13 Novembro 2011
Quem tem medo de Dilma Rousseff? A julgar pelos relatos do dia a dia na Esplanada dos Ministérios, a resposta é simples: todo mundo.
A Folha ouviu ministros, assessores e parlamentares sobre as famosas broncas da presidente. A conclusão é que ninguém está imune a elas - nem os "queridinhos" de Dilma, como Gilberto Carvalho (Secretaria Geral) e Guido Mantega (Fazenda).
A reportagem é de Vera Magalhães e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 13-11-2011.
A lista de fatores que provocam a ira da presidente vai do desconhecimento dos assuntos de governo a tentativas de enrolá-la ou dar palpites sobre áreas dos colegas.
Alguns ministros se abalam emocionalmente com os pitos. Duas ajudantes de ordem e uma secretária da Presidência pediram demissão.
Anderson Dorneles, assessor pessoal que é tratado como se fosse um filho e acompanha Dilma há mais de 20 anos, já ameaçou duas vezes ir embora do governo.
Alguns assessores evitam levar problemas a Dilma por temer o mau humor presidencial. "Tem gente que nem decide nem submete a ela, com medo da bronca", resume um ministro, que, assim como os demais ouvidos pela
Folha, falou em caráter reservado.
Outra senha para a gritaria é alguém tentar levar um "contrabando" para uma reunião. "Ela conhece o governo, sabe os caminhos da burocracia. Não dá para enrolá-la", sentencia outro auxiliar.
DILMA X LULA
Aqueles que permaneceram da gestão Lula dizem que o ex-presidente também dava broncas, mas elas eram "genéricas" e "no plural".
Com Dilma a coisa é pessoal, olho no olho, em público e quase sempre aos gritos.
Os alvos preferenciais são os ministros mais próximos: os palacianos e os que participam da coordenação de governo. Paradoxalmente, aqueles de quem ela não gosta escapam quase ilesos, porque raramente são recebidos.
Quando o tempo fecha, a presidente cruza os braços, põe as mãos sob as axilas, inclina a cabeça de lado e mira alguém. "O cara sabe na hora que vai para o pelourinho", descreve uma testemunha.
O bordão "meu querido" é outro sinal de encrenca.
Um traço de estilo que tensiona o ambiente é que Dilma não faz confraternizações. Aboliu a Festa Junina na Granja do Torto e as rodadas de prosa regadas a uísque que Lula promovia nas viagens.
"Se, numa viagem, ela convoca um café, é sempre para trabalhar", descreve quem já integrou algumas comitivas.
Apesar do temor, os assessores veem o estilo ríspido como demonstração de que ela está "investida da função" e "leva o cargo a sério".
"Chega a ser engraçado, porque, com a bronca, vem sempre uma ironia. Mas só quando não é com você", resume uma de suas vítimas.
"Acha que eu não conheço?"
Dilma participava de uma reunião de vários ministérios para discutir a concessão de bolsas de estudo federais.
Um funcionário do Ministério de Ciência e Tecnologia sugeriu que fossem antecipados recursos financeiros para pagar os benefícios.
A presidente imediatamente cortou sua palavra:
- Como é que é? Você quer que eu libere agora um dinheiro para alunos que vão começar a estudar em setembro? Você acha que eu não entendo nada de execução orçamentária? Você acha que eu não entendo
nada de execução financeira?
Dilma virou-se para um ministro ao seu lado e falou:
- Ele acha que eu não conheço! Sabe quando ele vai ver esse dinheiro?
E voltando-se para a frente, onde não havia ninguém:
- Tchau, dinheiro!
Como os ministros podem evitar problemas
1) Nunca vá a uma reunião com ela sem ler sobre o tema que será tratado. Ela lê tudo antes e vai certamente sabatiná-lo
2) Caso tenha cometido a temeridade de não ler, não tente enrolar. Ela vai perceber e pode ser bem pior
3) Nunca interrompa a presidente no meio de um raciocínio. Ela será ríspida e vai mandá-lo se calar
4) Não tente sugerir uma ação contrária ao que ela acaba de propor. O melhor é tentar convencê-la com jeitinho. Comece assim: "Não seria melhor..."
