O déficit orçamentário e a dívida pública que o próximo governo (2019-2022) vai herdar

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24 Mai 2018

"A economia brasileira está presa à armadilha do baixo crescimento, com 27,7 milhões de pessoas desocupadas ou desalentadas e com aumento da extrema pobreza e até aumento da mortalidade infantil, além do aumento das mortes por causas violentas. Nem a meta de reduzir o analfabetismo foi atingida", escreve José Eustáquio Diniz Alves, colunista do Portal EcoDebate, doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE, em artigo publicado por EcoDebate, 23-05-2018. 

“A consciência da ignorância é muito melhor do que a ilusão do conhecimento”
Martin Wolf

Eis o artigo. 

A situação fiscal do Brasil é dramática, pois o governo está tomando dinheiro emprestado para cobrir as despesas correntes e se endividando para cobrir o enorme déficit nominal. O gráfico abaixo mostra as contas públicas brasileiras conforme dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), WEO de abril de 2018. O superávit/déficit primário é o resultado do balanço da arrecadação, menos os gastos do governo, mas sem contabilizar os juros da dívida. Corresponde à geração de caixa do governo. O superávit ajuda a reduzir o endividamento. O déficit nominal acelera o crescimento da dívida pública. O conceito de déficit nominal inclui o déficit/superávit primário mais os gastos com o pagamento de juros. Quanto maior o déficit nominal mais rápido cresce a dívida pública.

 (Foto: EcoDebate)

Os dados são claros. Entre 2003 e 2013, o Brasil conseguiu gerar superávit primário durante uma década, o que possibilitou crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e uma certa estabilidade macroeconômica. Em 2003, o superávit primário foi de R$ 56 bilhões (3,2% do PIB) e passou para R$ 118 bilhões (3,8% do PIB) em 2008. Na recessão de 2009, o governo promoveu políticas fiscais anticíclicas e o superávit primário caiu para R$ 65 bilhões (1,9% do PIB). O superávit voltou a subir até 2011, com R$ 129 bilhões (2,9% do PIB), mas começou a cair nos anos seguintes até se tornar déficit a partir de 2014.

Enquanto o superávit primário se manteve relativamente alto entre 2003 e 2008, o déficit nominal ficou moderadamente controlado abaixo de R$ 100 bilhões, o que representava menos de 3% do PIB. Mas com a recessão, o déficit nominal ultrapassou R$ 100 bilhões em 2009 e chegou a R$ 159 bilhões (-4,2% do PIB), em 2010. Mas o que estava ruim piorou e o déficit nominal chegou a R$ 363 bilhões (-6,5% do PIB) em 2014 e a impressionantes R$ 588 bilhões (-9,8% do PIB) em 2015.

Enquanto houve superávit primário houve também redução da dívida pública bruta (como % do PIB), com redução forte entre 2003 e 2008 e redução moderada até 2013, conforme mostra o gráfico abaixo. Porém, quando o superávit primário se transformou em déficit, elevando o déficit nominal, a dívida pública bruta disparou, chegando a 87% do PIB em 2018 e devendo alcançar 96% do PIB em 2023.

(Foto: EcoDebate)

Artigo de Antonio Nucifora, economista-chefe do Banco Mundial no Brasil (FSP, 08/05/2018), mostra que se nenhuma reforma for feita, a dívida pública brasileira ultrapassará 130% do PIB na próxima década. Ele diz: “Com uma elevação tão rápida, é alto o risco de que os credores deixem de acreditar que o governo brasileiro poderá pagar a sua dívida e, portanto, parem de emprestar dinheiro novo ao Brasil. Caso isso aconteça, o Brasil enfrentará taxas de juros mais altas e o Real se depreciará. Como consequência, a inflação subirá e o poder aquisitivo dos brasileiros será reduzido, especialmente para os pobres, forçando o ajuste que os políticos não terão tido a coragem de fazer. Foi isso o que aconteceu durante as crises financeiras da década de 1980 e início da de 1990”.

