MPE acusa Padilha de pressionar governador do MT para encobrir crimes em fazenda

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31 Janeiro 2017

Em coletiva, procurador chamou ministro de grileiro, acusou tucano de manobrar PGE e falou de ameaças e ligações para demover ação do MPE.

A reportagem é de Cauê S. Ameni e publicada por De Olho nos Ruralistas, 30-01-2017.

Indignado com a decisão da Justiça que derrubou a liminar que garantia a recuperação do Parque Ricardo Franco, o procurador-geral de Justiça em exercício do Mato Grosso, Luiz Alberto Esteves Scaloppe, convocou uma coletiva de imprensa, na quinta-feira (26), junto com Regiane Souza de Aguiar, promotora de Justiça de Vila Bela da Santíssima Trindade, município onde se localiza o parque, e denunciou:

– Uma pessoa que consegue mover um governador, um vice-governador e a diretoria da Sema-MT tem que ser poderosa, e eu deduzo que seja o ministro Eliseu Padilha (PMDB-RS). Afinal, o governo do Estado está reclamando tanto de dinheiro e precisando tanto da ajuda da Casa Civil e da União, para ter seus recursos públicos… ele deve ser uma pessoa poderosa! Também a PGE é poderosa, também o governador, também o vice-governador presidente da Aprosoja, muito ligado com o senador ministro da Agricultura (Blairo Maggi). São muito poderosos.

A indignação de Scallope, que atua há anos à frente da Procuradoria Especializada de Defesa do Meio Ambiente, é fruto da intervenção do governador Pedro Taques (PSDB-MS) para reverter uma ação do MPE por crime ambiental, que chegou a bloquear cerca de R$ 949,5 milhões em bens do ministro-chefe da Casa Civil, de seus sócios e de outros fazendeiros. A coletiva marcou o protocolo de um recurso, um agravo regimental, junto ao Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso.

Ministro é acusado de desmatar ilegalmente o equivalente a 2 mil campos de futebol

Scallope, que teme o incentivo da grilagem dentro dos parques, não poupou o ministro Padilha, braço direito do presidente Michel Temer (PMDB-SP): “Quem invade indevidamente é grileiro, é assim que a gente chama”.

E disparou contra a blindagem tucana:

– A fauna está ameaçada, a flora, nossas relações com a Bolívia, pois o parque está para além da fronteira geopolítica e, o que preocupa mais ao MPE e a mim, é o precedente criado pelo governador. O governador fez um gesto ousado. Moveu a PGE, após a omissão dela por meses, e com a concordância dela, fez um pedido de suspensão muito tempo depois, movido indisfarçavelmente por interesses das pessoas que ocupam o parque.

Em dezembro, o MPE ingressou com 50 ações civis públicas contra fazendeiros localizados no interior do Parque Estadual. A denuncia aponta que 19 mil hectares, dos 158,6 mil que tem o Parque Ricardo Franco, foram explorados por desmatamento irregular, pecuária sem licença e até mesmo trabalho escravo, entre 1998 e 2015.

O Parque Serra Ricardo Franco, fundado em 1997, abriga espécies raras de fauna e flora, com centenas de cachoeiras, piscinas e uma vegetação que reúne floresta amazônica, Cerrado e Pantanal. “É um tesouro de Mato Grosso”, descreveu o procurador-geral em exercício.

SUSPENSÃO E AMEAÇAS

Segundo Scaloppe, o pedido de suspensão da decisão proferida pelo Juízo de Vila Bela da Santíssima Trindade foi feito pelo governo do Mato Grosso em dezembro. “Contra essas decisões, foram interpostos 30 agravos de instrumento”, informou. Em três deles, as liminares foram mantidas; em outros, suspensas. “Mas essa é uma questão judicial entre o Ministério Público e os proprietários. Agora, é inadmissível que o governo venha atuar na defesa de interesses privados através da PGE quando do Pedido de Suspensão de Segurança”.

O MPE foi mais longe na denúncia. O procurador-geral afirmou que o vice-governador, Carlos Fávaro, e o secretário de Meio Ambiente, André Baby, tentaram intimidar a promotora de Vila Bela, Regiane Aguiar. Isso teria ocorrido numa reunião no Palácio do Governo. O Ministério Público estranhou o nome da promotora entre os convidados. Era uma armadilha: “Nessa reunião estavam o governador, o vice e toda a diretoria da Sema-MT, toda ela remanescente das indústrias do ministro da Agricultura, Blairo Maggi”, cutucou o procurador.

