para a coletividade, assustadora e inaceitável para a alta hierarquia eclesiástica. "Podemos nos ver forçados a não celebrar mais casamentos em nome do Estado", informou o arcebispo de Canterbury, Boom.
Theresa May, severa ministra do Interior, salientou que a escolha do governo não obrigaria nenhuma Igreja a celebrar matrimônios contra a própria vontade. "Simplesmente restabeleceria um plano de igualdade". As explicações não adiantaram.
O compreensivo reverendo Tim Stevens, bispo de Leicester, se encarregou de expor as posições da Igreja Anglicana. "Em um momento em que os matrimônios estão em crise e estamos tentando manter a tradição, uma escolha desse tipo seria prejudicial", disse. "Com isso, se alteraria a natureza intrínseca do matrimônio como união entre homem e mulher. como sancionada pelas organizações humanas ao longo da história e pelos nossos cânones".
Pode parecer a visão bizarra de quem considera os casamentos gays não um autêntico ato de amor, mas só a tentativa decrépita de dois homens ou de duas mulheres de movimentar a suposta monotonia das suas frequentações. Na verdade, por baixo disso, há um mundo de fé, poder e frágeis equilíbrios.
Hoje, as diferenças entre uma união civil e um matrimônio se reduzem a pouca coisa. Sobre as pensões, herança, bens compartilhados, as obrigações e os direitos são idênticos. Mas os casamentos são sancionados com um sim; as uniões civis, com uma assinatura. Sobretudo os casamentos são celebrados em um local de culto, com tudo o que implica a sacralidade. Se não é mais o sacerdote que é o titular das regras que permitem a união eterna, então o seu papel é inútil.
"É uma leitura equivocada. Não nos preocupamos com isso, mas apenas com o fato de que homem e mulher são diferentes. O governo confunde igualdade com homologação. Mais de uma Corte Europeia poderia nos obrigar a celebrar contra a vontade", afirma Stevens. O governo desmente: "Esse risco não existe".
Mas a questão permanece controversa. Os ativistas dos direitos humanos atacam: "A Igreja diz que essa é a mais grave desordem nas relações com o Estado desde o saque dos mosteiros. A verdade é que eles são mestres do melodrama e da intimidação", diz Ben Summerskill, responsável pelos ativistas de Stonewall, enquanto para o Conselho Muçulmano da Grã-Bretanha "a proposta não ajuda e não é necessária". Mas não está claro "quem" não ajuda e não "a quem" não serve. Ou talvez esteja muito claro.
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Londres perto do ''sim'' ao casamento gay. Igreja anglicana se insurge - Instituto Humanitas Unisinos - IHU