Pulverização de agrotóxicos sobre escola segue impune há 5 anos

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22 Junho 2018

Syngenta e Aerotex foram responsabilizadas por contaminação de cerca de 92 pessoas em Goiás

Passados mais de cinco anos, a contaminação de cerca de 92 pessoas pelo agrotóxico Engeo Pleno, da multinacional suíça Syngenta, segue impune.

No dia 3 de maio de 2013, uma aeronave da empresa Aerotex Aviação Agrícola sobrevoou a Escola Municipal Rural São José do Pontal, localizada no Projeto Assentamento Pontal dos Buritis, no município de Rio Verde, em Goiás, para pulverizar uma plantação de milho e soja, mas acabou atingindo estudantes, professores e funcionários da instituição que estavam na área externa do prédio, em horário de recreio.

A reportagem é de Emilly Dulce, publicada por Brasil de Fato, 20-06-2018.

A região goiana é de predominância dos interesses do agronegócio, já que a monocultura comanda a economia do município e do estado. Por isso, o contato com agrotóxicos na região é constante e a população recebe doses regulares de veneno pela água, pelo solo e pelo ar, como informa a jornalista Dagmar Talga, que é diretora do documentário Brincando na Chuva de Veneno: Cinco Anos Depois.

"Á água está contaminada e a incidência de câncer na região é muita alta, uma das maiores do estado. É uma coisa grave de saúde pública, que não se tem notícia do que vai acontecer e as pessoas continuam e estão doentes", afirma.

Assista ao documentário:

O filme é uma continuidade da primeira produção de Talga sobre o caso de Rio Verde: Pontal do Buriti - Brincando na Chuva de Veneno. Os documentários contam com depoimentos das famílias atingidas pela pulverização aérea, especialmente as crianças, que receberam a dose mais elevada, porque, no momento, estavam brincando em um pátio aberto quando foram banhadas pelo veneno.

Os atingidos pelo inseticida sentiram dores de cabeça, náusea seguida de vômitos, irritação cutânea, tontura, formigamento dos membros, falta de ar e desmaios, motivando clima de pânico e desespero entre professores, alunos e funcionários da escola.

A situação foi tão grave que muitos dos atingidos tiveram que ser hospitalizados.

Hugo Alves dos Santos era o diretor da escola na época e sentiu na pele as consequências da pulverização irregular. Santos conta que, até hoje, ele e as crianças sentem os efeitos da intoxicação, que vai de coceira, irritação e boca seca até tontura, dor de cabeça e desmaio. Segundo ele, o caso não é isolado na região. 

A cada ano, o Ministério da Saúde registra mais de seis mil intoxicações agudas por agrotóxicos. A Syngenta é a maior vendedora de agrotóxicos no Brasil, o país que mais utiliza pesticidas no mundo.

Perseguição e compadrios

A impunidade e a predominância do agronegócio dificultam as denúncias com o objetivo de calar as pessoas. Santos, por exemplo, passou recentemente por um processo administrativo por sofrer perseguição política e foi afastado há oito meses da direção da escola, após um desgaste com o prefeito do município, que, segundo ele, tem parcerias com o agronegócio.

"Eu tive problemas com perseguição, ameaça de morte, enfim, eu passei um momento na minha vida muito difícil. E essa questão desse veneno, do agrotóxico no Brasil, mata e destrói famílias e sonhos. E eu ainda falava: no dia que a imprensa nos abandonar, nós vamos entrar no esquecimento", lembra.

Para Talga, os holofotes da mídia tradicional para certos assuntos se apagam quando seus interesses comerciais são afetados. Ela diz que a grande mídia é casada com o grande poderio das multinacionais, já que muitos dos donos desses veículos de comunicação são latifundiários. 

"Se não fosse a grande mídia hegemônica, esse processo de agrotóxicos em sementes não iria para frente, mas existe o papel da mídia que reforça o uso indiscriminado de agrotóxicos com o discurso de que vai aumentar a produtividade. Se a gente não democratizar primeiramente a mídia, a gente não vai conseguir democratizar a terra nem o território e nem outros direitos humanos", pondera Talga.

No Brasil, são comercializados diversos agrotóxicos que já foram proibidos em outros países por serem considerados cancerígenos e mutagênicos, podendo causar, por exemplo, má formação fetal.

Alan Tygel, da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida, diz que esse modelo de produção é uma ameaça à soberania alimentar brasileira.

"Esse movimento global tem uma nocividade muito grande para o Brasil, tanto em termos de continuar esse processo de deixar o país como a lata de lixo da Europa, ou seja, tudo o que não presta mais lá é vendido aqui, como no processo de fortalecimento dessas empresas e cada vez mais poder delas sobre o estado brasileiro", analisa.

Tygel indica que o reconhecimento dos impactos dos agrotóxicos é só a ponta do iceberg na luta contra o agronegócio.

"Muitas vezes as pessoas não têm acesso ao sistema de saúde ou ele não consegue identificar aquele sintoma enquanto uma infecção por agrotóxicos, ou pior ainda, muitas vezes os agentes do sistema de saúde são coniventes com fazendeiros, com prefeitos de pequenas cidades, que muitas vezes tem um controle bastante grande e impedem que diagnósticos dessas intoxicações sejam feitos", ressalta.

A Campanha, lançada em 7 de abril de 2011 por mais de 30 organizações sociais, tem denunciado a falta de fiscalização que existe no país em relação a aplicação aérea de agrotóxicos e suas consequências à saúde humana e ao meio ambiente, mas a pressão de deputados ruralistas e do agronegócio dificulta o processo.

Lei do Veneno

O Projeto de Lei 6.299 de 2002, conhecido como PL do Veneno, por exemplo, está em pauta no Congresso Nacional. A proposta quer substituir a legislação vigente e facilitar a produção, importação e registro e comércio de agrotóxicos no Brasil.

Tygel diz que o projeto é uma tentativa de maquiar o potencial tóxico desses produtos e limpar a imagem negativa do agronegócio no país.

De acordo com as investigações, o Engeo Pleno poderia ser aplicado apenas por via terrestre para aquela cultura, devido aos compostos danosos à saúde. Além disso, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) já havia proibido a aplicação aérea do veneno em milharais desde julho de 2012.

Em 2016, o Ministério Público Federal (MPF) de Goiás moveu uma Ação Civil Pública que responsabilizava a Syngenta e a Aerotex por danos morais coletivos e pedia indenização “não inferior a R$ 10 milhões”.

No entanto, em 14 de março deste ano, a Justiça Federal, através do juiz Paulo Augusto Moreira Lima, julgou parcialmente procedente o pedido do MPF e fixou a indenização em R$ 150 mil, 1,5% do valor sugerido. Ainda assim, as empresas entraram com recurso contra o processo.

O Brasil de Fato entrou em contato com a Syngenta Proteção de Cultivos Ltda e a Aerotex Aviação Agrícola Ltda, mas ambas não se pronunciaram até a publicação da reportagem.

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