Contudo, existe uma forte resistência ao ajuste fiscal e às reformas para sanear as contas públicas. Por um lado, esta resistência é normal numa democracia, pois os diferentes setores da população possuem expectativas diferentes quanto ao gasto público. Por outro lado, se nada for feito a economia brasileira não vai sair da estagnação e não será capaz de gerar emprego para os mais de 26 milhões de brasileiros que estão desempregados ou desalentados.

Em artigo recente, Nelson Barbosa, que foi ministro da Fazenda e do Planejamento no governo Dilma, questiona o bordão “quem votar não volta”, já que se não reformar não haverá governabilidade. A recuperação da estabilidade fiscal demandará mudanças de regras fiscais, no gasto público e na tributação pelo próximo governo. Ele diz: A solução é uma reforma fiscal focada somente em metas de gasto, que podem ser crescentes, constantes ou cadentes em proporção do PIB, de acordo com a escolha política dos eleitores, de quatro em quatro anos. Do lado do gasto, o desafio é controlar despesas obrigatórias, e isso não envolve somente a Previdência.

Também é preciso reavaliar o outro grande gasto federal —a remuneração de servidores—, bem como diminuir o engessamento de algumas despesas por regras e vinculações que não deveriam ser matéria constitucional. Uma saída do atual impasse político entre esquerda e direita seria combinar as duas iniciativas em uma só medida: uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que reveja o teto de gasto e aperfeiçoe a regra de ouro, de um lado, e que reforme a Previdência e outros gastos obrigatórios, do outro. A ideia dessa “PEC do compromisso” é combinar flexibilidade com responsabilidade fiscal. Evitar a rigidez crescente do Orçamento público por excesso de metas e, ao mesmo tempo, reduzir o crescimento do gasto obrigatório da União”.

As duas opiniões acima, de economistas de diferentes escolas de pensamento, mostram que a situação fiscal do Brasil vai requerer um entendimento entre a direita e a esquerda e entre toda a sociedade brasileira que já não aguenta a falta de perspectivas para o país e está pagando um alto preço com a baixa percentagem de pessoas ocupadas, a péssima qualidade da saúde e da educação e a falta de segurança pública, dentre outros problemas sociais.

A economia brasileira está presa à armadilha do baixo crescimento, com 27,7 milhões de pessoas desocupadas ou desalentadas e com aumento da extrema pobreza e até aumento da mortalidade infantil, além do aumento das mortes por causas violentas. Nem a meta de reduzir o analfabetismo foi atingida.

O Brasil está criando uma geração perdida e sem esperança, pois cresceu o número de jovens Nem-Nem. O Brasil tinha 48,5 milhões de pessoas com idade entre 15 e 29 anos e 11,1 milhões não trabalhavam e também não estavam matriculadas em uma escola, faculdade, curso técnico de nível médio ou de qualificação profissional. Não se pode esperar muito de uma geração do futuro que está sendo excluída no presente!

Sem fundamentos econômicos sólidos será impossível atingir o “Pleno emprego e o trabalho decente”, saúde e educação de qualidade para todos. Portanto, não será ignorando a crise fiscal que os problemas sociais serão resolvidos. O Estado é importante, mas não se pode desprezar a força da sociedade civil.

Os dados sobre os períodos de recessão e de recuperação do CODACE – o comitê que data os ciclos econômicos formado pela FGV – confirmam que o Brasil vive a pior retomada da história. A economia de 2019 será menor do que a economia de 2013. No ritmo atual, a renda per capita brasileira só retomará o nível de 2013 em 2023. O próximo governo (que ainda ninguém sabe quem será) terá que ter muita criatividade para tirar o Brasil do beco sem saída em que se encontra.

Referências:

Antonio Nucifora. Quem vai pagar a conta? FSP, 08/05/2018

Nelson Barbosa. Reformar o Orçamento público é inevitável, e isso tem de ser debatido na eleição, FSP, 11/05/2018

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