5) Não contrarie uma ordem argumentando que a repercussão na imprensa será ruim para o governo. É explosão na certa
6) Não dê declarações à imprensa sobre temas delicados do governo e que não tenham relação estrita com a sua pasta. Você será gravemente advertido por Dilma
7) Nunca, jamais, em hipótese alguma discuta alguma determinação comentando que "no governo Lula era assim". Poucas coisas deixam a presidente mais irritada
"Tchau, drogado, volta amanhã"
A presidente comandava uma reunião com representantes de vários ministérios para discutir o lançamento de uma política de saúde para pessoas com deficiências.
Quando um funcionário do Ministério da Saúde sugeriu uma sigla para identificar a nova política, Dilma cortou:
- O quê? Você está me sugerindo mais uma sigla? Você sabe quantas siglas tem no Ministério da Saúde? - e se pôs a enumerar várias delas.
Ao citar os CAPs-AD (Centros de Atenção Psicossocial Antidrogas), voltou-se para um ministro ao seu lado:
- Você sabia que os CAPs-AD fecham às 18h? Você chega para o drogado e fala: "Drogado, são 18h. Tchau, drogado, volta amanhã!".
"Pô, general"
Dilma fez sua estreia nas Nações Unidas em setembro. Como seu cabeleireiro, Celso Kamura, estava na cidade, pediu que ele arrumasse seu cabelo para o grande dia.
Já pronta, no trajeto entre o hotel e o carro, a presidente foi surpreendida por uma chuva fina, mas persistente.
Ao seu lado, o general Marcos Antonio Amaro dos Santos, chefe da segurança presidencial, não tinha um guarda-chuva à disposição e ficou desconcertado.
Dilma, que já tinha chamado a atenção do general em várias ocasiões, desta vez se limitou a apontar para o cabelo todo cheio de laquê, em seguida abrir os braços, resignada, e desabafar:
- Pô, general...
"Ninguém fala de economia"
Logo que assumiu a função, a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) deu uma entrevista em que defendeu a criação de um novo imposto para financiar a saúde.
Dilma Rousseff chamou a responsável pela articulação política e os demais ministros palacianos para uma reunião e deu um recado expresso, em tom bastante ríspido:
- Ô, Ideli, você, o Gilberto e a Gleisi não podem falar sobre economia. Vocês estão me entendendo? Aqui no palácio ninguém fala de economia! Sobre esse assunto, só fala o Mantega! - concluiu.
Dali em diante, nunca mais se ouviram as opiniões econômicas de Ideli Salvatti nem de seus colegas.
"Eu quero que o embaixador..."
O chanceler Antonio Patriota procurou a presidente para interceder a favor do embaixador brasileiro na OEA (Organização dos Estados Americanos), Rui Casais.
Dilma convocara Casais de volta ao Brasil em abril, em resposta às críticas da organização ao tratamento de populações indígenas afetadas pela usina de Belo Monte.
Patriota pediu que ele voltasse a Washington, pois sua família estava ambientada.
A reação da presidente foi uma negativa veemente, seguida de um palavrão. O embaixador segue no Brasil.
"Vocês têm de entender"
A presidente comandava uma reunião de ministros e assessores sobre a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte (PA).
Em sua vez de fazer uma intervenção, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, advertiu para a péssima repercussão do tema na imprensa internacional.
Dilma atalhou, aos brados:
- Não tô preocupada com repercussão na imprensa!
Todos se entreolharam diante do tom de voz, mas ela prosseguiu:
- Vocês têm de entender de uma vez por todas que esse projeto é bom, importante para o país, e vai ser feito!
Dali para a frente, ninguém objetou mais nada e todos os ministros passaram a defender publicamente a usina como projeto estratégico para a infra-estrutura do país.
