22 Julho 2011
Cada vez mais distante do discurso de esquerda radical com que iniciou sua carreira política, Hollanta Humala Tasso, presidente eleito do Peru, enviou ontem uma mensagem de moderação ao anunciar a muito esperada formação de seu primeiro governo, com o qual assumirá o poder dentro de uma semana, em 28 de julho.
A reportagem é de Jaime Cordero e publicada pelo jornal El Pais e reproduzida pelo Portal Uol, 23-07-2011.
Salomón Lerner Ghitis, seu assessor mais próximo há vários anos, empresário e financista de boa parte de suas campanhas, será o presidente do Conselho de Ministros. O Ministério da Economia e Finanças ficará nas mãos de Luis Miguel Castilla, um técnico com fama de ortodoxo que até alguns dias atrás era o vice-ministro da Fazenda do atual governo de Alan García e que teve experiência em organismos multilaterais como o Banco Mundial e a Corporação Andina de Fomento. Esta designação, junto com a já anunciada ratificação de Julio Velarde - um militante do direitista Partido Popular Cristão - à frente do Banco Central de Reserva, foram muito bem recebidas pelos mercados. A Bolsa de Lima, que nos últimos meses serviu de fiel termômetro do nervosismo dos agentes econômicos, registrou fortes altas ao longo desta semana.
Humala confirmou as indicações entre a noite de quarta-feira e a manhã de ontem. Muito influiu nessa confirmação o entendimento com o Peru Possível, partido do ex-presidente Alejandro Toledo, que na noite de quarta-feira anunciou que apoiará o próximo presidente. Como parte desse acordo, Humala anunciou que o Peru Possível terá alguns cargos no gabinete, entre eles o Ministério da Defesa. Toledo também prometeu apoio no Parlamento, o que garante que o governo terá a presidência do Congresso, pelo menos durante o primeiro ano.
"Estamos fazendo um governo de união nacional", indicou Humala na quinta-feira de manhã em uma entrevista televisiva na qual anunciou várias nomeações. Embora ainda falte conhecer quase a metade dos ministros, os nomes que foram revelados agora configuram um gabinete moderado e de concertação. À imagem e semelhança do que fez Lula no Brasil quando assumiu o poder, a tendência geral do governo parece de centro-esquerda, mas a condução econômica fica nas mãos de técnicos que se situam mais à direita.
Kurt Burneo, ex-chefe do plano econômico do Peru Possível na última campanha eleitoral, ocupará a pasta de Produção e será o responsável por grande parte dos programas de inclusão social que pensa implementar a partir de 28 de julho.
Salomón Lerner, um homem que tem boas relações tanto com os setores mais esquerdistas do futuro partido do governo como com o empresariado, terá a missão de articular e coordenar os setores extremistas com os moderados, tanto dentro do gabinete como na esfera pública. "Não é um radical de esquerda. Trata-se de um empresário progressista que conduziu a campanha e que quando foi preciso dar um salto para conseguir o voto do setor democrático-liberal, o fez com muita inteligência", salienta Sinesio López, acadêmico e analista político que conhece de perto o entorno do presidente.
Na opinião de López, o grande desafio do governo Humala consiste em manter o bom ritmo de crescimento econômico, o que lhe permitiria pôr em prática seus ambiciosos programas de assistência social e redistribuição de renda. Nesse sentido, considera que a nomeação de Luis Miguel Castilla é "um bom gesto para o empresariado". "Creio que o governo vai agir como centro-direita no plano econômico e como centro-esquerda no social", acrescenta.
A direita também aprovou as nomeações. "Me dá a impressão de que no gabinete se busca dar certo peso à ponderação e moderação basicamente expressada por uma linha econômica que quer ser centrada", indica Lourdes Flores Nano, presidente do Partido Popular Cristão, que afirmou que também apoiará a candidatura oficialista à presidência do Congresso.
"Parece-me que as indicações são positivas. Depois dos discursos humalistas do passado, bastante radicais, estes são sintomas de uma esquerda moderada, como a que governa o Uruguai ou o Brasil", salienta Daniel Córdova, economista e ex-candidato ao Congresso pela direita. "É preciso esperar o discurso de 28 de julho, mas as coisas estão se esclarecendo e nós que éramos céticos teremos de aceitar que Mario Vargas Llosa tinha razão, que a moderação em Humala é possível, e em boa hora", acrescenta.
Espera-se que no mesmo dia em que assumir o poder Humala anuncie um programa de reformas para executar nos primeiros cem dias de seu governo. Uma das promessas de campanha é elevar o salário mínimo, medida que alguns setores criticaram pois consideram que pode gerar inflação.
Humala receberá um país muito complexo, com impressionantes números de crescimento econômico em dez anos - 9% em 2010 -, mas igualmente com crescentes demandas sociais, sobretudo fora de Lima, onde se concentram os eleitores mais radicais de Humala. "Se não conseguir evitar a pressão excessiva, a resposta será o retiro dos investimentos", adverte Sinesio López. Companhias estrangeiras prometeram US$ 50 bilhões para os setores mineiro e petrolífero na próxima década.
