EUA: um complô para fazer com que o papa renuncie

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21 Agosto 2019

O verão mais quente dos últimos séculos no Hemisfério Norte, devido ao aquecimento climático, foi mitigado pelo papa graças à temperatura constante do ar condicionado. Francisco permaneceu fechado em Santa Marta, onde seguiu em frente com o notável trabalho em suspenso, preparando-se para a iminente viagem africana, mas sem deixar de se atualizar sobre os focos de tensão que, aqui e acolá, visam a enfraquecer o seu pontificado e a colocá-lo em dificuldade, alimentando divisões e submetendo-o a estresses contínuos.

A reportagem é de Franca Giansoldati, publicada por Il Messaggero, 20-08-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Há alguns dias, está à venda nas livrarias francesas um ensaio escrito pelo jornalista Nicolas Senèze, do jornal católico La Croix, cujo título resume três anos de trincheiras:  Como os Estados Unidos querem mudar o papa”, em tradução livre (Edition Bayard). Uma crônica que inicia com os ataques frontais contra Bergoglio exatamente há um ano, no fim de agosto, quando ele estava na Irlanda.

"Como os Estados Unidos querem mudar o papa", em tradução livro (Foto: Divulgação)

O ex-núncio em Washington, Carlo Maria Viganò, com uma carta a alguns blogs de estilo conservador, abria oficialmente a guerra contra o pontificado, destacando incoerências e táticas, e pedindo-lhe respostas sobre alguns eventos internos à Igreja sobre a gestão do dossiê da pedofilia.

Ataques

Viganò exigia abertamente a renúncia do papa. Os ataques continuaram cada vez mais pesados e, com o passar dos meses, mostravam que tinham uma matriz comum a diversos centros de poder, conectáveis a Steve Bannon, o ideólogo ao qual o presidente Trump também tinha se confiado.

Mas a variegada geografia do front anti-Bergoglio se revelou melhor posteriormente, mostrando conexões na comitiva do presidente brasileiro Bolsonaro até tocar, na Itália, a rede soberanista de Matteo Salvini. As fronteiras nem sempre definidas e identificáveis em uma primeira leitura aumentam o nível de preocupação no Vaticano.

Há alguns meses, o cardeal alemão Kasper, comentando as bordoadas contra o pontífice, fazia uma leitura simples, desnudando aquilo que ninguém jamais ousava explicitar até aquele momento: “Há pessoas que simplesmente não gostam desse pontificado. Querem que ele acabe o mais rápido possível, para se ter, por assim dizer, um novo conclave. Eles também querem que este lhes seja favorável, que tenha um resultado que se encaixe com as suas ideias”.

Kasper dava a entender que existe um plano nos círculos internos norte-americanos: os opositores de Francisco gostariam de chegar a uma mudança de liderança. Naturalmente, uma reviravolta no Vaticano não é algo simples, apesar do fato de que o ex-núncio atacou o pontífice frontalmente, apelando para a crise dos abusos, mas ignorando que a maioria dos encobrimentos tem raízes distantes.

Por exemplo, no pontificado de São João Paulo II no Vaticano, a orientação existente era de não denunciar o pedófilo às autoridades, mas de reenquadrá-lo sem levantar escândalos.

Neste momento, os fronts abertos que estão sacudindo a Igreja de Francisco não são poucos, tanto dentro quanto fora dos Muros Leoninos. A lista é longa. Para além das tradicionais divergências internas à Cúria (onde, aliás, voltaram a circular as cartas dos “corvos”), afloram as divisões na Alemanha. O episcopado alemão (o mais generoso depois do norte-americano) está dividido e, em poucos meses, será chamado a decidir sobre as reformas tabus, como o celibato sacerdotal e a abertura às mulheres.

Ao explosivo caso alemão, soma-se a crise dos abusos nos Estados Unidos e no Chile. Segue-se a isso a crise que atinge os bispos franceses, também submetidos a verificações sobre o assunto das violências. Depois, o descontentamento subterrâneo em relação às aberturas ao governo da China. Por fim, a decepção dos poloneses pela falta de consideração em relação à memória de João Paulo II, que acabou escanteada. Em suma, sobre a mesa de Francisco, os problemas não cessam de se amontoar.

Nicolas Senèze identifica em dois documentos a origem de tanta hostilidade contra o pontífice por parte de diversos centros de poder externos. Sua reação deve ser remontada à exortação apostólica Evangelii gaudium (pela crítica à teoria da recaída favorável do livre mercado, segundo a qual o lucro de uns teria efeitos benéficos sobre todos. Para o papa, trata-se de uma opinião nunca confirmada pelos fatos, que expressa “confiança vaga e ingênua na bondade daqueles que detêm o poder econômico e nos mecanismos sacralizados do sistema econômico reinante. Enquanto isso, os excluídos continuam a esperar”).

A encíclica

Por outro lado, há a encíclica Laudato si’, dedicada à proteção ambiental, um texto que lança as bases para uma revolução a partir de baixo e para se chegar a um movimento planetário capaz de minar os estilos de vida ocidentais e abrir espaço para uma nova consciência sobre o ambiente.

Nada de emissões de CO2, fim do consumo de hidrocarbonetos, repensar em chave global os comportamentos individuais, também o supermercado. Um texto assim, por parte da única figura moral de nível planetário, não podia deixar de incomodar seriamente tantos lobbies, começando pelo das companhias petrolíferas norte-americanas, às quais logo se uniu o lobby das finanças e o da agroindústria.

Segundo a tese, a “redde rationem” dentro da Igreja poderia chegar com o Sínodo sobre a Amazônia. Alguns já estão alimentando o fogo. E alguns cardeais de estilo conservadores já avisaram que dificilmente poderiam suportar outros ataques à doutrina – desta vez sobre o celibato sacerdotal ou as mulheres diáconos.

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