A promotora teria sido pressionada a desistir das acusações. “Fizeram pressão sobre a ação, uma pressão sutil”, declarou Scaloppe. “Fávaro disse para ela, em um linguajar popular, se ela queria administrar o Estado ou a Sema-MT”. Ele conta que Regiane reivindicava uma fiscalização a que a Sema-MT estava obrigada, por sentença judicial.

Para derrubar a liminar do MPE e solicitar a desistência do órgão na ação, segundo reportagem do site Olhar Jurídico, os políticos argumentaram vários fatores: lesão ao erário, garantia da ordem pública e questões econômicas. O procurador disse que Padilha teria feito, pessoalmente, ligações telefônicas para demover o MPE e outros órgãos, exigindo a manutenção de suas propriedades.

A reportagem do Olhar Jurídico conta que o MPE achou estranho que os servidores responsáveis pela fiscalização no parque tenham sido afastados “misteriosamente” pelo Estado.

Fazendas com armas

Na época da diligência de busca e apreensão, em dezembro, De Olho nos Ruralistas deu repercussão ao caso, mas errou ao divulgar – assim como a Folha – que as 18 armas apreendidas na operação pertenceriam ao ministro da Casa Civil. O MPE informou que o arsenal aprendido estava na fazenda Shangrilá, que pertence a Maísa Rodrigues Arantes, esposa do pecuarista Valter Arantes, da Empresa Rural do Guaporé Ltda.

Na propriedade de Padilha, fazenda Paredão I, foram encontradas apenas duas espingardas calibre 36 e uma motosserra. Para completar, foram flagradas condições de trabalho análogas à escravidão – inclusive com a presença de galões de gasolinas no quarto dos funcionários. O MPE encaminhou fotos dos quartos ao Ministério do Trabalho.

Na denúncia, o ministro é acusado pelo MP de desmatar ilegalmente 2.079 hectares em duas fazendas em que aparece como sócio-proprietário. Este desmate é equivalente a 2 mil campos de futebol.

A Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) identificou o desmate irregular sem autorização ou licença ambiental de 1,3 mil hectares na fazenda Paredão I, controlada pela Jasmim Agropecuária e Reflorestamento, que tem como sócio-proprietário Eliseu Padilha; e na Agropecuária Paredão Ltda, de Marcos Antônio Tozzati, ex-assessor e sócio do ministro. Lá foram encontradas as espingardas e os quartos precários onde dormiam os funcionários.

Segundo o Ministério Público, peritos que acompanharam a diligência documentaram os ilícitos ambientais, entre eles o desmatamento recente em área de preservação permanente. Dois trabalhadores dormiam nos alojamentos.

Na fazenda Paredão II, de Marcos Tozzati, foram desmatados ilegalmente 925 hectares. Ela também foi vistoriada na diligência judicial. Como não possui sede própria, porém, ela utiliza a estrutura da fazenda Paredão I, que pertence ao ministro.

Bens bloqueados

Por causa da degradação ambiental, o juiz Leonardo de Araujo Costa Timiati, da Vara Única de Vila Bela da Santíssima Trindade, determinou o bloqueio de R$ 108 milhões em bens do ministro e mais cinco sócios da fazenda. A decisão também exigia a apreensão de 1,9 mil cabeças de gado para cessar os danos ao meio ambiente e por ser instrumento do crime, conforme o artigo 48 Lei 9.605 / 1998 (impedir ou dificultar a regeneração da vegetação).

Padilha também foi alvo na fazenda Cachoeira, onde aparece como sócio-proprietário, novamente com Marcos Tozzati. Nela foram desmatados ilegalmente 735 hectares sem autorização ou licença da Sema. A ocupação do solo também estava em desacordo com o Sistema Nacional de Unidade de Conservação.

Por causa do desmatamento irregular nessa área, o juiz determinou o bloqueio de mais R$ 38,2 milhões em bens do ministro e outras quatro pessoas. Para a Justiça, está é a quantia estimada referente aos custo para recuperação da área devastada segundo o método de Valor de Compensação Ambiental.

Nos autos consta, com base nos dados do Cadastro Ambiental Rural, que Padilha e outros quatro citados são proprietários da Fazenda Cachoeira.


Fazenda cachoeira / Foto de satélite enviadas pelo MPE

Outro lado

Questionado pelo Estadão, em relação às afirmações do procurador-geral, o ministro Padilha afirmou em nota que não tem nada a declarar, “pois o fato alegado não existe”. Paulo Taques, secretário da Casa Civil e primo do governador, negou que a PGE tenha trabalhado em favor do ministro ou de qualquer proprietário. “O estado não olhou nomes ao atuar na questão”, afirmou. O procurador-geral do Estado, Rogério Gallo, respondeu no mesmo tom, negando que o órgão tenha atuado em defesa de interesse do ministro.

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