O novo governo do Peru
Primeiro-ministro: Salomón Lerner Ghitis, homem de negócios muito próximo do presidente Hollanta Humala, será o próximo primeiro-ministro. Lerner, 65 anos, foi o arquiteto da última campanha presidencial de Humala e o responsável por reunir intelectuais moderados como conselheiros do partido. O novo primeiro-ministro, um milionário de origem humilde, foi um dos poucos vínculos do presidente peruano com o mundo empresarial durante sua campanha em 2006, quando se candidatou com um perfil mais radical. Lerner conta com uma longa trajetória política: participou do governo do general Juan Velasco no final dos anos 60, da administração do primeiro mandato de Alan García nos 80 e colaborou por um breve período com o ex-presidente Alejandro Toledo.
Ministro da Economia: Luis Miguel Castilla, economista ortodoxo de 42 anos, foi escolhido ministro da Economia e Finanças contra os colaboradores mais intervencionistas que participaram da campanha política do presidente. Castilla era, até a semana passada, vice-ministro da Fazenda. Esse ex-membro do Banco Mundial é relacionado com o boom do livre comércio no Peru, muito dependente do investimento estrangeiro e duramente criticado por Humala por ignorar a luta contra a pobreza. Com Castilla, Humala tenta acalmar os empresários e afastar-se de seu passado anticapitalista.
Banco Central: Julio Velarde, a grande surpresa do novo gabinete. Esse conservador respeitado por investidores e mercados financeiros locais continuará à frente do Banco Central de Reserva, que preside desde 2006. Professor universitário de 59 anos, Velarde é reconhecido pela luta contra a crise econômica atual por manter as taxas de juros baixas e assim evitar a deflação no Peru. Entre 2004 e 2006 presidiu o Fundo Latino-Americano de Reservas. Conta com a confiança dos mercados e sua continuação no cargo foi recebida pela Bolsa de Valores de Lima com alta de 4,62% .
Ministro das Minas: Carlos Herrera Descalzi, engenheiro de 66 anos partidário da política moderada. Também não é novo no cargo: foi ministro de Minas e Energia, pasta chave no Peru, durante o governo de transição de Valentín Paniagua (2000-2001). Herrera aposta em uma revisão dos preços do gás natural.
Ministro das Relações Exteriores: Rafael Roncagliolo, sociólogo e jornalista de 67 anos. Até agora diretor da organização civil de observação eleitoral Transparência, Roncagliolo trabalhará pela integração regional do Peru. Um importante desafio para o novo ministro será a disputa territorial marítima com o Chile, nas mãos da Corte Internacional de Haia.
A reportagem é de Jaime Cordero e publicada pelo jornal El Pais e reproduzida pelo Portal Uol, 23-07-2011.
Salomón Lerner Ghitis, seu assessor mais próximo há vários anos, empresário e financista de boa parte de suas campanhas, será o presidente do Conselho de Ministros. O Ministério da Economia e Finanças ficará nas mãos de Luis Miguel Castilla, um técnico com fama de ortodoxo que até alguns dias atrás era o vice-ministro da Fazenda do atual governo de Alan García e que teve experiência em organismos multilaterais como o Banco Mundial e a Corporação Andina de Fomento. Esta designação, junto com a já anunciada ratificação de Julio Velarde - um militante do direitista Partido Popular Cristão - à frente do Banco Central de Reserva, foram muito bem recebidas pelos mercados. A Bolsa de Lima, que nos últimos meses serviu de fiel termômetro do nervosismo dos agentes econômicos, registrou fortes altas ao longo desta semana.
Humala confirmou as indicações entre a noite de quarta-feira e a manhã de ontem. Muito influiu nessa confirmação o entendimento com o Peru Possível, partido do ex-presidente Alejandro Toledo, que na noite de quarta-feira anunciou que apoiará o próximo presidente. Como parte desse acordo, Humala anunciou que o Peru Possível terá alguns cargos no gabinete, entre eles o Ministério da Defesa. Toledo também prometeu apoio no Parlamento, o que garante que o governo terá a presidência do Congresso, pelo menos durante o primeiro ano.
"Estamos fazendo um governo de união nacional", indicou Humala na quinta-feira de manhã em uma entrevista televisiva na qual anunciou várias nomeações. Embora ainda falte conhecer quase a metade dos ministros, os nomes que foram revelados agora configuram um gabinete moderado e de concertação. À imagem e semelhança do que fez Lula no Brasil quando assumiu o poder, a tendência geral do governo parece de centro-esquerda, mas a condução econômica fica nas mãos de técnicos que se situam mais à direita.
Kurt Burneo, ex-chefe do plano econômico do Peru Possível na última campanha eleitoral, ocupará a pasta de Produção e será o responsável por grande parte dos programas de inclusão social que pensa implementar a partir de 28 de julho.
