Enquanto a Igreja não colocar o Evangelho no centro da vida, o cristianismo não contribuirá com a solução que o mundo necessita. Artigo de José M. Castillo

Foto: Unsplash

Mais Lidos

  • Alessandra Korap (1985), mais conhecida como Alessandra Munduruku, a mais influente ativista indígena do Brasil, reclama da falta de disposição do presidente brasileiro Lula da Silva em ouvir.

    “O avanço do capitalismo está nos matando”. Entrevista com Alessandra Munduruku, liderança indígena por trás dos protestos na COP30

    LER MAIS
  • Dilexi Te: a crise da autorreferencialidade da Igreja e a opção pelos pobres. Artigo de Jung Mo Sung

    LER MAIS
  • Às leitoras e aos leitores

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

30 Julho 2020

“Os problemas que nos ameaçam e nos dominam estão aumentando, a ponto de ver o futuro da humanidade, da terra e da vida a cada dia mais duvidoso e avassalador. E sendo esse o caso, em que contribui a religião e em que contribuem os homens da religião, em resposta às muitas perguntas que as pessoas sentem em suas vidas e para as quais não encontram solução?”, escreve o teólogo espanhol José María Castillo, em artigo publicado por Religión Digital, 25-07-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.

Eis o artigo.

Uma das coisas que mais me fazem pensar, em relação ao vírus e a pandemia, é o desinteresse religioso por esses. A doença preocupa quase todo o mundo, quais os remédios para curá-la, qual a vacina para preveni-la, quais as graves consequências que carrega, qual o futuro que nos espera...

É verdade também se fala do religioso. Mas, por quê? Com bastante frequência, o religioso associa-se com o festivo: a Semana Santa, o Natal, a festividade da Padroeira em paróquias e comunidades, as romarias e suas procissões, os batizados, as comunhões, as bodas, os enterros, etc. Tudo isso interessa a muita gente. Porém, onde e em que está o interesse? Não há de se pensar muito para se dar conta de que a “religiosidade popular” interessa a muitas pessoas, mais pelo festivo que pelo estritamente religioso, tal como se vive e se celebra. Isso todo mundo entende e não se necessita de muitas explicações.

Mas, claro que o acabo de apontar, que chama a minha atenção, nas condições do que está nos acontecendo, não é a rejeição de Deus e da religião, mas o desinteresse por tudo que se relaciona (ou se pode relacionar) com Deus e, em geral, com todo o transcendente. Hoje já é evidente – ao meu ver – o que acertadamente quis indicar Pröpper: a mensagem cristã tornou-se uma “oferta sem demanda”. No meu ponto de vista de crente em Deus, ruim é negar ou rejeitar sua existência. Mas é ainda pior desinteressar-se de Deus, e de tudo o que é de Deus, até tal extremo, que haja tanta gente que não se importa com o que se pensa, se diz ou se faça porque Deus quer ou não quer, porque Deus disse ou deixou de dizer.

E que conste, ao falar deste assunto, não me refiro somente a Deus em si mesmo, mas também os que o representam: os homens do clero. A uma importante maioria da população, o que os clérigos pensam e falam, importa a cada dia menos. A não ser que um clérigo faça ou diga alguma extravagância.

Por que a religião interessa cada dia menos? Por que decaiu, e segue decaindo sem parar, a prática religiosa? Este assunto é muito complexo e delicado. Não é possível dar uma resposta adequada e completa em uma breve reflexão.

De qualquer forma, há um fato inquestionável: os problemas que nos ameaçam e nos dominam estão aumentando, a ponto de ver o futuro da humanidade, da terra e da vida a cada dia mais duvidoso e avassalador. E sendo esse o caso, em que contribui a religião e em que contribuem os homens da religião, em resposta às muitas perguntas que as pessoas sentem em suas vidas e para as quais não encontram solução?

Nesta breve reflexão, ouso propor um ponto de partida, que possa abrir horizontes de luz para nós. Eu quero dizer o seguinte: o cristianismo, desde o século III até o século VIII, viveu e administrou a Igreja de uma maneira que produziu confusão não resolvida, depois de tantos séculos. A confusão era que se misturou e fundiu o Evangelho de Jesus com a religião, originada no judaísmo e como se vivia no Império. Agora, essa fusão de “religião” e “evangelho” ainda não foi resolvida. Por isso, a Igreja vive, naturalmente, várias coisas que são muito fundamentais. E são coisas que contradizem o que Jesus, a Palavra de Deus e o Filho de Deus, disse e fez. Dando tanta importância – a essas coisas – que foi o que lhe custou a vida.

De que coisas estou falando? O “poder” e a maneira concreta de exercê-lo. O “dinheiro” e as tristes relações que a Igreja tem com esse assunto capital. E as “relações humanas” que a Igreja permite e mantém, que não são precisamente relações de “igualdade” e “bondade” em amor mútuo, que a Igreja não resolve.

Antes de decisões eclesiásticas, há o Evangelho, no qual Deus revelou-se para nós. Enquanto a Igreja não colocar o Evangelho no centro da vida, o cristianismo não contribuirá com a solução que este mundo necessita.

Leia mais