28 Fevereiro 2011
A indústria do cinema concentrou de forma previsível seus principais prêmios em O Discurso do Rei, que recebeu o Oscar de melhor filme, Colin Firth o de melhor ator, Tom Hooper o de melhor diretor. Este filme de corte clássico marcado pela força interpretativa dos atores britânicos e um roteirista inteligente, também premiado, que representa os valores da superação e da amizade nos mostra como, a partir da fraqueza, o ser humano pode transcender suas possibilidades e assumir os compromissos que parecem impossíveis. Como assinalou Lisa Respers France da CNN, as indicações, que não eram diretamente religiosas, tinham conotações profundamente espirituais.
A reportagem está publicada no sítio espanhol Religión Digital, 28-02-2011. A tradução é do Cepat.
Este elogio à amizade é, sem dúvida, uma boa notícia de um tipo de cinema que abre à esperança e oferece modelos de sentido. Mesmo que tivesse sido interessante o reconhecimento dos irmãos Coen na direção de Bravura Indômita, um filme cru sobre a natureza humana que enfrenta o lado obscuro do desejo de vingança desde uma perspectiva profunda que assume a culpa e se abre ao futuro em confiança. Com fortes referências bíblicas, próprias do judaísmo de seus diretores, abre-se desde a sua trilha sonora, que lembra Noite do Caçador, à presença de Deus que nos cuida e acompanha na mediação dos outros.
Provavelmente Cisne Negro representa em menor medida a transformação espiritual, como destaca Steven D. Greydanus para o National Catholic Register. A atriz Natalie Portman realiza uma meritória interpretação de Nina, uma bailarina que pouco a pouco entra em um processo de destruição que vem marcado por sua própria origem. Filme de tom psicológico onde Darren Aronofsky prossegue com sua tendência trágica da incapacidade do ser humano para alcançar os próprios desejos que o superam. Mais otimista, mesmo que um tanto prometeica, era a proposta de Danny Boyle, de 127 Horas, que desta vez ficou sem prêmios. Baseado em uma história real de um escalador que ficou preso durante cinco dias em uma fenda e que consegue sair após um exemplo de resistência e sacrifício é narrada com tensão, ainda que com um roteiro um tanto efetivista que coloca a ação de graças a Deus sem muita elaboração no processo pessoal.
O prêmio para o melhor filme estrangeiro foi para o interessantíssimo Em um Mundo Melhor, de Susanne Bier [que deverá estrear no Brasil em março], de quem já destacamos Depois do Casamento. A cineasta dinamarquesa, que foi acusada de forma injusta de anti-islâmica pelo governo do Sudão, nos apresenta o drama humano geral dentro de um drama particular. Um médico colaborador solidário na África enfrenta o dilema de ajudar o seu filho em seu próprio país renunciando à violência e avançando pelo caminho de uma dolorosa reconciliação. Filme com força espiritual que nos recorda até que ponto foi injusta a marginalização entre as indicações do filme francês Des Hommes et des Dieuses, de Xavier Beauvois. O recente César para o melhor filme destacou este filme que é uma das mais importantes estreias do cinema espiritual.
São também bem recebidos do ponto de vista espiritual os prêmios para Toy Story 3 para o melhor filme de animação e melhor canção original. Um filme cheio de interesse que enobrece a comunidade e a amizade assim como a escolha da consciência. Um presente do ponto de vista familiar e educativo.
Em resumo, o cinema em tempos convulsos aposta em valores espirituais abertos à esperança sem convulsões. A realidade refletida em A Rede Social necessita ser reinterpretada em chave mais aberta que a própria psicologia como em A Origem e sem deixar muitos resquícios à melancolia de Bravura Indômita. Uma aposta no otimismo que tememos seja muito superficial por suas motivações econômicas. Assim que cinema espiritual, mas menos do que nos dizem os próprios críticos que o detectam.
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O Discurso do Rei e a recuperação do cinema espiritual - Instituto Humanitas Unisinos - IHU