Salomón Lerner, um homem que tem boas relações tanto com os setores mais esquerdistas do futuro partido do governo como com o empresariado, terá a missão de articular e coordenar os setores extremistas com os moderados, tanto dentro do gabinete como na esfera pública. "Não é um radical de esquerda. Trata-se de um empresário progressista que conduziu a campanha e que quando foi preciso dar um salto para conseguir o voto do setor democrático-liberal, o fez com muita inteligência", salienta Sinesio López, acadêmico e analista político que conhece de perto o entorno do presidente.
Na opinião de López, o grande desafio do governo Humala consiste em manter o bom ritmo de crescimento econômico, o que lhe permitiria pôr em prática seus ambiciosos programas de assistência social e redistribuição de renda. Nesse sentido, considera que a nomeação de Luis Miguel Castilla é "um bom gesto para o empresariado". "Creio que o governo vai agir como centro-direita no plano econômico e como centro-esquerda no social", acrescenta.
A direita também aprovou as nomeações. "Me dá a impressão de que no gabinete se busca dar certo peso à ponderação e moderação basicamente expressada por uma linha econômica que quer ser centrada", indica Lourdes Flores Nano, presidente do Partido Popular Cristão, que afirmou que também apoiará a candidatura oficialista à presidência do Congresso.
"Parece-me que as indicações são positivas. Depois dos discursos humalistas do passado, bastante radicais, estes são sintomas de uma esquerda moderada, como a que governa o Uruguai ou o Brasil", salienta Daniel Córdova, economista e ex-candidato ao Congresso pela direita. "É preciso esperar o discurso de 28 de julho, mas as coisas estão se esclarecendo e nós que éramos céticos teremos de aceitar que Mario Vargas Llosa tinha razão, que a moderação em Humala é possível, e em boa hora", acrescenta.
Espera-se que no mesmo dia em que assumir o poder Humala anuncie um programa de reformas para executar nos primeiros cem dias de seu governo. Uma das promessas de campanha é elevar o salário mínimo, medida que alguns setores criticaram pois consideram que pode gerar inflação.
Humala receberá um país muito complexo, com impressionantes números de crescimento econômico em dez anos - 9% em 2010 -, mas igualmente com crescentes demandas sociais, sobretudo fora de Lima, onde se concentram os eleitores mais radicais de Humala. "Se não conseguir evitar a pressão excessiva, a resposta será o retiro dos investimentos", adverte Sinesio López. Companhias estrangeiras prometeram US$ 50 bilhões para os setores mineiro e petrolífero na próxima década.
O novo governo do Peru
Primeiro-ministro: Salomón Lerner Ghitis, homem de negócios muito próximo do presidente Hollanta Humala, será o próximo primeiro-ministro. Lerner, 65 anos, foi o arquiteto da última campanha presidencial de Humala e o responsável por reunir intelectuais moderados como conselheiros do partido. O novo primeiro-ministro, um milionário de origem humilde, foi um dos poucos vínculos do presidente peruano com o mundo empresarial durante sua campanha em 2006, quando se candidatou com um perfil mais radical. Lerner conta com uma longa trajetória política: participou do governo do general Juan Velasco no final dos anos 60, da administração do primeiro mandato de Alan García nos 80 e colaborou por um breve período com o ex-presidente Alejandro Toledo.
Ministro da Economia: Luis Miguel Castilla, economista ortodoxo de 42 anos, foi escolhido ministro da Economia e Finanças contra os colaboradores mais intervencionistas que participaram da campanha política do presidente. Castilla era, até a semana passada, vice-ministro da Fazenda. Esse ex-membro do Banco Mundial é relacionado com o boom do livre comércio no Peru, muito dependente do investimento estrangeiro e duramente criticado por Humala por ignorar a luta contra a pobreza. Com Castilla, Humala tenta acalmar os empresários e afastar-se de seu passado anticapitalista.
Banco Central: Julio Velarde, a grande surpresa do novo gabinete. Esse conservador respeitado por investidores e mercados financeiros locais continuará à frente do Banco Central de Reserva, que preside desde 2006. Professor universitário de 59 anos, Velarde é reconhecido pela luta contra a crise econômica atual por manter as taxas de juros baixas e assim evitar a deflação no Peru. Entre 2004 e 2006 presidiu o Fundo Latino-Americano de Reservas. Conta com a confiança dos mercados e sua continuação no cargo foi recebida pela Bolsa de Valores de Lima com alta de 4,62% .
Ministro das Minas: Carlos Herrera Descalzi, engenheiro de 66 anos partidário da política moderada. Também não é novo no cargo: foi ministro de Minas e Energia, pasta chave no Peru, durante o governo de transição de Valentín Paniagua (2000-2001). Herrera aposta em uma revisão dos preços do gás natural.
Ministro das Relações Exteriores: Rafael Roncagliolo, sociólogo e jornalista de 67 anos. Até agora diretor da organização civil de observação eleitoral Transparência, Roncagliolo trabalhará pela integração regional do Peru. Um importante desafio para o novo ministro será a disputa territorial marítima com o Chile, nas mãos da Corte Internacional de Haia.
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Humala, presidente do Peru, opta pela via política de Lula - Instituto Humanitas Unisinos - IHU