A Folha ouviu ministros, assessores e parlamentares sobre as famosas broncas da presidente. A conclusão é que ninguém está imune a elas - nem os "queridinhos" de Dilma, como Gilberto Carvalho (Secretaria Geral) e Guido Mantega (Fazenda).
A reportagem é de Vera Magalhães e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 13-11-2011.
A lista de fatores que provocam a ira da presidente vai do desconhecimento dos assuntos de governo a tentativas de enrolá-la ou dar palpites sobre áreas dos colegas.
Alguns ministros se abalam emocionalmente com os pitos. Duas ajudantes de ordem e uma secretária da Presidência pediram demissão.
Anderson Dorneles, assessor pessoal que é tratado como se fosse um filho e acompanha Dilma há mais de 20 anos, já ameaçou duas vezes ir embora do governo.
Alguns assessores evitam levar problemas a Dilma por temer o mau humor presidencial. "Tem gente que nem decide nem submete a ela, com medo da bronca", resume um ministro, que, assim como os demais ouvidos pela
Folha, falou em caráter reservado.
Outra senha para a gritaria é alguém tentar levar um "contrabando" para uma reunião. "Ela conhece o governo, sabe os caminhos da burocracia. Não dá para enrolá-la", sentencia outro auxiliar.
DILMA X LULA
Aqueles que permaneceram da gestão Lula dizem que o ex-presidente também dava broncas, mas elas eram "genéricas" e "no plural".
Com Dilma a coisa é pessoal, olho no olho, em público e quase sempre aos gritos.
Os alvos preferenciais são os ministros mais próximos: os palacianos e os que participam da coordenação de governo. Paradoxalmente, aqueles de quem ela não gosta escapam quase ilesos, porque raramente são recebidos.
Quando o tempo fecha, a presidente cruza os braços, põe as mãos sob as axilas, inclina a cabeça de lado e mira alguém. "O cara sabe na hora que vai para o pelourinho", descreve uma testemunha.
O bordão "meu querido" é outro sinal de encrenca.
Um traço de estilo que tensiona o ambiente é que Dilma não faz confraternizações. Aboliu a Festa Junina na Granja do Torto e as rodadas de prosa regadas a uísque que Lula promovia nas viagens.
"Se, numa viagem, ela convoca um café, é sempre para trabalhar", descreve quem já integrou algumas comitivas.
Apesar do temor, os assessores veem o estilo ríspido como demonstração de que ela está "investida da função" e "leva o cargo a sério".
"Chega a ser engraçado, porque, com a bronca, vem sempre uma ironia. Mas só quando não é com você", resume uma de suas vítimas.
"Acha que eu não conheço?"
Dilma participava de uma reunião de vários ministérios para discutir a concessão de bolsas de estudo federais.
Um funcionário do Ministério de Ciência e Tecnologia sugeriu que fossem antecipados recursos financeiros para pagar os benefícios.
A presidente imediatamente cortou sua palavra:
- Como é que é? Você quer que eu libere agora um dinheiro para alunos que vão começar a estudar em setembro? Você acha que eu não entendo nada de execução orçamentária? Você acha que eu não entendo
nada de execução financeira?
Dilma virou-se para um ministro ao seu lado e falou:
- Ele acha que eu não conheço! Sabe quando ele vai ver esse dinheiro?
E voltando-se para a frente, onde não havia ninguém:
- Tchau, dinheiro!
Como os ministros podem evitar problemas
1) Nunca vá a uma reunião com ela sem ler sobre o tema que será tratado. Ela lê tudo antes e vai certamente sabatiná-lo
2) Caso tenha cometido a temeridade de não ler, não tente enrolar. Ela vai perceber e pode ser bem pior
3) Nunca interrompa a presidente no meio de um raciocínio. Ela será ríspida e vai mandá-lo se calar
4) Não tente sugerir uma ação contrária ao que ela acaba de propor. O melhor é tentar convencê-la com jeitinho. Comece assim: "Não seria melhor..."
