A tão esperada aposentadoria do cardeal Law

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26 Novembro 2011

Bernard Francis Law, ex-arcebispo de Boston, deixou o cargo de arcipreste da Basílica de Santa Maria Maior. É o fim da parábola de um cardeal muito poderoso em seu tempo, execrado nos Estados Unidos por ter encoberto padres pedófilos durante anos e por ter sido recompensado, depois, pelo Vaticano com um cargo honorífico.

A reportagem é de Marco Politi, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 23-11-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Law, que, apesar dos protestos das organizações norte-americanas de vítimas dos abuso clericais, ainda participou no conclave de 2005, do qual Joseph Ratzinger saiu como papa, tornou-se o símbolo daquela prática criminosa das transferências de paróquia em paróquia dos padres pedófilos, que provocou dezenas de milhares de vítimas na Igreja Católica. Uma prática que Bento XVI condenou na sua Carta aos Católicos Irlandeses de março de 2010, como efeito de uma "preocupação inoportuna pelo bom nome da Igreja e para evitar escândalos".

Para evitar escândalos, Law deslocou de ponto a ponto na sua diocese de Boston o padre John Geoghan, um pedófilo serial culpado de ter abusado de mais de cem menores (e, depois, acabou estrangulado na prisão). Ele não era o único caso. O clamor provocado pelo processo foi tal que, depois de uma cúpula dos bispos norte-americanos no Vaticano, em 2002, o cardeal Law foi forçado a renunciar. Foi então que o episcopado norte-americano sancionou a linha da tolerância zero, isto é, da expulsão imediata do clero dos responsáveis de abusos, até porque o câncer dos encobrimentos havia se manifestado em inúmeras dioceses dos EUA, provocando uma onda de processos que infligiram enormes penalidades à instituição eclesiástica.

Law deveria ter se retirado para um mosteiro, mas, por decisão de João Paulo II – entre ardentes protestos nos Estados Unidos –, ele foi chamado a Roma, em 2004, com o cargo de arcipreste de uma das quatro basílicas patriarcais da capital italiana. Uma ofensa à sacralidade desses antiquíssimos lugares de culto.

Como arcipreste de Santa Maria Maior, o cardeal norte-americano teve a honra, em 2005, de celebrar uma das missas solenes para o falecido Papa Wojtyla. O pretexto da aposentadoria-remoção de Law, prontamente substituído por Bento XVI, está no cumprimento dos 80 anos. Na realidade, ele poderia continuar exercendo o cargo honorífico, mas ele representava uma contínua fonte de embaraço para a Santa Sé. E, no entanto, o purpurado ainda continua sendo agora um símbolo das contradições da estratégia vaticana contra os abusos sexuais cometidos nas instituições eclesiásticas. Bento XVI, com a sua Carta aos Irlandeses, indicou inequivocamente que a preocupação da Igreja deve se focalizar nas vítimas.

Ele endureceu as normas vaticanas para a repressão do fenômeno. Intimou os episcopados de todo o mundo a preparar, para a primavera [europeia] de 2012, "linhas-diretrizes" nacionais para enfrentar o fenômeno. Expressou "vergonha" pelas responsabilidades da Igreja e, mais de uma vez, nas suas viagens, ofereceu seus pedidos de desculpa a delegações de vítimas. Ainda recentemente, o "procurador-geral" do Santo Ofício, monsenhor Charles Scicluna – em uma conferência no Senado –, reforçou a necessidade de denunciar os "abusos do poder sacro", sem se deixar obstaculizar por "considerações fora de lugar de lealdade e de pertença". Scicluna também sublinhou o dever das autoridades eclesiásticas de "cooperar com as autoridades civis".

No entanto, o Vaticano continua mantendo fechados os seus arquivos, impedindo uma séria investigação sobre os encobrimentos do passado, nem deu a indicação a todos os episcopados de dar início a investigações para descobrir delitos cometidos há décadas sob o manto do silêncio. Acima de tudo, a Santa Sé não intimou os bispos de todas as nações a denunciar imediatamente à polícia e às procuradorias os responsáveis por atos de abuso. "Cooperar" a partir de um escândalo explodido é uma coisa; denunciar é outra.

Enfim, continua sendo injustificável a atitude de inércia da Conferência Episcopal Italiana (CEI, que depende estreitamente do papa) com relação às iniciativas já assumidas por outros episcopados europeus. Na Itália, não existe um número gratuito da CEI ou das dioceses, ao qual as vítimas possam recorrer. Não há um bispo oficialmente encarregado do dossiê-pedofilia. Não foi aberta uma investigação nacional para lançar luz sobre os abusos. Na assembleia da CEI de 2010, os líderes comunicaram que, na Itália, foi registrada uma centena de abusos do clero. Ainda hoje os jornalistas esperam saber o nome e a destinação dos culpados.

 

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