Aquecimento global: comentário sobre nossa cegueira

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20 Agosto 2018

Por que é tão difícil provocar ações coletivas contra a mudança climática? Que paralelo há entre nossa irresponsabilidade diante do envelhecimento? É possível pensar saídas?

O questionamento é de Débora Nunes, em artigo publicado por Outras Palavras, 17-08-2018.

Débora Nunes é arquiteta, doutora em Urbanismo, com pós doutorado em Extensão Universitária pela Universidade Lumière Lyon II (2008) e em História das Cidades e Cidades do Futuro pela Bangalore University, India (2015). É coordenadora da Escola de Sustentabilidade Integral e professora titular da Universidade do Estado da Bahia, no Curso de Urbanismo.

Eis o artigo.

Um interessante vídeo da geriatra Ana Claudia Quintana Arantes circulou recentemente. Ela observa que nós humano.a.s evitamos nos preparar para a velhice e a morte, de modo estranho. Toda pessoa conhece alguém que envelheceu doente e, no entanto, a maioria não busca evitar esse sofrimento naquilo que é possível. Doutora Ana Claudia constata que é largamente conhecido que a má alimentação, a falta de exercícios físicos e as relações sociais e afetivas de má qualidade são causas de doenças nos idoso.a.s. Estranhamente, entretanto, adultos que prezam tanto por seu “sucesso” não pensam que seu modo de vida pode lhes trazer uma vida “derrotada” na velhice e passam longe do cuidado cotidiano que pode levar a um envelhecer enriquecedor e a uma morte digna.

O mesmo vem acontecendo com a humanidade inteira em relação ao colapso ambiental. As informações sobre as mudanças climáticas e suas causas são cada vez mais acessíveis, mas as pessoas podem ver por si mesmas que o clima mudou: secas e falta d´água como nunca antes, frios e calores estranhos para a estação e até tornados e terremotos já são vistos no Brasil. Sim, pessoas menos educadas e informadas podem até não saber a relação de causa e efeito entre comportamentos cotidianos e mudanças climáticas, mas você que está lendo esse texto sabe. De todo modo, os menos escolarizados são também os mais pobres e por isso consomem pouco e interferem menos na questão ambiental; são importantes na equação climática apenas pelo número, pois são maioria e assim impactam na destruição dos recursos naturais. Mas os mais educados e ricos não deveriam dar o exemplo?

Passei recentemente pela Bélgica, França, Inglaterra e Índia e fiquei chocada ao ver como o quadro de inconsciência e desperdício de recursos está disseminado por todo lugar. O sentimento de urgência de mudança expresso por pesquisadores e movimentos da cidadania não contamina quase ninguém. Fazemos com o futuro da humanidade o que fazemos com nosso futuro individual: deixamos pra lá. Os alimentos industrializados que fazem a obesidade explodir ainda reinam e estar com uma garrafinha de refrigerante consumida aos milhões por dia na Terra não faz ninguém ficar envergonhado. O uso de descartáveis é tão absurdo que nossos descendentes olharão pra nós como cegos estúpidos; o desperdício de energia faria um observador extraterrestre dizer que somos completamente desarrazoados em face do que nos aguarda. A química que mata aos poucos as pessoas e os solos continua a se expandir. A futilidade da moda de objetos extravagantes e da tecnologia quase descartável com preços irreais ainda enche os aeroportos desse mundo incivilizado. O que estamos esperando pra mudar?

Para aqueles que ainda precisam de mais informações sobre a urgência de mudarmos, destaco duas: O movimento liderado pela secretária executiva da COP 21 – Paris, Christiana Filgueires, mostrando que se não mudarmos radicalmente o modo de funcionamento das sociedades até 2020, os esforços posteriores serão ineficazes, pois o agravamento da crise climática será irreversível. O último documento do IPCC, que congrega mais de dois mil especialistas em clima de mais de uma centena de países diz que sem reversões imediatas nas emissões (indústrias, carros, desmatamento, plásticos) o aquecimento do clima esperado para 2100 já se avizinha em 2030. Isso significa que a floresta amazônica, por exemplo, pode se tornar uma caatinga; que a comida ficará rara e cara e que a água será um item disputado, pra dizer o mínimo. Os adultos de hoje terão uma velhice ainda mais dolorosa e os jovens e crianças pagarão por nossa irresponsabilidade. Tá bom, tá bom desse papo chato de velhice e colapso. Você vai mudar de assunto e cuidar de sua vida, né?

Eu e muitos outro.a.s estamos cuidando da nossa: aprendendo a simplicidade agora antes que ela nos seja imposta; cultivando alimentos mesmo que em pequena escala e buscando a terra como salvação, reflorestando-a e eliminando a química na produção de comida; implantando coleta de água de chuva e energia solar em casa (há maneiras simples e pouco onerosas de se fazer isso); evitando o uso de combustíveis fósseis e comprando o essencial, preferencialmente no comércio local e vindo de cooperativas; plantando árvores onde possível pra compensar o peso que somos para a Mãe Terra e buscando ser mais leves para ela reciclando, fazendo compostagem e nutrindo o solo de jardins, hortas e pomares; buscando aprender a viver democraticamente e amorosamente em comunidade pois essa será uma saída importante pra enfrentar solidariamente os desafios que já estão chegando.

Queremos uma velhice respeitável e uma morte digna e enquanto isso vivemos alegremente em paz com nossas consciências, construindo um mundo com outros valores e esperando que nossos neto.a.s tenham orgulho de nossas escolhas.

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