5) Não contrarie uma ordem argumentando que a repercussão na imprensa será ruim para o governo. É explosão na certa
6) Não dê declarações à imprensa sobre temas delicados do governo e que não tenham relação estrita com a sua pasta. Você será gravemente advertido por Dilma
7) Nunca, jamais, em hipótese alguma discuta alguma determinação comentando que "no governo Lula era assim". Poucas coisas deixam a presidente mais irritada
"Tchau, drogado, volta amanhã"
A presidente comandava uma reunião com representantes de vários ministérios para discutir o lançamento de uma política de saúde para pessoas com deficiências.
Quando um funcionário do Ministério da Saúde sugeriu uma sigla para identificar a nova política, Dilma cortou:
- O quê? Você está me sugerindo mais uma sigla? Você sabe quantas siglas tem no Ministério da Saúde? - e se pôs a enumerar várias delas.
Ao citar os CAPs-AD (Centros de Atenção Psicossocial Antidrogas), voltou-se para um ministro ao seu lado:
- Você sabia que os CAPs-AD fecham às 18h? Você chega para o drogado e fala: "Drogado, são 18h. Tchau, drogado, volta amanhã!".
"Pô, general"
Dilma fez sua estreia nas Nações Unidas em setembro. Como seu cabeleireiro, Celso Kamura, estava na cidade, pediu que ele arrumasse seu cabelo para o grande dia.
Já pronta, no trajeto entre o hotel e o carro, a presidente foi surpreendida por uma chuva fina, mas persistente.
Ao seu lado, o general Marcos Antonio Amaro dos Santos, chefe da segurança presidencial, não tinha um guarda-chuva à disposição e ficou desconcertado.
Dilma, que já tinha chamado a atenção do general em várias ocasiões, desta vez se limitou a apontar para o cabelo todo cheio de laquê, em seguida abrir os braços, resignada, e desabafar:
- Pô, general...
"Ninguém fala de economia"
Logo que assumiu a função, a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) deu uma entrevista em que defendeu a criação de um novo imposto para financiar a saúde.
Dilma Rousseff chamou a responsável pela articulação política e os demais ministros palacianos para uma reunião e deu um recado expresso, em tom bastante ríspido:
- Ô, Ideli, você, o Gilberto e a Gleisi não podem falar sobre economia. Vocês estão me entendendo? Aqui no palácio ninguém fala de economia! Sobre esse assunto, só fala o Mantega! - concluiu.
Dali em diante, nunca mais se ouviram as opiniões econômicas de Ideli Salvatti nem de seus colegas.
"Eu quero que o embaixador..."
O chanceler Antonio Patriota procurou a presidente para interceder a favor do embaixador brasileiro na OEA (Organização dos Estados Americanos), Rui Casais.
Dilma convocara Casais de volta ao Brasil em abril, em resposta às críticas da organização ao tratamento de populações indígenas afetadas pela usina de Belo Monte.
Patriota pediu que ele voltasse a Washington, pois sua família estava ambientada.
A reação da presidente foi uma negativa veemente, seguida de um palavrão. O embaixador segue no Brasil.
"Vocês têm de entender"
A presidente comandava uma reunião de ministros e assessores sobre a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte (PA).
Em sua vez de fazer uma intervenção, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, advertiu para a péssima repercussão do tema na imprensa internacional.
Dilma atalhou, aos brados:
- Não tô preocupada com repercussão na imprensa!
Todos se entreolharam diante do tom de voz, mas ela prosseguiu:
- Vocês têm de entender de uma vez por todas que esse projeto é bom, importante para o país, e vai ser feito!
Dali para a frente, ninguém objetou mais nada e todos os ministros passaram a defender publicamente a usina como projeto estratégico para a infra-estrutura do país.
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Presidente pavio curto. Quem tem medo de Dilma Rousseff? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU