31 Março 2023
"Nos meios de comunicação e nas redes sociais fala-se muito de 'invasões' ou 'invasores' de terras. Na realidade, trata-se de 'ocupações' (e não de 'invasões') de terras que não têm função social e que, portanto, são de quem delas precisa para morar e trabalhar", escreve Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção-SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG.
Na madrugada do dia 25 (sábado) deste mês de março, mais de 600 famílias ocuparam a Fazenda São Lucas no município de Hidrolândia, Região Metropolitana de Goiânia - GO. A ação - afirma o Movimento dos Trabalhadores/as Rurais Sem Terra (MST- GO) - quer que a fazenda seja destinada à Reforma Agrária. Trata-se de uma fazenda que anteriormente pertencia a um grupo, condenado em 2009 por crimes de exploração sexual e era usada como cativeiro para tráfico internacional de mulheres, sobretudo adolescentes. Desde 2016, a área integra o patrimônio da União.
O objetivo da Ocupação é fazer com que a área seja utilizada para a Reforma Agrária e o assentamento dessas famílias.
O MST informou que “a ação foi realizada por mulheres ligadas ao Movimento e faz parte da Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra, que ocorre em todo país durante o mês de março”.
“Denunciamos o crescimento da violência contra as mulheres do campo e esta área representa o grau de violência que sofremos". E ainda: "Exigimos que esta área, que antes era usada para violentar mulheres, seja destinada para o assentamento dessas famílias, para que possamos produzir alimentos saudáveis e combater as violências" (Patrícia Cristiane, da Coordenação Nacional do MST).
Na noite do mesmo dia 25, o MST divulgou uma Nota à imprensa informando que a saída das 600 famílias da área ocupada, ocorreu de forma pacífica e denunciando que - por se tratar de um terreno da União - a Polícia Militar do Estado de Goiás (PM-GO) promoveu o despejo fora de sua jurisdição e deverá ser processada.
Nos meios de comunicação e nas redes sociais fala-se muito de “invasões” ou “invasores” de terras. Na realidade, trata-se de “ocupações” (e não de “invasões”) de terras que não têm função social e que, portanto, são de quem delas precisa para morar e trabalhar. Trata-se, pois, de exigir os três direitos fundamentais de toda pessoa humana: terra, teto (moradia) e trabalho (os “três T” do Papa Francisco).
Além de tudo - como já afirmei outras vezes - todo despejo, mesmo legal, é injusto, desumano, antiético e anticristão.
Parabéns às heroínas da Ocupação S. Lucas, da Reforma Agrária Popular e de muitas outras lutas! Estamos com vocês. Contem com o nosso apoio e a nossa solidariedade.
Em Goiás, “Invasões de terras entram na pauta da Assembleia” (O Popular, 28/03/23, p.2). Infelizmente é essa a preocupação da maioria dos deputados estaduais.
A todos e todas que - como esses deputados - estão preocupados com as “invasões” de terras, lembro que no Brasil os verdadeiros “invasores” ou os verdadeiros assaltantes são aqueles que pertencem ao grupo dos 1 % da população, que se apropriaram de um patrimônio equivalente ao da metade da população brasileira.
Termino com uma boa notícia. “Neste ano, milhares de Mulheres Sem Terra se mobilizaram em 23 Estados, no Distrito Federal, além de Zâmbia, na África. Como parte da Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra, elas realizaram acampamentos pedagógicos, ocupações de terras, ações de solidariedade com doação de alimentos e de sangue, feiras com produtos da Reforma Agrária, plantio de árvores, espaços de formação e debates, e ocuparam as ruas do país, com marchas em parceria com Movimentos e Organizações populares urbanas e rurais”.
Unidos e unidas na caminhada; esperançar e preciso.
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As heroínas da Reforma Agrária Popular. Artigo de Marcos Sassatelli - Instituto Humanitas Unisinos - IHU